03 de Julho
Bom-dia apátridas de Kabinda ao Kunene.
Eu sou angolano, nasci em Angola e aos cinco anos de idade vim para
Portugal, ou: os meus avós nasceram em Angola, etc., nunca mais ouvi falar de
Angola, mas considero-me genuinamente angolano, espero muito em breve ir para
lá trabalhar, qualquer emprego me serve. Evidentemente que esta – estas - alma
há muito tempo que é português, não entende nada do povo angolano, mas como a
miséria lhe obriga a reivindicar o estatuto de “refugiado” angolano, então
surge como o máximo expoente da angolanidade, um angolano genuíno, salvador da
Pátria. Há poucos anos isto era impensável mas como a miséria obriga.
Considero que a coisa mais horrível que nos pode acontecer é ver um bebé
chorar intensamente com fome, e não ter nada para lhe dar. E presentemente
vivemos muito disso, como a coisa mais natural deste mudo, porque se perdeu a
noção do que é um ser humano. Estamos muito bem civilizados porque matar é
civilizar.
A política salarial vigente também é uma poderosa ferramenta de
enfrentamentos sociais. Então, para o mwangolé, salário de miséria. Para
qualquer estrangeiro, salário de riqueza. E porque não o contrário? Isto não é
discriminação social? Racial?
Para quem não sabe as coisas acontecem assim: uma manifestação ali, uma
manifestação aqui, outra acolá, outra mais lá, outra lá mais longe, outra
acoli, outra acolém, outra para além, outra mais para além, e de repente a
manifestação generaliza-se por toda a Angola, com o povo nas ruas. Só que por
estas bandas será, será, será… nacional, é boa, eu gosto. Então, se a
governação teima no mesmo crasso erro, o que se espera?
E continuam com a mesma parvoíce de sempre: já te ligo, depois ligo-te,
depois falo contigo, depois passo aí, está descansado que já resolvo isso, não
estou em Luanda, estou na Namíbia. Não passam de pobres diabos!
Bom-dia desempregados e desabrigados de Kabinda ao Kunene!
De um mais velho: Savimbi está invisível no meio de nós.
Mas é assim tão difícil fazer um estudo que prove que de tempos a tempos
nasce uma geração de acéfalos que onde se instalam arrasam tudo e só deixam
famintos?
Será que Passos Coelho e Paulo Portas depois dos seus mandatos – pelos
vistos terão que sair à força? – serão exemplarmente julgados, condenados e
entregues a carcereiros?
Hoje à tarde fui convidado por dois amigos para irmos até uma esplanada
próxima. Depois de cerca de uma hora e meia já nos preparávamos para sair
quando um português grita, como se o fizesse para um cão, que quer pagar a sua
conta. Revelando má-educação repete o mesmo desprezo. O empregado chega e o
português para pagar a conta de mil kwanzas, retira do bolso um enorme monte de
notas e grita não se sabe bem para quem: «Queres beber mais uma cerveja?» Ao
mover-se choca com um militar das FAA, no lugar de pedir desculpa, ainda lhe
faz frente vangloriando-se: «É pá, eu não tenho medo de vocês, eu fui
pára-quedista.» A sorte dele foi que o militar não lhe retribui a má-educação,
revelando alto sentido de responsabilidade e preferindo-lhe o desprezo.
Imaginem o espanto dos presentes, não é?! Bom, o português lá se foi a
cambalear… estava bêbado. Agora não sei se alguém lhe montou alguma emboscada
ou não.
Ainda há por aí alguém que acha que o povo angolano não se manifesta? Sabem
como é que os mwangolés se vingam dos desaforos que quotidianamente lhes caiem
em cima? Combinaram-se e estão todos a roubar. Sim, está tudo no roubo, no
saque. É demais! Agora digam que os mwangolés são burros. Não conhecem o povo
angolano.
Empregados e empregadores em Angola: sempre na expectativa que pingue, se
ilumine qualquer coisa, que caia o dinheiro do salário, como a água e a luz,
nem todos claro, mas são a maioria. E não dão qualquer satisfação, porque o
tempo é de renovada escravidão.
Quando estrangeiros invadem um país que colonizaram, impondo outra vez as
regras escravocratas do colonizador, esses estrangeiros chamam-se tragédia,
loucura, porque não existe nenhum povo que aceite tal imposição. E isto é
incitação à violência.
04 de Julho
A actual situação da anarquia da invasão portuguesa em Angola ultrapassa de
longe o período colonial? É que estas coisas feitas sem regras, como tudo que
funciona sem elas, tende a evoluir para uma catástrofe talvez sem precedentes, porque
antes a colonização imperava, e agora na Angola independente os mwangolés
continuam a sofrer os vexames da invasão neocolonialista portuguesa. Um povo
independente tem o direito de se libertar da imposição da dominação
estrangeira, ou não é assim?
05 de Julho
E depois de consumada a grande invasão portuguesa, naturalmente que os
portugueses proclamarão unilateralmente a independência de Angola? República
Portuguesa de Angola?
06 de Julho
Bom-dia mwangolés sem salários de Kabinda ao Kunene.
07 de Julho
Temos que fazer alguns cortes de energia eléctrica de vez em quando, senão
não se vendem geradores, e neste mundo global a facturação também é global.
Assim, lá tivemos que fazer um corte para que os vendedores de geradores se
preparem, porque alguns clientes em pânico lá aparecerão. E então hoje apagámos
das 10.12 até às 11.17 horas, é essa a nossa missão. Mas o que é que
vocês querem?!
08 de Julho
Bom-dia vítimas dos constantes assaltos de Kabinda ao Kunene. É nacional, é
bom, eu gosto.
Nova Vida (a chamada urbanização nova vida) torna-se a cada dia que passa
um dos bairros mais inseguros de Luanda. Roubos e tentativas de roubo à mão
armada a residências e viaturas são cada vez mais comuns, esta manhã assaltaram
o meu Hyundai, roubaram-me os faróis e os stops, agora eh k tô lixada, os
gatunos estão localizados só a Polícia eh k não faz nada: são os que se fazem
de lavadores de carros, a maioria deles vive nas favelas que circundam o nova
vida mas outros vêm do golf, etc. Ir dar queixa na Polícia é só se estressar,
fica só assim... vamos fazer justiça pelas próprias mãos... In Olinda Cô Viê. Facebook
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