No dizer de Aquilino Ribeiro: «Homens
inteligentes, com boa cultura política e jurídica, não passam disso».
Impostores que lêem Shakespeare… são assim os grandes actores»
Falamos, criticamos… e nunca nos cansamos?! Os
românticos abolicionistas lutavam contra a desigualdade. Lutar para abolir a
escravidão é uma coisa, a sua formação é outra. Libertarem-me e continuar
escrava é puro romantismo. Liberta no cativeiro, cativa da liberdade da chama
trémula da vela. Os campos de concentração angolanos são um imenso oceano, onde
só navios da fome navegam.
As roupas muito justas no meu corpo sensual despertam
a sensualidade no olhar dos homens. E esquecem as formigas transportando comida
na vertical parede. As plantas mostrando a sua beleza ao seu namorado Sol.
Perto, restos de uma cadeira comentando a vida passada de opositores políticos.
Crianças saem da escola fugindo da morte dos velozes automóveis enlatados nas
estradas sem escoamento. A morgue vigia-as. Chegam a casa famintas… espera-as a
insaciável fome.
O sinal vermelho paralisa os mastodontes metálicos. O
verde surge, lançam-se numa louca corrida pelo capim da selva asfaltada. A
História da Humanidade é a história das guerras para o controlo das
matérias-primas. As civilizações desapareceram devido ao desenvolvimento de
armas sempre mais poderosas, até à descoberta do nuclear. Sempre em conflito
com a Natureza, os idiotas não sabem que ela tem consciência. A revolta final é
a revolução da Natureza. Como uma gigantesca empresa de limpeza e saneamento a
terra é varrida, limpa da erva daninha humana. A civilização humana termina,
outra surge. O ciclo é repetitivo. A Natureza sente-se só, cria humanos para se
divertir. Quando cansada dá-lhes com a raquete, como se fossem uma bola de
ténis.
Sem leitura não há desenvolvimento intelectual, é por
isso que o meu cérebro não funciona. Os outros povos avançam e nós recuamos,
contentamo-nos em apanhar migalhas que eles vão deixando. De qualquer modo esta
é a mais atroz escravidão que ainda não foi devidamente contada. O mais ignóbil
acto criminoso de todos os tempos. Exterminar povos! Sob a voz de comando:
COMAM A FOME!!!
A hipocrisia Ocidental espalha-se por Angola ao ritmo
do bigue-bangue. Está muito desenvolvida, até já tem disciplina universitária
garantida. Está como os cães que também já não acreditam nos seus donos. Crise
de hipocrisia canina. Ladram hipocritamente para os gatunos. Tão cínicos estão
que fingem que gostam da comida que o dono lhes dá. E ladram no melhor sono da
noite. Prazerosos em acordarem os donos, ladram-lhes óperas. Eles levantam-se
agitados, dirigem-se para os amigos infiéis. As caudas peludas agitam-se.
Justificam o ladrar tentando morder o ensonado dono, fingindo que é um gatuno.
Muitos proprietários aperceberam-se do logro e já não lhes falam, ladram-lhes.
A curto prazo uma serenata canídea será uivada.
Como querem que acredite em Deus?!
Creio no Grande Deus da Fome. Quando morrer tenho o
seu paraíso garantido. Antes de lá chegar aguardo por uma comissão da ONU para
me governar.
Kilimanjaro, a lenda do enterro do Rei
Salomão. Tanta sabedoria deixada, talvez nunca igualada. Tenho que penetrar no
fundo do tempo e trazê-lo à superfície.
É uma instituição bajuladora que serve apenas para
amigos. Chama-se propagação nacional de malfeitores.
As igrejas ajudam-me na miséria. Aviltam-me com o que não tenho, dinheiro.
Mesmo assim insistem porque senão!.. Deus que tudo vê vai ficar muito zangado e
não me agraciará. Meto-me no dinheiro emprestado para pagar o que não devo,
assim mo exigem os abençoados pastores. Depois fome, a interminável cura do
remediar dos meus males. Jovem precocemente velha, angolana a morrer de fome e
de doenças. Penetro o olhar no fundo da minha alma e vejo: Chegamos a velhos e antes do derradeiro ai, descobrimos que
andámos a vida inteira desgovernados.
Não sei porque é impossível encontrar um
governo de sábios. Os governos são como as lotarias, como os casinos.
Apostamos, não acertamos, perdemos. Paradoxo: populações morrem à fome e aos
governantes nunca lhes falta comida. Outro paradoxo: onde não há comida, os
ratos humanos multiplicam-se. Mais outro paradoxo: onde o ser humano se atrela,
doenças e epidemias não faltam. Não consigo entender o porquê do angolano
construir e depois destruir. Passa o tempo a edificar e a derrubar, é isso! Não
consumimos bebida, ela consome-nos. E as farras, as festas perseguem-nos. As
ruas entrevadas por onde passo parecem inundadas por rios de álcool. Parecem
peixes, confundem-se com garrafas alcoólicas a boiarem na corrente sem destino.
A nossa existência depende dos vapores, dos volumes alcoólicos do rodopio no
éter. Quando sentenciamos a um possesso emborrachado: «Não estás em condições
de sair, podes ser assaltado... não conduzas o teu carro, a polícia vai-te
prender» «Oh! Quero lá saber! A mim ninguém me maltrata, me prende» E elas
acontecem. Depois dos vapores vagamente extintos, os pobres ébrios arrependidos
juram nunca mais beberem. Voltam à anormalidade: «Vou beber só um copito»
Desajeitados como plantas sem água, como antenas parabólicas desdentadas.
Neste beber, vejo crianças nascer, brincar, crescer…
sofrer.
Aderi, sou fã do movimento espontâneo, Vamos Destruir
Luanda. Existem campeonatos do mundo para tudo, mas
não existe nenhum para a fome. Falta o campeonato do mundo para premiar a
melhor ditadura. E torneio para o melhor governo destruidor de casebres.
Libertem-me da fome e dominarei o mundo.
Estou cansada de chorar, os novos senhores
dos escravos esgotaram-me as lágrimas. Até isso me espoliam. Espero a ordem
desnorteada usada para me matarem dos partidários sem trabalho, onde todos os
anos há tiranos. Não era necessário tal terror na luta armada de libertação:
Mahatma Gandhi e a inteligente não-violência que conduziu a independência.
Por isso aqui estou desfolhada,
desflorestada. Ainda me resta a ossada no campo de concentração Bantu,
concentrada. Fechem, eliminem os campos de concentração Bantus. A orquestra
sinfónica Bantu está desatinada. Bantu, não obrigue o seu irmão a morrer de
fome!
O dia despontou nas cercanias do Sol. Com tal
inspiração que lhe apetecia repintar o Universo. Como um pintor a iniciar a sua
tela. Próxima, a água ensaiava passos de dança com a areia marítima e a
minúscula vida agitava-se, corria. Procurando sobreviver como eu às
inconstâncias da luta ferida, das mordidelas petrolíferas do dia-a-dia. Como
folhas de plantas sempre amarelecidas tombadas, esquecidas na selva da
sobrevivência humana. O caótico humano despertou, civilizou a vida marítima que
mudou de rumo querendo confundir o Criador. Uma multidão de vozes abandonava-se
perseguida pelo cavaleiro apocalíptico da fome. Sempre a cavalgar onde não há
corrida e comida. O dia distanciava-se afoito do Sol. Terminou a sua tela da
desgraça para o dia seguinte.
Carros sem estradas servem os sistemas
alternativos circulatórios sanguíneos, bloqueios dos becos cardíacos sem saída.
Mas são salutares, os tanques de guerra errantes militares. Para me
amedrontarem com a dissonância dos evos. Ah! Adoro o tilintar das garrafas com o
líquido da nossa perdição. É o povo Bantu de garrafa na mão, das noites claras
e dos dias escuros. Evito o encontro com a tristeza mas ela persegue-me, sonda-me.
A minha cor é diferente, devo passar fome?! Descobri: a fome é negra! Tudo o
que é péssimo é Negro! Ó Deus dos Brancos! Pintai-me da vossa cor! Depois do
vosso colonialismo, eis a tirania Bantu.
Epidemia de amigdalite e poliomielite
silenciou e paralisou a nossa oposição política. E o governo que não sente, tem
olhos e não vê. Tanta cegueira nos palácios doutrinais, governamentais com
livros que nunca se abrem, na visível continuação da idade das trevas. A
Natureza evolui, os homens perdem-se na vegetação das aprazíveis florestas que
violentam. Viver no luxo e nos gastos supérfluos também é um crime contra a
humanidade. As armas são o símbolo do poder. As mentes desarmadas são valiosas
para a democracia. Para votar é necessário que hajam eleitores. Para haver
eleitores é necessário que hajam eleições. Para haver eleições é necessário que
haja democracia. Para haver democracia é lícito apear o poder ilícito,
abandonar futebóis e outros caracóis. Erigir escolas, universidades, com bons
professores para que a indigência acabe. Sem universidade não existe liberdade,
existe a incultura da fome.
O poder é como um navio, necessita de bons
marinheiros, bom imediato e competente comandante. A navegação é garantida na
atenção constante do leme e da proa. O rumo da navegação é garantido. Sempre em
frente! Comandante ordene! O navio da governação está pronto! Para navegar ao
ritmo da democracia consolidada à proa, à ré, a bombordo e a estibordo. Por
incúria o navio aderna perigosamente e fica à deriva. O comandante e o imediato
têm que ser substituídos. A incompetência cede lugar à competência de quem sabe
dirigir a embarcação e conduzir o povo, a tripulação, para porto novo. Não
deixemos esta democracia afundar. Não há submarinos para a salvar, há
mergulhadores para nos abismar. Vai, navio da democracia! Navega na calmaria
mental, evita os escolhos, vigia de noite e de dia! Democracia com
curto-circuitos é incendiária. A da negligência da vela acesa também o é,
quando a governação priva de energia eléctrica a população.
Entretanto, os esgotos no caudal da
liberdade passeavam, arrastavam, rumavam o esgotamento democrático. Há
democracias de cinco níveis: Um: a curto prazo: a democracia é subvertida por
um golpe de estado. Dois: a médio prazo: as instituições não se adaptam à nova
vida. Três: a longo prazo: quem desafiar o poder enfrentará carros de assalto,
helicópteros, aviões, e exposições armamentistas. Quatro: eterna: a democracia
é um reino infestado de corrupção, e de violação permanente da Constituição.
Como um navio bem pintado, aparelhado exteriormente. No interior a ferrugem, a
podridão. Os ratos corroem o que resta das estruturas. Ao afundar ninguém a
bordo se apercebe. Cinco: democracia nuclear: quem ameaçar, quem não
concordar, leva com o arsenal da explosão atómica e tudo vai voar, ficar sem ar.
Esta democracia violenta-nos os sentidos com os seus
sons do poder repetitivo, não alternativo, horrivelmente cansativo. Como se
estivéssemos a assistir sempre a um mesmo jogo de futebol. Como se nada mais
existisse.
Sem comentários:
Enviar um comentário