«Os
ditadores nunca se preocuparam com os opositores que se remetem ao silêncio ou
com os que optam pelo elogio. Eles sentem-se ameaçados é com os que escolhem o
caminho da crítica ou da denúncia dos factos que os poderes gostariam de ver
afastados do conhecimento público. Muitas vezes, nem são as opiniões que
perturbam os ditadores, mas sim, a verdade dura e crua dos factos. Na
realidade, certos factos, desde que verdadeiros, são mais demolidores do que todas
as opiniões do mundo. É que, uma vez trazidos ao conhecimento público, ninguém
mais pode continuar a fingir que os não conhece e, pior do que isso, o silêncio
perante eles pode tornar-se socialmente insuportável. Ficar calado perante
certos factos constitui, por vezes, uma forma qualificada de mentir.» Marinho
Pinto, in JN
Com tanta terra livre, espaços abertos,
libertos, mesmo assim, o poder subtrai-nos, mata-nos por ínfimo espaço. Mantêm
insistentes promessas de nova vida da fome que enobrecem a classe política dos
sons petrolíferos. O poder renasce, a fome também. Os rios do poder são
caudalosos, os dos esfomeados, secos, vazios, ansiosos. Este governar impõe-nos
a ilegalidade como sobrevivência. É como um castelo sem ponte levadiça. Como
soldados sem munições que se rendem à inevitável morte.
Se não obedeceres nunca serás ordenado, porque
quem vai para padre é porque não sabe fazer mais nada.
Olha! Estão a treinar para as olimpíadas
alcoólicas. Perderam a razão. Não acreditar em Deus é fácil, mas há outro Deus
não inventado que tem qualquer coisa de estranho, desconhecido, enigmático na
nossa sintonia. Governar com a mentira é asfixiar a verdade. Em Jingola e
noutros reinos a democracia é exercida pela polícia política que usa o doentio
secretismo da informação cozinhada em fornos primitivos.
Lavava, continuo a lavar roupa. Sou
lavadeira independente. A ditadura que tomba o poder pela violência com ela
cairá.
Vivemos os últimos momentos da nossa
existência. Optámos pelo suicídio colectivo. Mas o meu poder vai vencer, serei
imortal como os nossos heróis, esquecidos, abandonados, entregues ao pó do
tempo. Assim! Não reconhecemos os verdadeiros méritos daqueles que os merecem.
Desterrados, ficamos sem História, perdidos
nos enigmas espaciais e temporais das colónias outra vez colonizadas. Tudo
começa e acaba nas armas. Restam as mentes traumatizadas.
Perdi o carimbo do meu Caminho, nunca mais
o vou encontrar. Já não sei andar, farto-me de palmilhar. Desviaram-se do bom
senso, voltamos a nos matar. Com tanta terra para lavrar só o vento sabe semear.
Chuva a alagar, as águas vão espalhar, quem me vai governar?!
Gozo o espanto medievo eleitoral. Votei!
Parlamento, deputados na arquibancada da somática ultrapassada pela velocidade
retrógrada. Bípedes nos autocarros cai peças sem reposição. Desconhecem onde
estão, o que são. O enclave prisional é pessoal, oprime a ingenuidade cultural
dos escravos, do poder para ficar, continuar, nada mudar. Conseguiram!.. Talvez
pelas comidas enlatadas, importadas, os nossos genes alteraram. Estamos
geneticamente enlatados, modificados. Não tenho nome, sou uma alma do outro
mundo. Não posso pensar!? É uma actividade muito perigosa. A morte é o último
recurso interposto, não atendido e alegram-se com a minha desdita.
Comentário
anónimo recebido: «olá malta. Começa e termina o sonho de ter filhos em Luanda
e em particular em Angola.
Isso é inimitável, tive que dormir durante dois dias na porta da escola São José de Cluny, junto ao antigo largo do Kinaxixi, para conseguir uma vaga para o meu filho estudar a iniciação, comigo estavam mais de 400 pais para fazer a matrícula. Meus irmãos, o futuro do nosso país está a morrer como morreram os nossos palancas negras, no 11 de Novembro»
Isso é inimitável, tive que dormir durante dois dias na porta da escola São José de Cluny, junto ao antigo largo do Kinaxixi, para conseguir uma vaga para o meu filho estudar a iniciação, comigo estavam mais de 400 pais para fazer a matrícula. Meus irmãos, o futuro do nosso país está a morrer como morreram os nossos palancas negras, no 11 de Novembro»
Angola não tem futuro, caminha muito rápido
para o suicídio colectivo. A oposição também é papão do vil metal. Entre estes
e o poder não têm diferença, só existe a luta do ter. A produção petrolífera
aumenta, o álcool também, conduz as mentes vazias cheias de festas, na
universidade com nova cadeira obrigatória: farras. Onde a oposição dandi
vasculha novas palavras para o egocêntrico alvo. Ninguém os ouve, lhes presta
atenção. Absortos, dominados pelo barulhento imparável, estertor musical. Sem
família, desintegrou-se como uma árvore arrancada pela raiz. Lei e ordem? Só
desordem! Hipocrisia teológica: acabar uma guerra começar outra.
Maravilhados com a maldade, espirituosos
com a ignorância. Comoventes!
Pasmo com tantas obrigações sem soluções.
Falta-me a mais importante, ler. Ler? Biliões com cérebros deformados,
esfomeados lêem livros? Não! Sem cérebro e sem dinheiro para comer não é
possível ler. Deixam-se de vender biliões de livros. Prejuízos incalculáveis.
Um exemplo da anarquia para criar local de
estacionamento: Colocam-se algumas pedras na via pública. O camarada governante
afia a arma pré-histórica de sílex. Imponente, com ares de modernizado, letrado.
E quando há prémios nacionais de cultura e arte, as famílias do polvo
vencem-nos sem tentáculos. Que graça terrífica: os comunistas copiaram os
métodos da governação salazarista. Regressaram ao salazarismo, à cidade capital
atabalhoada e às províncias na Idade Média. Minha Angola não! República ONG
sim! No auge da exploração e escravidão. De povos abandonados ao seu azar.
O PRÉDIO
O prédio caiado de branco, higiénico, era dos brancos.
Ocupei, ocupamo-lo de acordo com a liberdade do poder popular. Vida nova nos
prédios que conquistámos. Não são mais do colono, pertencem-nos, tudo agora é
nosso. Só meu! Só teu! Vou gozar muito a minha independência. Viva o socialismo!
Viva o poder popular! Arrombei a porta, escrevi na parede à entrada, OCUPADO
MPLA! Os brancos deixaram coisas bonitas, são minhas, catitas!
Deixaram o que nos roubaram (?). Colei um biquíni,
mini-saia ultracurta, espelhei-me e pirei-me. Vou festejar, passear a minha
vaidade.
Não acabam os festejos, conforme os meus desejos. O
tempo passou, senti que algo… jamais voltou. De repente tudo acabou. Chegou o trunfo, triunfo do analfabetismo. Os prédios, o
prédio, alagava na vontade soberana o desejo de autodestruir-se. A água, a luz,
o elevador, não foram os brancos que os levaram. Foi a revolução que os
afundou, que tudo levou. Condutores eléctricos, interruptores, fusíveis,
lâmpadas para consumo revolucionário. Foram-se das escadas para as mãos habituadas,
suadas nestas andanças dos canibais ecléticos, eléctricos. No motor do elevador
alojou-se revolucionário morador, contente com a casinha ao dispor. A cagar num
papel, amontoando-o no convés da rua. A casinhota de serviço do elevador
milimétrica forçada a acolher cinco gloriosos inquilinos inesperados de
contentamento pelo casebre. Novos donos intemporais que se confundem com o lixo
Que trespassam, iluminam a paisagem devastada do inumerável residual dos
brancos.
Degraus das escadas partidas pelo arrastar
das partidárias botijas de gás, e outras devastadoras destruições. Mas apenas
pelo prazer de destruir, início do autodestruir. No terraço alega-se construir
um paço tradicional bantu. Com arquitectura perfeitamente natural. Madeira,
tábuas, chapas metálicas, devaneadas por aí ao deus-dará, ou onde aprovar. As
saídas das águas deixam de funcionar, ofuscam-se, e obrigadas decidem outro
rumo. Invadem a casa do vizinho de baixo, e no seguinte. O do palácio bantu
confrontado, imbecil e canalha, desalmadamente invoca: «A culpa é da Natureza,
não lhe mandei chover»
A grande macacada ensaiava os primeiros
paços da liberdade irresponsável. No quinto andar a meio da varanda plantada,
airosa orgulhosa, desenvolve tronco obstinada árvore. O crescimento alonga-lhe a
fenda, buraco desnivelado. A ramagem optimiza um estendal de roupa. Tiraram a
vontade à água para subir, a electricidade dificulta o luzir. Recomeça a
escravidão, exploração intensiva. As crianças desalinham-se confrontadas com
pelotão de fuzilamento, senão utilizarem o carregar braçal, animal. O liquido
térreo poderoso, oneroso nos seus corpos, que lhes desviará a tenra coluna
vertebral. Novos tempos, novas arquitecturas. Pedantes inquilinos alcandoram-se
recém chegados, promovem terramotos que desabam as paredes internas, que
alternam as estruturas. Partir, desfazer, destruir por entre barulho infernal.
O poder do dinheiro fácil consolida-se. Poderoso, majestoso senhorial estaciona
o gerador eléctrico na base que era do elevador. Perdido na lei do seu quintal
iluminado, de oásis envenenado. Entupiram as fossas que esguicharam merdice e
riem-se, felizes do lodo humano oprimido nas galerias tubulares. Quanta mais
merda mais felicidade no prédio.
Ninguém se importunou com o habitat
anormal da convivência sem regras. O perfume abjecto dita o paradigma da
aceitação social. O lazer decisório impõe o retorno medieval. Do cavar vala e
escoar o fedorento nojo pela rua afora. E das cagadelas, comemoram-se festejos
pelo feito alcançado devidamente autorizados por quem de direito. A água da
infiel empresa do fornecimento abastece a horas incertas. No primeiro andar as
torneiras coloniais esgotadas pelos anos destruidores jorram minando os
alicerces prediais, culminando na destruição precoce. Batem-se palmas e
sorrisos por tais feitos nunca antes vistos.
No quinto andar acomodaram as portas com
bocados de lenha tétrica que desesperadas, esperam a visita de Edgar Allan Poe.
Lúgubres paredes invocam os espíritos dos antepassados. Repartem-se,
aproveitam-se, sobram bocados. Na casa de banho dois buracos fétidos
improvisados espreitam os necessitados. No chão fissurado as intempéries
invadem o tecto do quarto andar desfeito, estóico. Nas restantes áreas,
funda-se, desce, afunda-se no marxismo-leninismo. Um fusível principal interrompe
o circuito da energia eléctrica. Electricistas com instrumentos sofisticados
parecendo do Além com um qualquer alicate – que na falta improvisam qualquer
mistela – puxam, repuxam cabos. A potência eléctrica desordenada aumenta, os
fusíveis restantes enfraquecem, adoecem sem remédio. Acabou-se, extinguiram a
iluminação, repõem-na e algumas labaredas despertam o terror da erupção do
vulcão eléctrico. Lançam fugas com risada para a plateia pela gratuitidade da
tragédia merecida.
Nas traseiras dos prédios reforça-se a
proeminência do poder grande, entre os grandes generais imperiais. Mandarem
partir, evacuar paredes. Saem festejos, com álcool a jorros. Como um rio
desviado do seu curso, nascem lagos, lagoas. Que vitoriosa insensibilidade à
destruição e à morte este povo se contemplou. Na calada da noite ou do dia, as
traseiras dos prédios são óptimas, seguras para amontoar o lixo. O calor
justifica a preguiça e demais acções dos desumanos.
Sempre cansados! Eternamente,
habitualmente despreocupados! Importunados pelos mosquitos dos pântanos
palustres que amiúde constroem.
E os ratos surgem como comboios rápidos
perante a passividade dos seus irmãos na superfície e até das cisternas de água
suspensas. E a tribo bantu não desperta. Infestam-se epidémicos, divertem-se,
comem, dançam com a Peste Negra. Batalham os despojos das festas que se
inventam. O bantu está sempre em festas. Está tudo carcomido, fendido como árvores
sem folhas que são esqueletos e teias de aranha. Juraram! Tudo o que estiver em
pé será destruído. De verticais serão homenageados horizontais. Tudo começa
logo após o nascer e acaba pouco depois.
Sinto-me confusa! Não sei se a vida nos
convida à morte, ou a morte nos abandona. Abriguei-me no analfabetismo e na
mais pura ignorância, destruindo, arrasando o que sobrou da estrutura
arquitectónica colonial. Universalizamos uma imensa pocilga com inenarráveis
porcos.
Imagem:
Aléxia Gamito
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