-
George, parece um filme
de terror.
-
O que me
surpreende é como um
Governo deixa
assim os seus
cidadãos morrerem abandonados. Se algo me aflige
dirijo-me à minha embaixada e sou devidamente atendido. O Governo
de Sua Majestade
tem o controlo efectivo de todos os seus súbditos em
qualquer ponto
do mundo. Os Governos
Africanos perante o apoio
que os seus
cidadãos reclamam, até
chegam ao ponto de as suas
embaixadas desconhecerem e negarem, que não é cidadão nacional. Vivem apenas
da falsificação de documentos.
George
era muito prático e objectivo. Creio que os ingleses são todos assim. Qualquer
motivo que os incomode limitam-se apenas a dizer sheet (merda). Já passava do
meio-dia quando acordei. George deixou um papel espetado na porta a dizer que
estava na praia. Enquanto vestia uma camisola leve e um calção, ouvia algumas
vozes longínquas trazidas pelo vento do mar. Lembrei-me de passar um pouco de
água pelo rosto. Antes de sair peguei num boné para me proteger do sol. Pus a
toalha no ombro. Calcei uns chinelos. Caminhei pela areia com alguma
dificuldade devido a que os chinelos se enterravam. Estava maré cheia. O som
das ondas que batia na areia oferecia uma estranha sensação de bem-estar.
Pareciam um convite para dormir.
O sol do meio-dia
estava muito quente.
A areia também.
Com os pés
descalços não
era possível
suportar tal
temperatura. A praia
estava cheia de lixo devido à tempestade
da noite. George à boa maneira inglesa já
tinha tudo
preparado. A mesa
estava recheada de grandes gambas. Antes de me
aproximar já tinha
uma cerveja aberta
à minha disposição.
George convida-me:
-
A tua cadeira está aí. Desfruta o mar e o que ele nos colocou na nossa mesa.
Primeiro
comi algumas gambas, depois bebi a cerveja quase sem parar. O sol junto ao mar faz muita sede. George pergunta-me:
-
Dormiste bem?
-
Sim, e tu?
-
Também.
Surgem
quatro jovens
femininas que se sentam junto a nós. Gulosamente olham para a nossa mesa e para as cervejas. Uma
delas está com um
sutiã transparente. Os seios
são gordos,
redondos e volumosos.
Levanta-se, aproxima-se e diz:
-
Boa tarde. Por favor podem-me dar um cigarro?
Dei-lhe
um e pediu para
lho acender, mas
não se ficou por
aí:
-
Está tanto calor que me apetecia uma cerveja bem gelada.
Demos-lhe
uma, depois de a beber
voltou e disse:
-
Desculpem, não podem dar-me mais três para as minhas amigas? Nós somos muito
boa companhia, e se não se importarem...
George
cortou-lhe o diálogo:
-
Não temos mais cerveja.
Ela
foi-se embora, para
junto das suas
amigas. Esticavam os sutiãs e os minúsculos
biquínis o mais
que podiam, na tentativa
de nos atrair.
O inglês segreda-me:
-
É difícil relaxar
um bocado.
Elas estão por
todo o lado.
Onde vêem estrangeiros
fazem tudo para
os conquistar. O melhor
é não lhes
prestarmos atenção, creio que daqui a pouco
vão embora.
De
facto, poucos minutos
depois as belezas
de ocasião abandonaram o local. Ouvem-se vozes
que se aproximam. Parecem exaltadas. São os três sócios que
trazem duas caixas térmicas. João
interroga:
-
Vocês estão a gostar do ambiente?
- Sim, é bastante
agradável. – Respondi.
-
Se não fosse a chuvada desta noite, seria melhor. Permitem que vos façamos
companhia?
George
anuiu:
-
Sejam bem-vindos.
Instalaram
um grande
chapéu-de-sol que publicitava uma companhia aérea
portuguesa, e um clube
recreativo local
que tinham apoiado um
rali. Dava a impressão
que queriam que
escutássemos tudo o que
diziam. João tirou uma cerveja da caixa térmica.
Bebeu-a até meio,
respirou fundo e perguntou:
-
Virgílio, podes explicar onde
estão os dez mil
dólares do patrocínio do rali?
-
Foram gastos no clube.
-
Que eu saiba não foram lá parar.
- Calma aí, depois vou justificar.
-
Virgílio, sei de fonte fidedigna que o dinheiro está na tua conta em Portugal.
-
Hum! Não sabia que tinhas espiões. Acho que isso pouco interessa para a nossa
discussão, o dinheiro vai ser empregue no clube, e na devida altura
apresentarei contas disso.
-
Mas, já passou quase um ano.
-
João, isso não
faz nenhuma diferença. Quando te ausentas
ficas fora tanto
tempo, que
chegamos a duvidar se realmente
queres trabalhar.
Na realidade somos nós
que aguentamos a empresa
dia e noite.
Esse montante
irá para o clube,
e está fora de discussão.
-
Para o clube não, para ti.
Roque põe ênfase:
-
O Virgílio tem que explicar
para onde foi
o dinheiro, assim
como os relógios
que foram roubados, e depois apareceram nos pulsos e
nas casas dos seus
familiares.
Virgílio
perde a calma e grita:
-
Estás-me a acusar de gatuno?
- Não, longe
disso. Ainda tens que
explicar como
é que conseguiste gastar
milhões nas obras
dos nossos protectores.
-
A nossa contabilidade faz fé disso.
-
Sim, mas os gastos são exorbitantes. Durante a nossa ausência passas cheques de
milhões que nunca conseguimos apurar o fim a que se destinam.
João
muito exaltado pretende pôr
fim à questão:
- Roque, sabemos que
quando nos
apresentas as contas de fim de ano
inventas documentos. Tens duas empresas no estrangeiro
que nos
fornecem. Sobrefacturas tudo o que nos envias.
Estás pura e simplesmente
a roubar-nos.
-
Não sei porque é que vocês não abriram empresas no estrangeiro. Estão à espera
de quê?
-
Mas essas empresas foram criadas à nossa revelia.
-
Admito que o foram. Considero que é apenas uma oportunidade de negócio. Este
mundo é dos espertos.
Acabaram
com a discussão.
Talvez arrependidos por
terem dito o que
não deviam na presença
de estranhos. João tenta
disfarçar:
- Meus amigos desejo-vos uma boa continuação
de fim-de-semana!
Alguns
barcos aproximavam-se. Acostavam e as pessoas descarregavam o que
traziam. Vinham procurar o repouso
de uma semana agitada.
Depois da troca
de palavras, os que
me convidaram decidiram saciar
a fome. Tiraram algumas lagostas e por entre risos bebiam cerveja.
Parecia que nada
havia acontecido. Olhei para George e disse:
-
Acho que o comportamento deles se deve à tempestade desta noite.
- Não, não acho. Um deles é muito
amigo do principal
protector. Devido à guerra
tem contratos que
lhes proporcionam grandes
rendimentos inesperados.
E onde muito
dinheiro surge com
facilidade, o desentendimento
também. Isto
é típico nestes países.
As empresas surgem, e de um dia para o outro acabam. Onde há muito dinheiro, também há muitos gatunos que estão sempre
a vigiar. Pretensamente
são amigos,
mas o dinheiro
é inimigo deles.
Sem comentários:
Enviar um comentário