«Rebentou a
bolha em Angola? Há sinais por parte da banca privada relacionados com a
possibilidade de já estarmos diante de um estoiro da bolha imobiliária que se
formou no mercado angolano onde a construção do metro quadrado chegou a
ultrapassar os 9 mil dólares. O problema agora é que as promotoras que se
endividaram junto dos bancos não estão a conseguir vender os apartamentos e os
escritórios a um preço que lhes permita reembolsar os seus créditos. Os bancos
que financiaram os projectos já começaram a ver "lulas" em matéria de
crédito mal parado. Ainda ninguém assumiu o estoiro, mas de facto nesta altura
pode-se dizer que os bancos já deixaram de financiar novos projectos.» In
morrodamaianga.blogspot.com
Tímida, face a face com um segurança precavido de
nervosismo manual na coronha da pistola, de caubói que a insinua saltar
da sua coxa.
Revivo a imagem do tempo
saudoso da fronteira americana, do Billy
the Kid, Jesse James, depois
transportados para filmes.
Ele sentia-se caubói
desses westerns, herói do faroeste. O segurança
escondeu-se na habitual desconfiança.
- Nome, raça e chipala tal e qual como está no bilhete
de identidade. E vem falar com quem?
- Com
o Bispo do Imobiliário.
- Falta o nome e a raça do bilhete de identidade!
- Lwena… a espoliada dos
casebres.
- Não se mecha, não toque em
nada e espere só um momento.
O portão preso de barras
de aço importadas libertou-se.
Aventurei-me para o interior,
para lá do portão e descansei intramuros. Chegou-me uma pontada
de mal-estar alimentada por dois cães
que se movem. Ladram-me de improviso, de aviso, impõem-me gélido
respeito, parecem lobos
puros, guardas das SS para guardar os que vivem no receio constante de serem
assaltados a qualquer momento pelos espoliados das casas-casebres. Parece que a
pressão sanguínea
do meu coração
estabilizou quando me assegurei que os canídeos estavam atrelados, controlados por seguranças.
Antes da porta
de entrada, à esquerda,
diviso uma enorme cruz
decerto por chineses betonada, onde se lia com muita religiosidade: VOTEM SEMPRE
NO NOSSO SENHOR ETERNO, NO PARTIDO DO VOSSO CORAÇÂO!
Entrei numa enorme
sala e logo me informaram que o reverendíssimo não
tardaria. Sentei-me a estudar o ambiente. Havia uma inundação, como que um cemitério
de imagens de santos
à mistura com cruzes que pareciam integrantes de uma colecção. Como mandam
as boas regras da superstição, tudo na semi-escuridão para
impregnar a sugestão
do misticismo. O sacerdote
vem vestido de máscara divinal, de aparência lustrosa
como se acabasse de descer
do céu, saúda-me:
- Ó Lwena! Bem-vinda
minha à minha nova vida!
Levantei-me mentalmente
abençoada, transparecida na minha pequenez, perante
tanta grandeza
evangélica. Cumprimentámo-nos e ele lança-me a sonda:
- Vens reviver as cruzadas?
- Por acaso até não. Ando à procura do
paraíso perdido que me prometeram.
- É esse
condimento que falta
na cozinha da igreja. Hum, hum, um paraíso
perdido, que retorna
às nossas contas bancárias, isso
agrada-me muito. Óptimo… a Igreja Veni, Vidi, Vici, e o Bispo
do Imobiliário abençoam-te.
A minha atenção prendeu-se numa vitrina
com fragmentos
de ossos, folhas
de oliveira, restos
da túnica de Jesus Cristo,
azeite, água,
terra, restos
de madeira também da cruz de Jesus crucificado. Sem dúvida que mais parecia
um museu da cristologia. Para
pobre idiota como
eu constituía um enredo
que inspirava… desvendar,
aclarar, entrar na
invenção do culto religioso.
- São relíquias autênticas… achados
arqueológicos?
- Santas relíquias,
objectos dos nossos milagres.
O Fundamento inventivo
a descoberto.
- Bispo… e estão abençoadas?
- Abençoamos tudo.
Esse relicário
abençoei-o pessoalmente.
E logo pegou num frasco
de azeite e explicou o seu mistério.
- Com o azeite azeitamos: foi ele
que ungiu Jesus, veio
da Terra Santa.
Claro que poupamos despesas juntando-lhe
óleo, senão a falência encontra-nos. A água procuramo-la por aí no rio mais próximo.
- Como
conseguem atrair crentes
que produzem musicada medonha, como
se soprassem nas trombetas do Apocalipse?
- É pá, estrondamos a praça
porque eles
perderam os ouvidos. Surdaram devido às maratonas das noites
perdidas. Os vizinhos, os poucos que ainda
conseguem audição, têm razão que não os
deixamos dormir.
- E quando eles protestam?
- Quando nos julgam, anunciamos-lhes a excomunhão, que o
apocalipse já está aí. Não me digas que também não vês os sinais, isso é o que
não nos falta. É muito importante manter a superstição nestes gentios. São
mais idiotas que os carneiros, dominam-se facilmente… como
a maria-vai-com-as-outras. E oro-lhes:
alegrem-se, sejam barulhentos porque ganharão a liberdade
de consciência.
- E quando no culto doentes com
dores de cabeça,
sistema nervoso
arrasado, a rebentarem de estresse?
- Acreditam piamente
nas nossas palavras. São altos cúmulos da crendice, parvoíce… idiotice.
- O negócio vai de vento em popa, Bispo.
- Prefiro não musicar esse salmo, como amizade segredo-lhe que
facturamos só em
dízimos, quatro
mil vezes
cem, fora
as doações.
- Outra acumulação mundial,
episcopal.
- Veni, Vidi, Vici.
- E o manancial
voa para Olísipo.
- Para o meu Éden! Não confio nesses do Politburo. Há o perigo das eleições com muita fraudulência
escondida. Receio que
estejamos a voltar aos velhos
tempos dos combates
monótonos que os Gregos
iniciaram na Baía de Aulis.
- E as curas
milagrosas das dores de cabeça, da barriga, dos dentes, infertilidade, arranjar
emprego, esposa,
esposo…
- Fácil, é preciso ter fé, não há mal que sempre dure.
- A fé… curar dor de dentes é milagre?
- É sim senhor! Acabem com os
doces. Passam o tempo
a dentar chocolate,
ordenamos que parem, a dor passa, e
logo berram que foi um milagre.
- E os estouros
da cabeça?
- Bendizemos para não ouvirem música
muito alta,
excepto na nossa igreja. A conspiração internacional barulhenta,
aterradora da música, atrofia o cérebro, ele deixa de funcionar e surge a cura.
- E as dores
de barriga?
- É tormentoso
convencê-los que parem de comer
o funji de bombó durante uns dias.
Conseguido, cura garantida.
- E a badalada infertilidade?
- O machão afirma
convicto que ela
é culpada. A querida, atordoada com lamúrias acredita que
Deus a abandonou. O macho
em casa
relincha que
a põe fora de casa
se a barriga não
inchar, que
facilmente a troca por
outra. Dialogamos, enviamos o marido para o nosso posto médico… já está!
As infertilizadas fanatizam-se, passam palavra
que foi mais um milagre.
- E o emprego? Esse é que é um grande
milagre!
- Aliciamos um crente empresário e o emprego
está-lhe garantido.
- Caçar esposa, esposo…
- Enfiam-se, galam-se para aí, fintam-se, resolvem isso
entre eles.
Elas caçam marido e eles também as caçam.
- Igreja Veni, muito PIB nos milagres.
- Igreja sem milagres não sintoniza. Os crentes
vivem, precisam disso. Andam sobre
brasas porque desatinaram. Como comboios desgovernados, perdidos sem
estações, apeadeiros, sem paradeiros.
Como avalancha
seca de pedras
a rolarem por montanha,
que acolhemos, o paraíso lhes prometemos.
Entes em
tais condições
acreditam em qualquer
coisa. É só ver como foram as últimas eleições
legislativas.
- Operários contratados
para a fábrica
do Senhor, que na realidade são fabricantes de dízimos.
- Está a brincar ou quê?! Olhe que
não se brinca
com as Sagradas Escrituras,
e muito menos
com o santo
nome de Jesus! Isto
é-nos muito sagrado!
- Colonialismo,
neocolonialismo, não há diferença. Difere nas mudas
do capital volátil.
- O que
é que disse?!
- Que
os mitómanos se igualam.
- É isso! Não há crença sem melómanos. Um
órgão soberbo
bem afinado põe os crentes
em
êxtase. Não
me pergunte que
não sei porquê,
ninguém sabe... como o amor.
- Ninguém sabe…
- Verdadeiramente ninguém
o sabe explicar. Batemos na boa porta desse desconhecido
com a religião,
os crentes vão
na conversa e facturamos em nome do amor.
- Tirando proveito
do instinto de conservação
das espécies sem identidade cultural
- Sim! Sim! O amor de fábrica com os crentes convencidos
que são
operários… que
trabalham para o amor do Senhor. Não somos diferentes
dos outros. Ganhar
dinheiro com
a crendice humana
começou na Terra com
os primeiros humanos.
Somos apenas maiorais
espertos. Despertámos para
explorar o passado
e os próximos futuros. A meu ver não há nenhuma revolução que
acabe connosco. Quando revolucionam, no
início expulsam-nos, deixam-nos espoliados, martirizados, empalados. Enfim, culpados de tudo.
Depois a sanha
esmorece. E reencarnamos mais vigorosos, mais
poderosos. Sumamente
a religião é o melhor negócio. Sem
dúvida que é o negócio mais apetecível. Custos inexistentes porque os crentes suportam-nos. É o melhor
negócio porque é patrocinado por Deus. Num piscar de olhos somos clientes
VIP dum banco. É a nova vida.
- E o ausente
Voltaire quando reencarna, os alicerces bíblicos desmoronam-se?
- Facílimo! Denunciamos aos crentes
que os falsos
profetas chegaram. Eles
arrebatam-nos e queimam-nos na secular fogueira.
- E se não
resulta… outra Contra-Reforma?
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