Não
estava disposto a participar
no enlace que
me estava a ser
preparado. Olhei para
o relógio e fingi:
-
Tenho um compromisso
que não
posso adiar.
Ela
insinua:
-
Vais adiar o leite
dos meus cocos?
- Infelizmente sim.
Leite com
cerveja é muito
indigesto.
- Não me
consideras bonita?
-
Pareces uma pintura de Renoir.
- Renovar? Não achas que estou
bem assim?
Tive
que sair quase a fugir. Na saída ela
diz-me:
- Depois vou-te ligar.
-
Está bem.
Como
previ, ela tornou-se incómoda porque me
ligava a qualquer hora.
A desculpa que
lhe dava era
sempre a mesma:
- Quando conseguir ficar disponível,
vou-te dedicar algum
tempo.
Numa
tarde parado no trânsito
automóvel, noto
sinais de luz
vindos de trás. Olho
para o espelho
e vejo que é ela.
Parece que faz sinal
para depois parar onde houver lugar. Põe a cabeça
de fora, faço o mesmo,
ela grita:
-
Paramos em frente
à minha casa!!!
Assim que chegámos ela mostra-se aborrecida.
Repete o que antes
me dizia:
-
George, porque não
atendes os meus pedidos?
- Já te
expliquei.
-
Evitas-me?
- Não.
Repeti-lhe
que estava muito
atarefado, e quando surgisse uma oportunidade ser-lhe-ia prestável. Estava quase no fim da
rua quando
surge uma jovem que
me obriga a parar.
Pensei que fosse alguma prostituta, ou
uma tentativa de assalto.
Olhei para os lados
e não vi ninguém.
Ela aproxima-se e pelo
vidro entreaberto
diz-me:
- Senhor deixa-me entrar.
Fiquei
indeciso. Olhei-a bem
e não vi nenhum
objecto estranho. Ela
diz-me de modo convincente:
-
Abra a porta, a sua
vida corre perigo.
Arrisquei,
desconfiado abri a porta,
entrou e sentou-se. Tinha entre vinte a vinte e cinco
anos. Tranquilizou-me:
- Não sou mulher
da vida. Como
lhe disse o senhor
está em perigo.
Siga e pare mais à frente.
Consegui
estacionar num local
discreto. Fiz-lhe uma proposta:
-
Acho que estaremos mais
à vontade numa esplanada.
- Não, aqui
ficamos bem, ninguém
nos vê.
Ela
viu que estava muito
preocupado. Começou por dizer:
- Não me posso demorar muito. Quero
alertá-lo que essa senhora
é muito perigosa. Ela
e a irmã formaram uma quadrilha, andam à
caça de estrangeiros.
Fiquei
alarmado. Exclamei:
- Não me diga!
-
O estratagema que
utilizam para os abordar
é o chocar com
o carro. A partir
daí criam intimidade até conseguirem o que
pretendem.
Ela
adivinhou o que ia perguntar-lhe,
respondeu:
-
Chamo-me Sunny.
-
George.
- Quando um estrangeiro lhes
interessa, vigiam-no discretamente e
depois com o carro,
zás! Roubam-lhes tudo
o que podem, de preferência
os carros. Se a casa
é deles, obrigam-nos com ameaças de morte a porem a casa no nome
delas.
Disse-lhe
com uma certa
ternura:
-
Sunny, você caiu do céu.
- Não, simplesmente
acho a conduta delas horrível. Sou bastante
religiosa e não
posso aceitar uma coisa
dessas. É a moda que
elas agora
criaram para enriquecer.
- Muito reprovável.
-
Sabe George, são tão
ardilosas que até
lhes surripiam o dinheiro
das contas bancárias.
-
E a polícia?
- Muito difícil.
A rede está bem
montada. O importante é que evitem as suas
malhas.
-
Sunny, o interessante é que a Ninféia não aparenta nada
disso.
- Qualquer pessoa desconfia quando entra na casa
dela. As paredes estão cobertas com espelhos, para vigiar as vítimas.
Está sempre a mudar
de carro para
passar despercebida.
A média é um homem… uma vítima,
por mês.
Estão muito ricas, costumam passear muito na
África do Sul, também
em Portugal, onde
tem casas, de vez
em quando
na Inglaterra e Estados Unidos.
Sunny
despediu-se. Disse-lhe que estaria sempre ao seu dispor. Pedi-lhe a sua
morada e o número de telefone.
Ela não
aceitou, abriu a porta do carro e pôs-se a andar.
Perguntei
a George:
- Não te
preocupaste mais com
a Sunny?
-
Preocupei. Tentei fazer tudo
o que pude para
a encontrar, para falar com ela. Esforcei-me imenso,
e acabei por desistir.
Convenci-me que era
uma alma do outro
mundo.
CAPÍTULO VI
JANDIRA
Já
há muitos anos
que a conhecia. Nasceu no Lubango. O seu pai
abandonou-a imediatamente. Até hoje não sabe quem é
aquele que
lhe deu origem.
A sua mãe
não tem meios
para a sustentar. Envia-a
para Luanda onde
fica entregue aos cuidados
do seu avô.
O ambiente em
casa não
é dos melhores, pois
que se juntam vários
filhos, de várias mulheres,
como manda
a tradição africana.
Sai um filho,
uma filha e surgem mais outros de outras mulheres.
Cedo é violentada por
um dos seus
tios. Ameaçada por
este, que
se falasse, levaria uma grande pancadaria. Ela
com medo,
fica muda, e continua a ser
violentada no silêncio de quatro paredes.
Mais tarde
mantém relações sexuais
com outro
tio. O seu
avô vem a saber
disso, e expulsa-o para a Europa. A sua ocupação principal em casa, é carregar água do rés-do-chão para o terceiro andar. Deixa de estudar porque não lhe dão dinheiro. Diziam, que se nós não estudamos, tu
também não
estudas.
Jandira
tem vinte e três anos.
É muito baixa
e muito magra.
Anda quase
sempre a rir.
É a minha vizinha
da porta em
frente. Costuma ficar
com a chave
da minha casa.
Diverte-se a ver filmes.
É honesta. Digna
de confiança. Ofereceu-se para
fazer alguns pequenos serviços
domésticos. Gosta
muito de estar
na minha presença.
Costumava dizer-me:
- Aqui estou bem, longe da confusão da minha casa. Mas não me deixam ficar muito tempo.
Estão sempre a chamar-me. Jandira para aqui, Jandira para ali. Se não fosse a comida
que aqui
como já teria morrido à fome. Quase nunca me dão comida. És um verdadeiro pai
para mim:
-
George compra outra
água mineral,
não gosto
desta.
A nossa amizade
prosseguia. Tratava-a como uma filha. Jandira passava a maior
parte do tempo
agarrada ao telefone.
A conta das chamadas
subia imenso. As suas
amigas telefonavam constantemente a dizer que queriam falar com ela. Eu passava
o tempo a chamá-la para
atender o telefone. Era muito engraçada. Pesava pouco,
facilmente podia-lhe pegar e colocar no meu
colo.
Abriu
a porta, entrou. Sentou-se e pegou numa revista. Pouco tempo depois
ouve-se a voz da sua
tia:
-
Jandira! Jandira!
- Poças! Não me deixam sossegada. Parece que
não há mais
ninguém em
casa. George arranja
filmes, estes
já os vi todos.
Vou levar duas maçãs
e uma gasosa.
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