Diário da cidade dos leilões de escravos
19 de Abril
Ontem consegui
tomar banho de chuveiro, coisa que já há muitos anos não acontecia. É que neste
dia choveu intensamente.
E um grande mérito
se deve ao actual MPLA – e à hipócrita oposição - uma das maiores vitórias da
independência: a reimplantação da escravidão em Angola. P.S. Jamais se esqueçam
do que aconteceu na Argélia colonial.
As intenções da
oposição, orações, desejos, críticas que não passam de emolumentos
confessionários, confissões de crentes, e os habituais discursos da
glorificação da miséria do povo angolano, que não sejam erguidas, seguidas de
manifestação para invocar os direitos da população, dos eleitores que representam,
não passam da teológica retórica sem valor, tal e qual como aconteceu com os
vendedores de Cristo!
Grandioso
comício da vizinhança: Um vizinho faz a introdução: «Luanda já tem mais brancos
que negros.» Uma vizinha: «Se pudessem até carregavam com Angola para os países
deles.» Outro vizinho: «Os portugueses são muito falsos.» Mais outro vizinho:
«Os portugueses são ignorantes e atrasados.» Mais outra vizinha: «São o povo
mais atrasado da Europa.» Ainda outro vizinho: «Estão a vir dos países deles
para aqui arranjarem confusão.» Ainda mais outro vizinho: «Se pudessem até nos
envenenavam.» Ainda mais outra vizinha: «Não vão conseguir!»
20 de Abril
Esta é para
pensarem. Recordo-me que há vários anos o mercado de trabalho em Luanda estava
saturado. De repente surge uma invasão de portugueses que algumas vozes estimam
já em trezentos mil. Bom, a questão é a seguinte: como é possível eles
trabalharem se não têm empregos? É fácil notar que há muito têm uma máfia
instalada que manda vir portugueses para Luanda sem trabalho - a máfia do
compadrio do marido, esposa, irmão, irmã, primos, amigos, etc., - e assim eles
transferem dinheiro para Portugal como trabalhadores fantasmas, sem
trabalharem. E viva Angola! Isto é, viva Luanda!
21 de Abril
Receio que em
Angola existam apenas dois ou três democratas. Os outros são um rebanho de
argentários, pastores e bispos.
Qué isso! Nós
viemos, somos da mata e dela não saímos! Teatro?! Qué isso? Isso dá tiros? Não
dá?! Então se não dá para tiroteios isso não é teatro, nós só gostamos do
teatro que aperta o gatilho. Teatro? Isso é coisa de brancos! Não gostamos de
teatro, merda! Vamos arrasar esse tal de teatro Elinga, e se refilarem muito
também acabaremos com o teatro das vossas vidas! O tiro é a nossa cultura, a
nossa identidade cultural!
23.29 horas. O
vizinho indiano está na sua oração. Parece um daqueles carros das maratonas
religiosas. Mas como ele é um gajo porreiro, um vizinho muito humano, até se
prestou em nos conceder o seu gerador, desde que conseguíssemos um cabo para ligar
do andar dele para o nosso, também é só um andar, e o cabo está aonde? Parece
que não mas quem não vive do petróleo é muito caro.
22 de Abril
Das 13.58 até às
17.43 levamos no focinho com outro corte de energia eléctrica. Às 22.21 horas
outra vez a luz revolucionária se foi, a tal do homem podre.
Ouvi falar na
rua que um senhor mestiço foi nomeado chefe na Angop, os dias passaram e ele
não aparecia em casa. A família estava muito preocupada, pois com certeza, mas
a DNIC- Direcção Nacional de Investigação Criminal, encontrou o corpo já a
cheirar mal numa vala, esquartejado. Uma senhora disse que não bastou só
matá-lo, também tiveram que o cortar aos bocados. Isto está mesmo muito mal,
pior! Quem for nomeado chefe é morto, porque a inveja está demais, e que só
eles é que podem ter dinheiro os outros não. Disseram também que o outro chefe
da Angop, o Camate e mais outro também estão doentes sob suspeita de
envenenamento. Em Luanda o veneno tem ordem para matar! Há muitos
envenenamentos! No trabalho quando os colegas convidam outro para beberem uns
copos, afinal é para o envenenarem.
E o mais notável
que existe em Luanda é a total e completa desinformação!
O bolo Angola é
para uso exclusivo da pequena equipa, dos portugueses, brasileiros e chineses.
23 de Abril
Frustrações
eléctricas. E à nossa miséria total e completa havemos de voltar!
A energia
eléctrica da revolução leninista chegou às 01.15 horas. Mas marchou à nazi às
14.08 e pobremente acendeu-se às 15.17 horas.
E a chuva ainda
não acabou e já as epidemias alastram. A cólera já ataca em Luanda.
Se os chineses
arrasam Luanda – isso todos sabemos – então porque os deixam continuar? Só os
travarão quando nos encontrarmos num mar de destroços? É claro que sim, porque
há quem adore viver na imposição da desgraça alheia! Um gozo pessoal e
intransmissível!
As mulheres que
andam com as chuchas ao manifesto são como uma isca num anzol numa cana de
pesca.
Boa-tarde
república dos milhões de frustrados!
Um frustrado,
dos milhões que não se servem dos fundos do erário público, que tentam viver
honestamente, mas nem isso conseguem porque Angola é só para gatunos!
Outra vez na
baila e quantas vezes forem necessárias. Pouco antes da independência ouvi na
rádio um comunicado do Bureau político do MPLA sobre a miséria das populações
que viviam nos musseques de Luanda. Recordo-me desta passagem que gravei e que
teima em não me sair da cabeça: «E assim o nosso povo continua na miséria.»
Passados, em número redondo, quarenta anos, o tal nosso povo continua como?
Vejo-me obrigado a perguntar: o MPLA era um movimento de libertação nacional ou
uma perigosa quadrilha de exterminação nacional?
24 de Abril
Bom-dia
assaltantes de Luanda! Onde é que hoje farão assaltos?
“Você é parte da minha existência, parte
de mim. Você esteve em cada linha que já li. Você esteve em cada possibilidade
que já vi, no rio, nas velas dos navios, nos pântanos, nas nuvens, na luz, na
escuridão, no vento, na floresta, no mar, nas ruas.
Você foi a personificação de cada sonho
bonito que a minha mente já conheceu.” Charles Dickens
25
de Abril
E como é da praxe lá fomos outra vez
atirados para a escuridão das 00.06 até às 00.51 horas.
Sim! Este mundo é muito estúpido porque
se rege por convenções muito estúpidas.
Os últimos noticiários da Rádio Ecclesia
estão de acordo com as regras do bem desinformar. É só ouvir os títulos e
bazar.
É melhor
comprarem megafones para no caso – frequente – de vos barrarem a saída dos e
das que se estão marimbando para o mau estacionamento. É muito tempo
desesperante perdido. Já vi dois embevecidos amorosos que estavam tão
hipnotizados um pelo outro que não ouviam as buzinas. Teve alguém de bater no
vidro da porta, e mesmo assim demoraram a despertar. Então peguem no megafone e
a plenos pulmões gritem o mais alto que puderem denunciando a matrícula da
viatura, dizendo que o carro está a pegar fogo. Vão ver que têm o problema
resolvido de imediato.
Outra vez a
anarquia permanente, outro apagão das 15.54 até às 16.59 horas.
26 de Abril
Mais um brutal
apagão das 06.42 até às 13.56 horas. E os lordes do petróleo sempre no
silêncio, porque é necessário manter a imagem da falsa energia eléctrica,
porque só os biliões de dólares do petróleo são reais, o resto? Tudo é irreal!
“Permitam me que
diga mas é uma vergonha que a cidade Soyo da província do Zaire seja a única
cidade da costa Angolana que ainda não tem estrada asfaltada a ligar esta
cidade à Capital do País, a cidade que tem o maior investimento de capital
privado e público alguma vez feito em Angola, que hoje em dia é a cidade de onde
sai a maior parte do petróleo deste país (segundo as contas apresentadas
pela alfandega já ultrapassou Cabinda) e agora também tem o Gás LNG, Propano e
Butano, é uma vergonha que não tenha pontes nem estrada a ligar à capital, já
andei um pouco por este belo país vejo evolução e as condições proporcionadas
pelo governo ao povo angolano em todas as províncias e respectivas cidades e no
Soyo parece que andam a brincar com o povo! Espero que com este novo governador
de província a mudança seja feita durante o seu mandato!” André
Reis. Portugueses em Angola. Facebook
Sem comentários:
Enviar um comentário