A jingola petrofaminta, com
o filho às costas
serpenteia pelos carros. Vai estendendo as mãos
na vã tentativa de uma esmola.
O vestuário é decerto o mais pobre que existe no mundo Jingola. Talvez
por isso
ninguém lhe
preste atenção. Cansada de estender as mãos
retrocede para o passeio.
Implora nos jovens
tresmalhados, nenhum deles lhe olha. É como se
ali pairasse um fantasma.
A criança chora ao chamamento da fome. Ela não tem nada para lhe dar. Alguém atira o resto
de um cigarro
para o chão. Ela apanha-o e fuma-o. Sente-se contente,
até faz uns ligeiros movimentos de dança.
Pega numa garrafa
de plástico e encosta-a a um tubo donde
sai água de esgoto.
Enche-a, depois bebe-a. Desloca a criança das suas
costas e oferece-lhe a garrafa.
A criança deixa
de chorar. Alguns novos-ricos que estão bem na vida acabam de enganar, mais uma vez, a
vida desta mulher (?) e a sua criança.
O premiado artista
reconhecido internacionalmente, o jingola
Etona, é desprezado no seu reino. As estruturas governamentais
não lhe
atribuem nenhum valor.
Afirmou que obterá outra
nacionalidade.
Os casos de tuberculose verificados ascendem a trezentos por mês.
Podemos falar de uma epidemia.
É necessário rastrear o
contacto mantido com os infectados, antes que
sejamos todos afectados.
A polícia
cercou o pátio do Marquês dos Cofres
Gerais e correu com os manifestantes.
Evitam-se por todos os meios
o arranque de fábricas.
As que existem não
se abastecem de matéria-prima, para que deixem de
funcionar… para que se possa importar. Os importadores têm amigos
no estrangeiro, e empresas
lá constituídas que
lhes facilitam imenso
a vida. Assim
é desde a independência (?). Nos últimos
anos de paz não houve nenhuma alteração.
Os intermediários e beneficiários
das importações são
sempre os mesmos.
A cidade de Jingola está cheia de armazéns
de importadores. Não se produz nada. Só se pensa em
importar… isto é muito demolidor. Não
temos segurança alimentar.
Tudo o que
comemos é importado. Produtos
adulterados, contaminados, fora do prazo. Comemos tudo.
Ninguém dá importância. É uma boa piada, o reino Jingola pretender um assento no Conselho
permanente dos Reinos Unidos. Reino
Jingola, o pior reino do mundo para crianças. Maior índice de
mortalidade infantil
mundial.
As obras do general continuam. São
pessoas muito
edificadoras, estão sempre a fazer obras de dia e de noite.
Hoje acrescentou umas chapas de zinco
no prédio inacabado,
para que não possamos ver nada. O que
esconderá ele? Qual
será o seu receio?
Na tentativa de
sobrevivermos a este inferno, lembrei à Lwena que
se adoecermos não temos dinheiro.
Não sei como
será. E os filhos são
como se não
existissem. Não se preocupam com os pais, com nada.
Eleições?! Quem deixará o poder
depois de mais de trinta anos?! Quem?!
Estão tão agarrados,
tão colados ao dinheiro
que não ganham, que
nunca permitirão eleições. Quem pensar o contrário, só
os incautos.
A liberdade de expressão a todos os vice-reinos continua suspensa. A Rádio Oráculo, por
exemplo, não
está autorizada a emitir. Isto
é um grande
reforço para que as eleições
não se realizem. As vias
de comunicação intensificam a
intransitabilidade quando a estação das chuvas se aproxima. Uma coisa
é certa: o reino não pode ficar muito tempo sem eleições.
O professor americano
Mac Millan da Universidade de Stanford,
disse que a corrupção é a única
instituição que
funciona no reino Jingola. Na guerra que o Marquês dos Cofres Gerais faz ao FMI, por causa disso, os economistas da nobreza Politburo, apoiam a carta que o
Marquês enviou ao director do FMI.
Na informação diária sobre incêndios, os Bombeiros Reais Jingola disseram que um cidadão abasteceu combustível
no gerador com
um candeeiro
aceso. Além
dos estragos no gerador
e no local, o cidadão ficou bem queimado.
Lembro-me que há uns meses num barco de pesca, à
noite, cheirava a gasolina. Alguém disse para acender um fósforo para ver
o que se passava. O barco
ficou destruído. Só um
pescador se salvou. Numa residência, à noite, às escuras, cheirava a gás.
Alguém se lembrou de acender
um fósforo para
ver donde vinha
a fuga.
O general
construiu um pórtico
de ferro no extremo
do terceiro andar.
Será para acesso
a helicópteros? Ou
para um elevador externo?
O meu cliente mandou buscar as pastas com os
documentos por causa
do advogado, para
confirmar os pagamentos
que lhe
fez. O advogado diz que
ele lhe
deve seis mil dólares. Vai-me pagar ainda esta semana.
Disse-lhe que se não
me pagar, farei uma exposição
ao Marquês dos Cofres Gerais. O reino sofre um
grande rombo
com as fugas ao fisco.
Pior que
o Titanic. No fim de cada ano, se em
média uma empresa inventar
documentos no valor de um milhão de
dólares, vezes mil,
duas mil, três
mil empresas,
isto dá uma quantia
astronómica. Daria para criar
empregos. Não
estou a gostar nada
disto. Estamos piores que no colonialismo. Como
o reino não tem contabilistas,
não os quer, despreza-os, odeia-os, eles aproveitam e enriquecem-se com muita facilidade. E ainda têm coragem
de conspirarem contra o Governo do reino
Jingola.
A Lwena foi saber a conta
da luz. Estamos aflitos
porque não
temos dinheiro. Estou a ver
que vamos ficar
desligados.
Na Rádio
Oráculo, o Etona disse que há um provérbio
Bacongo, onde só
uma pessoa não
consegue tocar batuque, dançar e apitar.
Para isso são necessárias três
pessoas. Em Jingola são sempre as mesmas que tocam os mesmos instrumentos.
UNICEF informa que
morrem de fome 200 crianças
por mês.
É fácil ver que a cidade capital Jingola está completamente
gradeada, e com as traseiras dos prédios fechadas. Se houver um incêndio num
prédio, não
sei como os bombeiros
farão. Parece-me que ninguém se lembrou ainda
disso. De qualquer modo é só facturar, colonizar. Isto é tudo para destruir.
As explosões de
Londres, sem dúvida efectuadas pela Al-Qaeda, lembram uma vez
mais que
as suas células
são, de certo
modo, invencíveis.
A questão é o dinheiro.
As democracias ocidentais
e as suas economias só funcionam nos seus países. Nos outros utilizam a democracia
para explorarem os seus
povos, impondo ditaduras. É uma revolta geral com a criação
de mais células terroristas. Se as democracias ocidentais
persistirem no neocolonialismo, os actos terroristas
aumentarão até conseguirem rebentar alguma bomba
atómica?! Afinal, a economia é uma ciência que
serve para explorar os povos. E inventaram o telemóvel que
serve… para rebentar bombas.
O Bastonário da Ordem
dos Advogados informou, que dos
setecentos inscritos, só vinte por cento
funcionam. Os restantes estão no desemprego. Isto revela o caos sintomático em que se encontra a economia
do reino. Já não existem fábricas, transformaram-nas em armazéns
ou estabelecimentos
comerciais. A MABOR fabricava pneus, agora
importam-se, tudo se importa… até mulheres. Com poucas pessoas
um armazém
faz as suas vendas.
Porque não
existe produção, generaliza-se o desemprego. Nos
vice-reinos as populações morrem à fome. Fogem para a capital
de Jingola aumentando cada vez mais o
desemprego. É fácil fazer
uma pequena fábrica
de tomate enlatado e de vinagre. Limão importado que
não presta, caríssimo. Na rua compra-se bom
limão nacional
por baixo preço. Não
se entende como é possível
importar tomate,
limão, vinagre,
sal... importar tudo. Na realidade
sem nos
darmos conta já vendemos o reino.
Na floresta do Kinaxixi
surgiu uma nova quadrilha
de jovens delinquentes. O Floresta Squad.
Sobem e escondem-se nas árvores. É assim que fazem
as emboscadas às suas
vítimas. Quem
passa ou
ali vive, sofre o terror
constante deste grupo
de jovens desempregados. Com armas de fogo, garrafas partidas, catanas
e outros objectos, sobrevivem a roubar os bens que restam dos outros
esfomeados.
Suicídio no prédio
da Chechénia. Mais um
jovem atirou-se do nono
andar. Não
sobreviveu. É a décima vítima. Receio que isto fique contagioso. Que
muitos jovens
decidam este caminho.
Já temos tantas epidemias.
Devemos acrescentar mais
esta, e tomar medidas
antes que
seja tarde. São
jovens que
não chegaram a ver
o feixe ténue da luz
da vida.
Um anúncio de
uma marca de cerveja, faz questão que
jovens meninas numa esplanada, depois em casa, numa festa,
a dançarem, com os seus
amores, apela
para beberem cerveja.
Quando acabarem estarão muito bêbedas. E com
a cabeça perdida fazem amor à toa. Depois vem a SIDA. Não
entendo o porquê deste apelo para alcoolizarem as jovens. Os inventores deste e doutros anúncios deviam
responder em tribunal. E
publicarem outro anúncio que apelasse às jovens
para frequentarem bibliotecas,
lerem livros. Praticarem um desporto e
assistirem a um filme
que retratasse a vida
de um grande
escritor, escritora, ou algo similar. E beberem um
sumo natural.
Convém lembrar que
quatro cervejas
numa jovem equivalem a oito num homem.
O Cliente disse
que me
enviaria o dinheiro, até
agora não
o fez. Ele não
difere de todos os outros
que aqui
chegam. A sua missão
no reino é roubarem. Rapinar sob a protecção da nobreza. E os roubos não são nada
pequenos.
O general
fechou o quarteirão com
chapas de zinco,
e construiu dois prédios
até ao terceiro
andar. Queria aumentar mais andares, mas há alguns
meses que as obras
pararam. Acho que alguém
se opôs. Como o local
é bem escondido, quase
que ninguém
sabe o que ele
lá faz. Asfaltou a rua que dá acesso
ao seu palácio,
dizem, por cem
mil dólares. Construiu uma piscina, o que faz com que a água diminua, desapareça das nossas torneiras. Tem muitos
ares condicionados. No tempo do calor
a luz não
vai aguentar. Mas não
o afecta porque tem um
potente gerador.
Agora está a cimentar
as paredes com tijolo
na parte externa
do outro prédio.
Retirou uma das cortinas verdes e está a pôr tábuas de madeira
nas escadas. Uma vez
ameaçou-nos que nós
temos os dias contados. Como é que ele consegue dinheiro para isto tudo? Ele trabalha na Logística Real... é por
isso.
O filho com trinta anos
de idade passou novamente dois
dias na bebedeira.
Chegou e desculpou-se que lhe puseram qualquer
coisa nas duas cervejas
que bebeu. Eles e elas
passam a vida nestas coisas. Não
sabem fazer mais
nada. Estão perdidos sem futuro. Completamente frustrados. Se trabalham dois
dias, ou
quando apanham algum
dinheiro, vai tudo
para a bebedeira. Os dias restantes ficam a aguardar
que ela
passe. Não
sabem o que é trabalhar.
Sempre com
a cabeça no ar,
que parece uma máquina
de partir pedra.
Não sei daqui a quantas gerações é que este reino se vai levantar.
Olha-se para a rua e só se vêem
mulheres com
coisas nas cabeças para
venderem. E carregam mais coisas nas costas,
os seus filhos.
Que triste
destino e escravidão
para estas mulheres
no reino, que se diz o mais rico do mundo.
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