quinta-feira, 17 de março de 2016

O Canto e as armas. Manuel Alegre



E contudo perdendo-te encontraste.
E nem deuses nem monstros nem tiranos
te puderam deter. A mim os oceanos.
E foste. E aproximaste.

Antes de ti o mar era mistério.
Tu mostraste que o mar era só mar.
Maior do que qualquer império
foi a aventura de partir e de chegar.

Mas já no mar quem fomos é estrangeiro
e já em Angola estrangeiros somos.
Se em cada um de nós há ainda um marinheiro
vamos achar em Angola quem nunca fomos.

De Calicute até Luanda sobre o sal
e o Tempo. Porque é tempo de voltar
e de voltando achar em Angola
esse país que se perdeu de mar em mar.


Gil Gonçalves

E a fome que veio para nos matar
Que não, que comida não nos falta
Que mais há para nos eliminar
Neste carnaval teatral da sua ribalta

Angola das chacinas indiscriminadas
Das populações do petróleo não sorteadas
Chineses, portugueses, vidas beneficiadas
Angolanos e angolanas vidas espezinhadas

Se nem uma cerveja se pode beber
O que é um gajo está aqui a fazer
Os presos políticos se finge que vão julgando
Mais uma epidemia a fome nos vai matando

E nesta prisão angolana
Onde reina a mente insana
E como ninguém sabe trabalhar
Estrangeiros e príncipes sabem saquear

Nada mais há a esperar
Para quê continuar
Se a fome se está a decretar
Os presos políticos não vão soltar

A África está perdida
Não escapa da exterminação
Pelos seus líderes está vendida
No continente da subjugação









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