RCE - República dos Comités de
Especialidade, algures no Golfo da Guiné.
É impossível uma nação sobreviver no
secretismo absoluto das negociatas dos seus governantes.
No palácio, o Rei do Petróleo
agigantou uma festança para comemorar mais uma das suas palavras de ordem que dava
pelo nome de: ENTREGUEMOS AS NOSSAS TERRAS AOS CHINESES. Antes do imponente
acontecimento os serviços protocolares esmeraram-se no envio de aeronaves para transportação
dos governadores de todas as províncias e demais generalato do elenco
governativo da RCE. Notável, como sempre há quarenta anos, era o comité de especialidade
dos bajuladores, do comité de especialidade da Igreja e das igrejas, onde se impunha
a sumptuosidade de um cardeal, bispos, padres e demais acólitos religiosos. Dinheiro
não havia porque o preço do petróleo não consentia, a população sofria mas o
Rei do Petróleo mais se enriquecia. Na RCE o seu soberano imperava como ser
absoluto exactamente como os senhores feudais, dos quais seguia escrupulosamente
os seus ditames. O fausto e opíparo rega-bofe tinha como abertura um duo de
trovadores medievais recrutados na Europa para abrilhantar, fazer jus às laudas
etiquetas desses tempos antigos mas na RCE extremamente actuais. O duo
compunha-se de um hábil mestre de alaúde e de uma bela musa do canto, que assim
inauguraram mais um universo de gastos supérfluos. E a melodiosa voz feminina abriu o concerto
medieval chinês:
O Rei do Petróleo é o único que
pensa
Dá as terras aos chineses ficam sua
pertença
Como se a RCE fosse deles desde a
nascença
E o povo resta-lhe a escravidão como
recompensa
Claro que os ouvintes levaram a
letra da música para os tempos da Idade Média, não a conseguindo associar ao
tempo local. O Rei do Petróleo não quis discursar alegando que estava muito
ocupado com os assuntos do Estado, delegando competências ao cardeal seu grande
amigo pessoal e das colheitas dos dízimos do petróleo. E o cardeal não se fez
rogado e orou a Deus para que lhe concedesse sabedoria, porque sem Ele nesta
terra e neste mundo nada é possível, então já possuído por Deus pregou para os
beneficiários do petróleo e demais riquezas do país:
- Ao nosso omnipotente Deus que
concedeu a graça e o poder divino ao nosso querido irmão crismado Rei do
Petróleo porque sem ele nunca seriámos independentes. Meus irmãos, devo confessar
que não é possível alguém governar em seu lugar porque o espírito de Deus está
com ele na vida e na morte. Isto significa que o nosso bem-amado Rei do
Petróleo governará para sempre e não há poder que se lhe oponha, pois o poder
de Deus é invencível. Mesmo depois da sua morte o Rei do Petróleo nos governará
do além-túmulo em espírito para todo o sempre, portanto não devemos perder tempo
com eleições ou qualquer inutilidade similar porque Deus já designou vencedor.
Meus irmãos, só Deus tem o poder de ressuscitar mortos e impor o seu governo
celestial na RCE. Oremos irmãos para que o petróleo e os seus lucros continuem
a jorrar sob a sábia direcção e gestão do único sábio que Deus nos presenteou.
Finalmente uma palavra sobre a negociata chinesa: Não estranhemos irmãos a
entrega de parte do território da RCE aos chineses. O importante não é o povo
que será mais uma vez escorraçado, das suas terras espoliado, para dar lugar
aos chineses em troca dos biliões de dólares que eles concedem a esta república
em nome do reforço dos laços de amizade e cooperação que unem os dois povos, a
República Popular da China e a nossa também ainda república popular. Meu Rei do
Petróleo, tu és o maior meu!
Do comité de especialidade dos
bajuladores surge uma personalidade bem sinistra. Demonstra-a o seu rosto
sinistro, olhar de pelotão de fuzilamento, roupa de verdugo de guilhotina, de
conjuntura rodeada por uma auréola de intolerância política, arrogância
desmedida, gestos agressivos do estilo, eu faço o que quiser e bem entender, em
suma: o demónio em pessoa.
- Jamais na história da humanidade
se conheceu tão insigne humanista, tão acérrimo defensor do povo e dos direitos
humanos. Nesta república tudo vai bem e a população sente-se imensamente feliz
por ter um guardião que vela por ela, e dá às crianças tudo o que elas merecem.
Nas centralidades e no partir das casas está o sucesso do nosso futuro. As
nossas crianças, os continuadores da nossa gloriosa gesta, nada lhes falta,
incluindo o mais importante: o extremoso amor do nosso querido e atraente
líder, o camarada Rei do Petróleo. Sem ele, o que seria de nós? Não seriamos
nada, apenas uns zés-ninguéns. Confiemos e brindemos ao nosso herói, ao nosso
pai, ao nosso arquitecto da paz, ao nosso mais que tudo. Camaradas! Viva o
nosso camarada presidente! Viva a nossa riqueza. Abaixo as manifestações! Tortura
e morte aos arruaceiros e a quem ouse atentar contra a ordem estabelecida. Viva
as chacinas! Viva o empréstimo chinês e a hipoteca das nossas terras! Viva os
comités de especialidade!
E ouviu-se um estrondoso bater de palmas
como uma ovação da entrada triunfal em Roma de um vencedor dos seus inimigos.
Começava também a primeira reunião oficial
do GEC-Gabinete Especial das Chacinas, onde se deliberou, se decretou que a
próxima chacina seria nos partidos da oposição. Como nota final recomendou-se
que tudo o que fosse religião seria enquadrado no comité de especialidade da
religião. E quem resistisse, não concordasse, se manifestasse, seria entregue,
purificado pelo fogo da chacina.
Há homens que engrandecem países, há
homens que os vendem ao desbarato. A corrupção não andava, por todo o lado
galopava como uma manada de cavalos tresloucada. E na rua ouvia-se mais um
desafortunado como num pregão: «Mais um saque de um português/angolano. Dupla
nacionalidade, duplo saque. Augusto Helder Paiva de Azevedo é o sócio-gerente
da empresa Magnum-Protecção e Assistência, Lda. Funciona em Luanda nas
instalações do CFL- Caminhos de Ferro de Luanda, nas suas traseiras junto à
Unicargas. Nas contas do balanço de 2014 defraudou a conta de Edifícios
Administrativos adulterando-a para Equipamento Industrial no valor de Kwanzas,
593.515.896.50 para vigarizar a FESA-Fundação Eduardo dos Santos, que está em
negociações para aquisição do espaço. Os valores dos Edifícios Administrativos
provêm de facturação falsa de empresas criadas para o efeito. Ora, a Magnum
nunca teve nenhuma instalação industrial, basta ver a sua denominação
comercial. Uma empresa de segurança tem instalações industriais de quê? Foram também
falsificados documentos para pagamento das rendas do ano de 2014 (e anos
anteriores) do CFL no valor de 4.500.00 dólares mensais, e os seus valores
creditados na sua conta pessoal. O terreno é do CFL, e a sua transacção é mais
uma negociata ilegal. Quer dizer, o português/angolano faz a negociata e depois
foge de Angola.» E o nosso pregoeiro termina: «Roubar mais e distribuir pior!» Eis
o paraíso perfeito para a gatunagem empresarial, de bandidos da pior espécie
que sob o disfarce da dupla nacionalidade exercem a sua actividade criminosa,
obtendo elevados lucros e gozando da santa total impunidade.
Nas ruas houve-se o clamor do povo, que as
igrejas estão cheias, que o povo diz que vai vir aí uma guerra pior que a de
1975. Enquanto os jovens do movimento revolucionário gritam que, sem
manifestações não há liberdade.
Pretender acabar com quem vende nas ruas para
sobreviver, é como querer acabar com as moscas, porque ao enxotá-las elas vão
para outro lado. É o desejo mórbido de esconder a miséria para mostrar a
pobreza de espírito dos ricos e das suas riquezas ilegais. Na RCE só há lucros
para os ricos, os pobres são para exterminar.
Mais mil casas foram destruídas na zona da
Funda, arredores de Luanda. Partir casas continua como a principal ocupação da
desastrosa governação. Os desgraçados foram viver ao relento, entregues nos
braços da morte, pois com as baixas temperaturas nocturnas, o frio mata-os.
Mais uma cidadã agora na condição de expatriada disse na Rádio Despertar que
eram três horas da manhã quando “forças de terra, mar e ar”, invadiram a área,
para que os seus quintalões sejam entregues aos brancos, (chineses).
Os chineses já estão a cobrar os juros do
empréstimo a toda a velocidade. Os chineses estão a ser corridos da África.
Acabam de ser corridos de Moçambique, resta-lhes o último reduto, a RCE, e mais
um violento conflito à moda colonial surge.
Imagem: autor desconhecido
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