«Os projectos são elaborados por agências situadas no
exterior, às vezes na capital do país, em Bissau. Para um projecto
de um milhão de dólares destinado ao desenvolvimento rural, por exemplo, cerca
de 15% já são consumidos por taxas administrativas da agência de execução, seja
ela a FAO ou outra qualquer. A agência de execução recrutará peritos para
executar o projecto, já que os técnicos são raros no país. Estes técnicos
custam actualmente algo da ordem de 7.000 dólares por mês. Antes de chegarem os
técnicos, é claro, há missões sucessivas: missões de identificação de projectos,
missões de estudo de factibilidade, de estudos de execução técnica. Durante o projecto
há missões de acompanhamento de execução. É normal a metade dos recursos
fornecidos ser consumida neste processo, voltando assim o dinheiro oferecido
para os países ricos, sob a forma dos salários elevados dos técnicos.» In Ladiaslau
Dowbor. Guiné-Bissau. A busca da independência económica.
A mudança nas tecnologias muda as dimensões espaciais
do trabalho, na medida em que as finanças, o comércio, os diversos serviços
“intangíveis” que hoje assumem tanta importância, como publicidade, advocacia,
gerenciamento a distância, circulam nas “ondas” do novo sistema de informações
(TCI – Tecnologias de Comunicação e Informação) em segundos, fazendo por
exemplo uma secretária que trabalha em Washington perder o emprego para uma
secretária que vai fazer o mesmo trabalho, via computador, a partir da Índia. In o que acontece com o trabalho?» Ladislau Dowbor dowbor.org/
No dia seguinte saiu um
despacho que teorizava:
DESPACHADOS
Considerando que
a pretensão do Comité Miss Zungueira Universal
é ilegal, indigno e antipopular, senão vejamos:
1- Ilegal porque não
preencheram os requerimentos que a Lei manda. Um
deles, fundamental, exige muita coragem para o obter. São necessários
pelo menos
doze meses de espera. Só
isso desmotiva o mais
corajoso.
2 - Indigno porque não
aceitamos analfabetas, porcas e pobres esfomeadas a viverem em
casebres com
a pretensão de representarem o Reino.
Que pensará de nós
a comunidade internacional?
Vão fazer-nos mais
chacota. Só
sabem é despirem-se, vestirem-se… não
sabem.
A vingança do Frequentador não se fez esperar. Reuniu com as zungueiras e deu-lhes a conhecer:
- Já sabem não é?! Fomos ilegalizados!!!
- Sim… sabemos.
- Vamos criar um novo concurso... a Miss
Zungueira Alcoólica.
Como os prémios eram tentadores
as bonitas jovens passaram a beber. O prémio principal era vinte caixas
de cerveja. Eis aqui a origem do
alcoolismo nas jovens Jingola. O Santo
Ofício confiscou o Frequentador e deportou-o para o
vice-reino do Namibe. A acusação era
simples: apelo à violência, ideias republicanas e ofensas à dignidade da mulher abandonada.
- Está bem mas nada de exageros. Por este andar quando quiserem fazer amor com os maridos vêm aqui
solicitar autorização.
- Isso é que é um puro exagero!
- Cara marquesa, recomendo que consulte o Comité da Misse
Politburo.
- Concordo, é de facto o órgão
propositado.
Capítulo
XVIII
A luta
contra a corrupção
Epok, para agradar
à comunidade internacional
ordena a grande ofensiva
contra a corrupção.
Discute os pormenores com o Santo
Oficio.
- Temos que avançar, fazer qualquer coisa!
- Cinco mil homens
chegam?!
- Cinco ou dez mil, tanto faz.
Estão desbloqueados cinco milhões de dolo para já.
- Dólares.
- Isso mesmo.
- Chefe Epok, vou começar já o
recrutamento. Um mês
de treino é suficiente.
- Com treino ou sem ele… é ir em frente.
- Começamos a caça
por cima?!
- Qual caça (!)
- A dos corruptos.
- Ah! Sim! Por
cima!? Quando se começa
é sempre por
baixo. Os degraus
sobem-se um a um.
Quando se começa
por cima,
já sabe como
é. Os corruptos estão em baixo, nas
ruas, nos casebres. Limpe-os e verá que
a corrupção acaba. Acho que
não tem noção
do que é corrupção.
Nunca frequentou um
seminário?
- Já chefe…
milhares deles, é por isso que fiquei
baralhado.
- Então em frente! Marx!
Tem seis meses para
acabar com a corrupção.
- O navio está pronto.
- Isto nada tem a ver com a marinha!
A notícia de que o reino ia fazer um recrutamento
massivo para criar um exército para lutar contra
a corrupção atraiu gente
de todo o lado.
Os portos, aeroportos
e estradas ficaram congestionados. (Esta
é a origem dos engarrafamentos constantes do trânsito). Todo
o Golfo da Guiné em
peso rumou para
Jingola. Os que tratavam das inscrições intrigaram-se
quando chineses apareceram com o bilhete
de identidade Jingola. Milhares de estrangeiros
estavam na mesma situação.
Ninguém sabia explicar
como conseguiram o BI. (Bilhete
instantâneo).
As várias comissões
de trabalho deram por
encerradas as suas tarefas.
Gastaram apenas um
milhão de dólares. Têm dois
anos de prazo
para apresentarem o relatório
das contas. O nome
da nova polícia: Exército Real Anti-corrupção.
Os efectivos tinham direito
a alimentação e ao vencimento
mensal de quinhentos dólares. Nos primeiros dias ainda
comeram. Depois os pratos
ficaram vazios. Não
havia nada para
lá colocar. Nem um pão. Dois meses depois sem
receberem um tostão,
chega a refrega
habitual. Os automobilistas
são abordados.
- Você é corrupto?
- Não.
- Então deixa aqui qualquer coisa.
- Mas vocês não são do Exército
Real Anti-corrupção?
- Somos, vá, dá alguma coisa!
Estavam em
todas as esquinas. Demoraram pouco tempo a
limparem quem trocava dólares. As
kinguilas, mesmo com
os seus maridos
na polícia não
escapavam. As esfomeadas zungueiras com
os filhos às costas
eram um alvo
fácil. As pobres
ficavam confusas, se deviam salvar os filhos ou os alguidares.
Os Anti-corruptos aproveitavam e carregavam tudo.
Elas preferiam salvar
os filhos. Um
filho mais
crescido pergunta:
- Mamã, são os da UNITA? Eles
não pararam com
a guerra?
- Não, são mercenários
que o reino
contratou.
- Estrangeiros?
- Sim meu filho.
As jovens não escapam. As preferidas são
as que usam saias
muito curtas, ou
vestidos transparentes.
- Estás presa!
- Porquê!?
- Estás a corromper os nossos olhos.
Um polícia já tinha galado
uma jovem. Esta resistia-lhe dizendo que não queria namorar com ele. Preferiu ser presa por outro polícia.
O galã diz para
o colega.
- Essa é minha, há muito
que ando com
o olho nela.
Os lavadores de carros
passam mal.
- Estás preso porque estás a corromper o asfalto.
Os jovens vendedores de bugigangas
sofrem uma limpeza sem
limites.
- Tens factura da compra?
- Não.
- Estás preso por corromperes
os comerciantes.
Ameaçam os moradores dos prédios e em especial os dos
casebres que serão
demolidos por uso
corrupto. Alguns
chefes escolhem as melhores
habitações para albergarem as suas
mulheres e a conta infindável
de filhos. Conta-se a proeza de um que tinha mais de vinte mulheres.
A família reunida nem
em dois grandes hotéis caberia. Que
super macho. – Diziam.
Ressuscita-se a Lei
dos quarenta e cinco dias por abandono do reino.
Uma moradora atónita fala com a vizinha.
- Vão demolir os prédios e os casebres?!
- Vão-nos pôr aonde?!
- No Nova Vida.
- Aiué! Vamos fugir para o Zimbabué.
- Lá fazem a mesma coisa.
Começa o interrogatório aos moradores.
- Prova que não saístes
do reino há mais
de quarenta e cinco dias.
- Sempre vivi aqui.
- Chegaste agora?
- Não, nunca saí daqui. Querem roubar
as casas não
é!!!
- Estás a criticar o Governo Real?
- Quem não critica o Governo é porque
dele recebe alvíssaras.
- Outro valor mais alto se levanta, é o dinheiro.
As atenções
viram-se para os bancos. Entram e deixam
os cofres vazios.
A acusação é:
- Confisco por corrupção dos bens da população.
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