Ainda existem reinos que por vontade própria
regressam, vivem, revivem, convivem na Idade Média. Este é um desses reinos.
Capítulo XI
A Reunião dos R-7
«A
armadilha que prende os pobres é impressionante. Os pobres são muitos, e votam.
E como são muitos, o que se fizer pelos pobres rende votos. Logo, qualquer
medida que favoreça os pobres constitui demagogia, autêntica compra de votos.
Ah, se os pobres não pudessem votar, seria ideal, pois poderíamos fazer
políticas para os pobres sem que isso deformasse a vontade popular e pesasse
nas eleições. Mas votam, e como há eleições a cada dois anos, pode-se fazer
política para os pobres uma vez a cada dois anos. Considerando que a desigualdade
é de longe o principal problema do país, tentar travar políticas que a reduzam
não é oposição, é sabotagem.»
A atenção de
Epok desviou-se pelo som
de dois Bips
provenientes do ER. E-mail Real. Olhou para o monitor e tentou lembrar-se das teclas
de acesso. Esses das escolas
ensinam mal, mas
com um
pouco de esforço
conseguirei. Tecla para
ali, tecla
para aqui e já está. O primeiro e-mail vinha da
Rádio Real.
Falava de um pai
que num mercado
ali para os lados do condado de Viana, perguntou ao filho de sete
meses porque é que
ainda não
andava. Muito chateado deu-lhe pontapés. Elevou-o e esmagou-o de encontro
à parede. Justificou-se nas calmas. «O filho é meu, faço-lhe o que
quero.»
E continuou calmamente a passear
pelo mercado.
O outro e-mail dizia que
o rei estava no reino
Burundi. No Burundi?!! Ah!.. Não está de férias
no Brasil?!! Esta é boa! Foi lá passar férias?!! Não
entendo…
O texto completo dizia:
Do templo
perdido na selva do reino
dos Genocídios aconteceu a reunião dos R-7, os sete reinos
mais teimosos
do mundo. Jingola, Zimbabué, Níger,
Burundi, Sudão, Somália, e Reino do
Ruanda. Permitiram ao rei Jingola fazer
o discurso de abertura.
Isso seria apenas
o único trabalho
da reunião porque confessaram estarem – sempre – muito apressados.
Preocupados por se ausentarem dos seus reinos. O rei Jingola sofre um ataque de pânico:
- Temos que acabar com isto rápido… tenho muitos casebres para
partir.
- Não sei se
a rainha já
conseguiu arranjar alguma coisa
para o almoço, ninguém tem nada
para comer. – Lamentou o rei do Níger.
- Deixei um massacre a meio no
Darfur. – Garantiu o rei do Sudão.
- Estão à minha
espera para bombardear o aeroporto.
– Desabafou o bélico rei da Somália.
- O meu avião está quase
sem combustível.
Vou espoliar um bocado nos depósitos do avião do meu
colega Jingola. Combustível não lhe falta. Esmolou o rei do Zimbabué.
- Tenho que acompanhar a invasão
do Ruanda. – Disse em tom marcial o rei do
Burundi, preparando-se para se levantar.
- Vou dar-te um
monte de socos
na merda da tua cara infeliz rei do Burundi – Ameaçou o aguerrido rei do reino do Ruanda.
O rei
Jingola pediu-lhes calma. Levantou-se e devido às pressas
dos presentes improvisou um discurso:
- Camaradas
reis! Temos que acabar
com as nossas preocupações
pessoais. Temos que
escolher um desporto mais saudável. Deixarmos… acabemos com essa dos gladiadores no circo
africano. Acabar com
o desporto de nos
matarmos uns aos outros. Não conseguimos entender o porquê da fome que aumenta. As
nossas populações fogem dos campos. Ninguém
quer trabalhar.
Fogem para as capitais,
vendem qualquer coisa, sentem-se felizes. Será que
é assim tão
difícil acabar
com a fome?
Temos que efectuar mudanças urgentes…
O discurso é
interrompido pelo
rei do Ruanda.
- Peço desculpa… acabo de ser
informado que o Burundi está a invadir o meu reino.
Os reis
abandonam o local em correria, receosos
de ao chegarem aos seus reinos, estes já tenham os tronos
ocupados por
outros usurpadores.
Epok assusta-se com
o barulho na porta.
- Abre esta merda!
Reconheceu a voz.
Lembrou-se que a porta
estava fechada por dentro, abriu-a.
- Ó pinturas
horríveis e mal-educadas!
- Fechaste a merda da porta
porquê?!
- Para não te aturar…
diz-me como ficou o trabalho
nas cozinhas.
Como resposta ela
pegou numa lima e começou a limar as unhas.
Apontou com a cabeça
para o cozinheiro, este diz:
- Chefe, os géneros acabaram. Estava quase tudo
estragado. Vinte quilos de…
- Couve, tomate, etc… já sei. Só
sabem é roubar... aprenderam com quem?!
A Pinturas esteve lá
a fazer o quê?
- Ai é!? Não
sabes ler? Isso
não faz parte
do meu perfil
ocupacional.
- Pára de limar as
unhas! O rei saberá que
são muito
mal-educadas?
- Se não
gostas tens que te
habituar! Melhor que
nós não
há!
- Há sim! As
piranhas. Só
que com
as tuas pinturas vais poluir
a água e as piranhas
não sobreviverão. Entretanto
o teu belo
corpo de real
súbdita será um belo
petisco. Faremos boas latas
de conserva para
exportação. Negras com
piranhas enlatadas. Ah! Ah! Ah!
- Grande
sacana, desgraçado. Vou preparar
um relatório
para o rei.
Epok marimbou-se e encara o cozinheiro que treme de medo.
- A partir de agora quero ver os géneros
estragados!
Capítulo XII
La Padep e a
princesa
O cavaleiro La Padep, depois
das injustas marteladas que levou nos
ossos conseguiu solidificá-los. Foi a sua
amada princesa que
conseguiu surripiar dos seus pais o dinheiro necessário para pagar a um
físico amigo,
e a outro muito conhecido
pela fama dos
seus unguentos. Tinha-lhe recomendado para evitar a todo o custo as
pretensões de qualquer
feiticeiro, que
não curavam nada,
pelo contrário,
faziam imensos estragos.
Graças aos cuidados da sua querida, que não poupou
esforços, sentia-se como um peixe raro, desses dos aquários
reais que não
lhes falta nada.
Incluindo água e temperatura
sempre agradáveis,
livres de poluição.
Como os cães
reais, que
têm uma clínica privada
para o tratamento
de uma simples verruga,
ou da comida
excessiva. Enquanto os súbditos aguardam
com impaciência
fora dos portões
triplamente reforçados com os melhores
aços importados, os restos
das latas importadas.
La Padep, imprudente, assomou à janela.
Viu a imagem habitual
do reino. A negra,
para sempre a
negra, carrega para
sempre uma criança
às costas. Apanha
qualquer lixo do chão e dá na criança que come e ri. Quer
dizer, negros
e negras para sempre confundem-se com o lixo.
Fazem parte dele.
La Padep considerou: os juristas, economistas, advogados e empresários
nacionais, que
já não
existem, políticos que
se engasgam ao pronunciar uma palavra,
contratam empresários estrangeiros degredados. Bem
protegidos vendem-nos toda a merda. Com defeitos de
fabrico, estragados, os restos das fábricas alimentares,
de bebidas, tudo
o que é importado. Toda
a merda do seu lixo
industrial aqui
chega. Os lucros
abissais dos dólares do inferno são
carregados em malas
pretensamente diplomáticas. Parece que ninguém se
lembra que esta lavagem
de dinheiro alimenta
directa ou indirectamente os circuitos
do terrorismo internacional.
Impunemente já
não pagam salários.
Ninguém tem direito
a receber pelo trabalho digno. Só os que
roubam têm direito a salários pagos
no estrangeiro. Se alguém
reclama, não faz sentido, porque os canos das pistolas
aparecem em qualquer
momento encostados nas cabeças. Manifestações
são proibidas. Ainda
bem! Porque
fazem aumentar a raiva,
o ódio do juízo
final, à espera
da guilhotina no final
da Monarquia Francesa, tal e qual igual como aqui.
São bobos da
corte, bobos do rei. Que faremos de alguém
que nunca
leu um livro?
Toda a família tem uma ovelha ranhosa. Sempre
foi assim, certo?
Não! São duas. Um
homem ou uma mulher que
arruínam a nossa vida.
Depois aparece outra
para saborear o que resta das ruínas. Sempre assim. Depois mais outra, até que ousamos
dizer, se o conseguirmos, basta!
Os fundamentos
da vida estão em
procurar. Saber
procurar e aprender.
Essa é a verdadeira essência. Depois de cansados, pontapeados, desprezados,
encontramos finalmente o derradeiro Caminho.
Essa verdade última,
que poucos
conseguem descortinar. Finalmente
viver em paz com Deus,
com o Universo. Mas
isso ainda
é um pouco
da suprema Verdade.
Quando estamos prestes
dela, o Criador ordena que seja para sempre parado o motor da
vida, que é o nosso coração
cansado das nossas angústias devido aos pecados
cometidos. Porque na nossa vil e vã existência fomos ensinados a odiar.
Subverter a opressão de meia dúzia ao serviço de interesses
estrangeiros que
nos escravizam, é fazer
a revolução. A população
aguarda ansiosa.
La Padep desfez o embrulho que a princesa lhe
enviara. Era a indumentária
vermelha e negra
dos mosqueteiros do secreto Santo Oficio. A temida polícia secreta
do rei. Vestiu-se e lembrou-se que faltava a espada
especial dos paladinos
do rei. Isso
não seria difícil porque
no mercado primevo Roque Santeiro existe
tudo. É apenas
uma questão de dinheiro.
Pediu a uma jovem, das muitas que esperançavam serem suas
namoradas. Tantas pretendentes que se lhes perde a conta. Ela aconselhou:
- Olha, vê só La Padep, este
dinheiro não
vai chegar!
- Fofinha, faz só confusão com
o vendedor, quem
sabe…
- Não sou
dessas. Se faltar algum
dinheiro vai exigir que namore com ele, sabes como são esses gajos, não é?!
- Deixa-te disso. Pronto, compra
uma espada usada, sei lá.
- Estou no negócio
de espadas há muito
tempo. Olha,
vou comprar uma dessas feitas
na Nigéria. Se tiveres o azar de a usar, desfaz-se.
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