ESTA EPOPEIA ÍNVIA
O vírus da democracia: «O bicho da democracia mordeu e
o vírus vai espalhar-se rapidamente pelo organismo político do mundo árabe. O
resto da humanidade deve ajudar este vírus bom a espalhar-se e a gerar a
pandemia da democracia.» Mondi Makhamya, comentador sul-africano.
Nascemos, porque a isso somos obrigados. A tragédia
humana necessita de actores. Sem nos darmos conta, o teatro humano absorve
muitos figurantes. Uns representam bem, outros tentam, não conseguem. No fim
resta-lhes o bater palmas. A vida é uma representação sem teatro. Quem nela não
conseguir representar o seu papel de actor, será esquecido. Apenas lembrado de
vez em quando numa qualquer cova de terra. Sobrarão os ossos para encenações
rituais, de seitas, cultos religiosos que nos esperam, nos espreitam nas nossas
portas, nas janelas das nossas mentes. Os nossos restos mortais não acabam,
alimentam o tráfico da sobrevivência da feitiçaria que resta dos milenares cultos
escondidos, disfarçados. A luta actual é final. Os cultos que o Cristianismo
pensava extintos, regressam em força. Retrocedemos na história, viajamos no
tempo, ao reencontro das nossas origens. Os espíritos dos nossos antepassados
regressam, estão de volta. Nenhuma religião pode aniquilar outra.
Dois milénios de história são insuficientes para isso.
Este inferno em que vivemos tenta acabar com o renascer do Caminho. Uma seita
religiosa tentou acabar com as outras, não conseguiu.
Estranhamente, lembro-me dos celulares, esses
dispositivos da tecnologia avançada do primitivismo, do menir, da anta, do
altar que necessita sempre de sacrifícios, para carregarem as baterias dia e
noite. Da civilização da pilha e da bateria de pedra.
E há quem acredite que estamos num estágio muito
avançado da evolução. Perdemos o tempo que nos resta da vida a pressionarmos
teclas com os dedos. Alimentamos as pilhas que restam da civilização. As teclas
do amor que alimentam o nosso coração, não se pressionam. Que o amor é uma
ciência, uma arte. Malditos dissabores sejam estes. Conheci e vivi no sistema
que me obrigaram a seguir. Lutei com as minhas forças dia e noite para o manter.
Mas com o tempo descobri que era enganador, ditador.
Obrigada a seguir leis, doutrinas que acreditava serem
correctas: Amarás a um único deus para sempre. Para seres recompensada na vida,
terás que trabalhar como uma escrava. Porque no fim receberás muitas
recompensas e terás uma velhice condigna. Não desprezes o teu pai e a tua mãe.
Respeita, obedece aos teus superiores, porque serás recompensada. Elogiada na
glória dos céus. Não cometas adultério, e sobretudo nunca faças amor com os
teus pais. Nem com os teus irmãos, porque isso é contrário às leis da Natureza.
Evita o descanso, porque o teu patrão espera, desespera, vigia-te
constantemente. E sem ele nunca serás ninguém, porque é ele que te paga pelo
teu trabalho. E se não te pagar não terás dinheiro para comer. Morrerás de
fome, tu e os teus. Por isso, ajoelha-te perante ele. A Igreja abençoa-o
primeiro, e depois virás tu, porque a Igreja sem eles não subsiste. Arrasta-te
e não penses porque serás excomungada, queimada nas fogueiras seculares das
oficinas abençoadas do sangue do Santo Graal. A tua missão é trabalhar e
obedecer-lhes. Se assim não fizeres, se tentares descobrir o Caminho, teremos
que te aniquilar. Porque o muito pensar faz descobrir coisas de Giordano, de
Galileu, de Da Vinci e outros apócrifos.
O nosso tempo não tem espaço. Os nossos teólogos estão
atentos. Deus, seja ele quem for, aquele que inventámos, o nosso Deus que nos
domina, que nos controla. Que domina as mentes dos homens, essa entidade
implacável que nos nomeou como seguidores eternos. Ele que nos deu o poder para
governarmos a Terra. Por isso somos os senhores do Universo e de tudo o que
nele vive. Não toleramos oposição, e muito menos iluminados. O seu seguidor
papal é infalível, em tudo no que diz e faz. A verdade é, somos nós, não existe
outra. Sofram e morram à fome, porque no fim o reino dos céus será abençoado
com a vossa presença. Ai de quem duvidar desta eterna verdade, porque não foi
em vão que inventámos o reino do inferno. Quem for a nosso favor tem o céu,
quem for contra, tem o inferno. Nada mais fácil que esta sentença para
dominarmos o Universo das almas perdidas que nós criámos e alimentamos. Só
existe uma verdade absoluta. Somos os detentores dessa verdade que criámos com
o apoio das mais abomináveis mentiras. A vida sem mentira não tem significado e
para a apoiar, acabámos com o útero dos carvalhos, e gerámos a grande hipocrisia
divina. Esse demónio de duas patas, esse bípede selvagem indomável.
Que não receia a escuridão da mente. Na dúvida
aproxima-se e pede-nos auxílio, porque se sente tranquilo, dominado. Apenas com
a apresentação de uma vulgar cruz, reis, príncipes, grandes senhores foram
dominados. Porque não terá que continuar assim? A verdade é o temor eterno das
coisas, e quem se aventurar a descobri-las, o Caminho que conduz ao Deus deles,
terá funestas consequências. Porque quem o descobriu primeiro, esses são os
eleitos e nenhum deus admite concorrência. Uma empresa poderosa que domina o
mundo aceita outra no mercado?! Não! Porque isso é desleal! Acorrem de imediato
os seus defensores contratando os melhores advogados. São os segredos ocultos
dos cultos religiosos.
Uma grande empresa de negócios mundial é como uma
grande igreja. Os negócios têm uma religião, a igreja também. De modo que, como
somos todos cegos, estamos impedidos de o ver. As searas plantadas que os
nossos pés delimitados pelos campos minados da história da infâmia esbarram
panfletários: NINGÉM MAIS ROUBA! APENAS NÓS! EU!
O silêncio da noite interrompe-se pela
vozearia contaminada, alcoolizada pela hipocrisia do Ocidente que finge, apoia,
tiraniza as repúblicas do petróleo que nos exterminam. Onde estão, onde ficam
os intelectuais!? Perderam-se algures
offshore e onshore. Um povo não se conhece pela
riqueza do solo, do subsolo. Um povo é rico pelo número dos seus intelectuais.
Nunca pela adorada propensão alcoolizada, fomentada, injustiçada. Não havendo
justiça, há muita mão à disposição.
Para
amar basta brotar, gostar de dois promontórios e uma fenda. Não, não gostam… fingem. É um sentimento vago, que se
esvai como a cópula. É um prazer momentâneo. O ser humano habituou-se a não
perder tempo com as súplicas da Natureza. E os banqueiros nunca dormem, obrigam
as marés dos mares de gente a apressarem-se, a carregarem as ondas do
papel-moeda. Que tem um som similar à ondulação, um canto, um cheiro matinal
superior ao do mar, universal. Fabricam tudo.
Não sabem que conseguiram criar fábricas onde o amor
sai enlatado? Agora tudo serve de negócio. É verdade! Quero amar, vou a um
supermercado e compro uma lata cheia de amor. Levo-a para casa, abro-a,
apresento-a ao meu amado. E aí temos uma noite grandiosa de suspiros e ais
enlatados. Depois despejamos tudo na pia, e o destino é o mar. Podem imaginar
como o mar se sente. Nunca pensaram nisso, repararem que todo o planeta assim
procede. As pessoas sentem remorsos quando se aproximam da espuma branca
marítima.
Porque sabem que os restos do seu amor andam por ali
perdidos. Creio que têm receio que os oceanos engravidem. E que as marés ao
encherem inundem a leveza da neve transparente. As areias das praias com… como
filhos enjeitados. Para quê tê-los, se não há tempo para os educar. Não se lhes
dispensa nenhuma atenção. Nem sequer os levamos para contemplar uma árvore… para
quê se o verde já foi comprado por algum dos inúmeros banqueiros e
insconstitucionais. Isto é assim: entre fazer amor e gerar um filho, há que escolher.
Dez minutos de coito, e o dinheiro no seu banco deixa de render. Os pais
teimosos que conseguem fazer filhos, no fim têm a surpresa habitual. As
poupanças nos depósitos bancários utilizam-se para pagamentos a psicólogos e
psiquiatras.
Ouvi um grande cientista afirmar que esta é a
civilização da psique, a psique do dinheiro. Nada mais fácil. Para enriquecer
rápido basta tirar um curso desses que explica como curar a mente. Estamos a
gerar filhos idiotas para internamento psiquiátrico. Há uma degeneração
somática devida às fobias que assolam constantemente a mente. É quase um
milagre dormir em paz. As
funções genéticas alteram-se porque o sono não consegue ser reparador. Somos
todos pacientes, acordamos a qualquer momento da noite com pesadelos. Não conseguimos
dormir mais, e se insistimos acordamos com espasmos violentos. Porque não
conseguimos retirar as preocupações que dominam o nosso cérebro. Este, quando a
claridade do dia surge está como bêbado. Como se acabasse de jorrar uma garrafa
de uísque. Na tentativa de o ajudar, fuma-se um cigarro, depois outro. As
próximas noites serão continuadas como uma floresta virgem, onde aparecem
escavadoras que desflorestam o sono reparador das noites. Surge a saída: os
tranquilizantes que no início resultam, mas depois vazam-nos a existência.
Porque não existe paz para a mente. Os filhos gerados desta mutação sem o verde
planetário, que existia, recebem os dotes dos progenitores e a sua missão é
muito simples: Destruirem os bairros, as cidades, os países, a Terra.
Não há nada…
nem ninguém que não se enterre nas comissões das corrupções sectoriais que
enchem os destemperados petrolíferos da fome. Oh! Como vos desnaturais!
Acabou a vigarice da independência, voltei a lavar
roupa. Consegui emprego como lavadeira. Lavo e engomo. Regressei ao passado
colonial pois então! A minha luta com o tanque de esfregar os tecidos não pára.
Não consigo vencer o tanque. Há sempre roupa para lhe colocar e lavar, e a
ferro passar, engomar. A senhora proíbe-me de almoçar. Com fome saio fraca,
quase a desmaiar.
Meu Jasmim Branco! Foste e deixaste, abandonaste-me a
tua Jasmim da Noite.
Eras como um alaúde sem Idade Média. Não ouvirás os
beija-flores. Não verás mais o prodígio do equilíbrio do seu sugar. Nem as
marés quentes que se estendem, horizontais., e verticais sob os mangais.
Alarmam, chamam os caranguejos das marés. Que se desabrigam a saírem das suas
caves inundadas.
Caminham como aranhas na maré-cheia, rotina marginal.
Não me verás mais ondular no verde intenso do capim. Sem ti, senti a memória
passada do meu biquíni. Na frequência oscilante da fragrância marítima.
Sei agora que após a tua despedida da vida, o amor
deixa rastos invisíveis, invencíveis. O Taj Mahal e o Mausoléu de Halicarnasso
não superam a grandiosidade desta tua prematura púbis cabeluda, onde anotavas,
apontavas, desfloravas qual densa mata do Maiombe.
Na eterna espera do teu regresso talvez estejas a um
minuto, ou biliões de anos-luz num longínquo desconhecido. A distância que nos
separa desse muro cósmico, será nos próximos milénios assegurada. Quando os
vindouros proclamarem o ressurgir da vida do suspenso momentâneo actual. Por
aqui cada dia tudo está a ficar demasiado violento. As tempestades, os ventos, ultrapassam as maiores batalhas. Rompem
facilmente a História destas muralhas.
Eras a minha sinfonia, a harmonia, antes da agonia
outra vez deste mar. Deste colapso esverdear. Até os pássaros deixaram de voar.
Secaram tudo. As florestas, os bosques, os rios. Esconderam o encantar do já
nada existe para amar. Tudo está esclarecido, estarrecido noutra dimensão a
pairar. Nos confins da inconsciência do reduzir outra vez tudo a pó.
Outra melodia será universalizada quando este Jesus
Cristo acabar e outro surgir do fundo das águas. Ele está a ser modelado, e
desta vez para sempre será libertado. Não ouvirão parábolas, apenas o seu olhar
de compaixão. Para os maldosos, crentes insistentes, não existirá perdão.
Grande reconstrução, um gesto e uma bênção.
Imagem: Aléxia Gamito
Sem comentários:
Enviar um comentário