quinta-feira, 5 de julho de 2012

Os Jasmins da Lwena (05) Não há bons governantes, apenas homens que executam o desejo, a vontade do povo.


Acreditar nestes políticos é como viver num prédio prestes a desabar. E são tantos, os prédios. Como generais no poder, democracia generalizada, militarizada. Com dois desejos, duas faces. Qual deles, qual delas?! E assim constituíram-se populações mal-educadas intencionadas, óptimas irresponsáveis, moldadas e acondicionadas. Como monges em falanstérios e magias que insistem em moldar-nos, dominar as nossas mentes. Não há bons governantes, apenas homens que executam o desejo, a vontade do povo.
Um cientista Jingola dissertou que a população é famosa pelo seu analfabetismo. Que não tinham direito a instrução. Isso, e por causa da fome, descobriu que só usavam dez por cento do cérebro.
Não sei distinguir se é a água que arrasta o lixo, ou é o contrário?! Lixo, água e comida. Na transfusão diária à Nação, o boom da cólera expandiu trinta mil infectados e morticínio de quase mil. A acção planejada das chuvas divulgará subitamente a epidemia. Na terra ávida por cadáveres, a cólera diminuirá quando a população escassear.
Abriguei-me num contentor na desespera que a chuva desalentasse. Para obter tal permissão comprei uma cerveja. Senti que a minha respiração se dificultava devido ao fumo que vulcanizava no interior. Apenas duas pequenas janelas nos extremos velavam o arejamento. Desloquei-me para a mais próxima, era, parecia o fumo do Vesúvio. Olhei para a jovem que fingia ser empregada. Tentei defender-me.
- Donde vêm tanto fumo?
- Dos geradores.
- Vamos morrer intoxicados. Presumo que há deleite nisto.
- É isso! Um é do general, o outro é dum novo-rico da padaria. Já refilei, deram-me a importância do desprezo. Reino governado por generais é assim. Subi ao castelo dos deuses sanitários, ameaçaram-me com a morte. As ameaças tornaram-se tão vulgares. Creio que devíamos mudar o nome para reino das ameaças. Esta gente é como Napoleão, é tudo deles, pensam que são invencíveis.
- Descolonizadores, novos mentores.
- Mais um campo africano da morte, mais um quilombo de caveiras.
Os olhos começaram-me a arder, a garganta a condescender. Fugi para debaixo de um toldo que servia de habitação a duas famílias que ficaram sem casa-casebre. Foi destruída por um príncipe para construir uma mansão. Podia abrigar-me da chuva se fizesse despesa. Só havia cerveja. A chuva amainou. Daqui até Tule, mais ou menos em Viana, terei que desandar cerca de vinte quilómetros.
Luanda, o condomínio Jinga Isabel está fissurado, ainda há pouco tempo inaugurado. Foi construído (?) por uma empresa brasileira. Resta saber o nome da empresa. In Tv Zimbo.
E quando os prédios e torres começarem também a racharem? É que quando chega a época das chuvas, e a tendência é chover mais, cada vez mais, muitos lençóis freáticos ganham corrente, revivem. Literalmente, Luanda assenta-se sobre um rio subterrâneo.
Comprar carro é acrescentar mais um buraco à tormenta do nosso desviver… como navegar sem mar. As estradas não são necessárias mas, pode-se confessar que tudo é um mal necessário. Um horrível esforço de martírio altruísta foi projectado para o nosso modus vivendi. Consistência de perder muitas horas, encontrar a velhice precocemente, perder a saúde. Hábitos de regozijo incutidos sem apelo devassam, grassam na lotaria das ruas que já não o são, nunca o saberão. Os prémios principais são buracos e lodaçais. Ruas escavadas devido à intensa prospecção dos malignos sentimentos petrolíferos.
Oh! Que noites, que festivais, que mães com séquitos de pardais, para onde caminhais?
A criança adianta-se, nefasta apressada. Pára, volta-se, incita o andamento. A mãe carrega a idade da ditadura do sofrimento, sem lamento. Na cabeça, uma carga que não alivia a sobrevivência da inconsciência do governo petrolífero. Nas costas, sobrecarrega o peso recente da infelicidade nascida, adormecida. Pela mão, a contrariedade da criança arrasta-se esforçada na contra-mão do retirar o pão da boca. É a mãe, das mães dos agora colonizadores negros da negra miséria. Dos indistintos dias, das inextinguíveis noites orgíacas das políticas palacianas. Ó negra miséria, decerto no incerto caminhais. Nas ruas alagadas de campos petrolíferos, pastos negros, prados negros que não servem para comer, nem para beber.
Muitos poetas, advogados, economistas e poucos engenheiros. Povo analfabeto nunca será independente. Conhecimento é liberdade. A miséria é negra, da cor do petróleo. O poder temporal é momentâneo, o espiritual eterniza-se.
Atirei o meu telemóvel para o lixo. Evito os assaltos, quero caminhar normalmente, não quero ficar sem vida eternamente. Ganhar o presente dos assaltantes e perder o futuro. Apesar de muitos seguranças métricos que guardam o que não lhes pertence, a intranquilidade é palustre. Muitos seguranças, muita insegurança. Tudo tão inconfortante, abundante. O lixo é superabundante, os baldes das águas imundas cozinham-no. Colossais colunas de lixeiras esculpidas como os estábulos de Augeias. Jingola contratou Hércules para a derradeira décima terceira tarefa… acabar com o lixo. Seria pago com vários tosões de oiro. Não conseguiu, desistiu, desamarrou-se furioso porque vinte e oito assinaturas eram comissionadas. Não sei, não sabemos, ninguém me consegue explicar, entender que regime é este que nos governa. Acho que é um regime com cheirinhos de todos os governos igualitários, totalitários existentes no mundo. Universalizado, engalhado.
Passa a escolta vulgar de invulgar administrador. Um sacerdote lapidar, escoltado de fingida bondade, desapercebe-se da trama que os doutores do nosso destino escorregadio lhe invectivam. A escolta do medo, insegura, medrosa, despenca no desprotegido, potencial inimigo disfarçado, que atrapalha, inibe a passagem do mais que parecido cortejo funéreo. O sacerdote é espancado e abençoado pelo poder intemporal. Imolado no cumprimento de ordens superiores, sancionadas por inferiores. No estabelecimento do ritual satânico do Politburo Jingola, barbárie enfeitiçante de imitação da selva civilizada. Os peregrinos deslocaram-se dos seus santuários. O embondeiro secou a mabuba também.
No reino Jingola, Estaline revive, e claro, as deportações também. O Grande Líder já criou os gulagui tropicais que sacanamente o Politburo chama zangos. É puro, é nacional e eles gostam. Assim, o extermínio dos negros está assegurado, para gáudio dos terroristas imobiliários e especuladores internacionais. 
É uma das suas músicas mais barulhentas preferidas, e impropera para o som desconjuntar os sentidos… elevar a identidade cultural. Mostrar a mitologia não ancestral, mas a actual, dos lençóis petrolíferos, dos campos diamantíferos, das vastas extensões de terras incultivadas, famintas. Ela desvenda no corpo a dança, mas esqueceu o desvendar do mistério da luta de libertação que se actualizou na nacional destruição.
Ouvir música é como uma grande trovoada, e não são necessários o ribombar de mil trovões e a cegueira de mil raios alaranjados. Condimentados pelas máquinas monstruosas dos novos construtores que furam passeios, ruas, terraços, que destroem e reconstroem os solos, a solo e em conjunto dos escapes livres das rápidas motorizadas, autorizadas para desafiarem Júpiter. Música tradicional importada, dançar, se embebedar, se drogar.
Como o pai de Voltaire hoje diria: uns filhos em prosa, outros em verso. Os pais serão sempre chamados caducos e calhambeques, porque não alimentam as loucuras dos seus filhos. Já não temos filhos. Duvido que alguém os tenha. Serventes de Brutus, para roubarem e assassinarem pais. Para dançarem, beberem e dormirem.
Olhei para o que restava naquela casa-casebre. Duas ventoinhas que funcionavam com sorte. Estavam entrevadas, avantajadas de ferrugem. A televisão trabalhava à pancada. Por causa das falhas da energia eléctrica o frigorífico ligava, desligava. A cama descuidada, sempre desabava na hora do deitar. Dos tetos da casa de banho, da cozinha e do corredor, os pingos de água comodamente destruíam o sonho de um lar. Deixaram de ser tectos, eram grutas com quase estalactites. O casal sexagenário trabalhou e lutou pela sua pátria. E parvamente na tal luta da libertação, e agora pela pátria e família abandonados, resta-lhes o consolo da sonoridade musical, o raiar dos momentos românticos, do mais um recenseamento… para ficar tudo na mesma e os mesmos receberem sempre as mesmas pensões.
Tanto petróleo e diamantes! Quanta mais riqueza mais pobreza. Onde os cofres estão muito cheios, há muita escravidão. Escravos tecnológicos das novas tecnologias. Escravos dos modernos Cavalos de Tróia. Oiço as viuvinhas que saltam nas árvores, mostrando o manto do seu canto. Nunca acreditarei no Homem, enquanto existir um só ser humano que passe fome.
A minha caminhada prossegue. Vejo que a macroeconomia se desenvolveu, o que permite a muitos jovens lavarem carros nas ruas. Destas escolas de lavagens sociais nascerá o novo homem, adaptado à nova vida. Com os panos enxugam a chaparia, mais um produto acabado está pronto para entrega. De cigarros embocados trocam impressões.
- Sabes onde está o rei?
- Sei! Está de visita privada nos brancos.
- Deixou-nos sem luz.
- A minha mãe quando paga a conta, reclama que ficamos muitos dias às escuras, e que o valor a pagar devia diminuir, mas é o contrário. Sobe muito.
- Quando o rei voltar seremos mais iluminados.
O crescimento económico é factual. Um bando de lobinhas sirigaita o desenvolvimento da economia. Na precoce rendição infantil de crianças da prostituição, ratinham a perseguição dos lobões
Na entrada de um prédio ouve-se barulho metálico. Um jorro de água vertical surge. Uma jovem aborrecida quer saber o que se passa.
- Mingo, porque é que você fez isso?!
- Parti a torneira com uma pedra porque não me querem dar a chave do cadeado… tenho carros para lavar!
- E quem vai limpar a inundação?
- Não sei!
Duas motos rápidas passam em grande velocidade. Sem escapes, o barulho provoca dores de cabeça. Os alarmes dos carros estacionados disparam. Tapo os ouvidos com os dedos. Na janela de um prédio o ar condicionado arde. Os basbaques à distância acotovelam-se. Alguns afirmam com desmesurado orgulho.
- É bem feito! É bem feito! Gostam de morar nos prédios!


1 comentário:

  1. Os camaradas chamaram-me bicho
    e colocaram o meu voto no lixo
    porque não votei como naqueles boletins que há,
    os que eu vi
    a chegarem de Madrid
    impressos já
    com uma cruz a favor do MPLA.
    Eles disseram que os votos na oposição
    são considerados nulos ou abstenção
    e, por vingança ou capricho,
    colocaram o meu voto no lixo.

    António Kaquarta
    http://miradourodoplanalto.blogspot.com

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