domingo, 27 de novembro de 2011

O cavaleiro Mwangolé e Lady Marli na demanda do Santo Graal (04)


Antes da pequena porta ultrapassada, destinada apenas a pessoas, um dos guardas, eram quatro, perguntou qual era o motivo da visita e o cavaleiro Mwangolé respondeu secamente: «Turismo!» E o guarda não fez objecções, foi uma entrada muito fácil, daquelas que dá para desconfiar. Na Rádio da Verdade Jingola o locutor entrevistava uma emboaba a propósito da chegada de um alto dignitário também emboaba para discutir os habituais contágios da amizade recíproca desinteressada e duradoura entre os dois povos, dois governos, dois partidos, e a não ingerência nos assuntos internos dos dois países, isto é, dos dois reinos, ufa! E ela, toda emplumada como uma ave-do-paraíso: «Bom, há quatro anos que estou no reino Jingola.» «E o que é que faz?» «Sou empresária na área do management, gestão, recursos humanos, etc. Bom… as coisas por aqui não são nada fáceis, percebe?!»

E quando alguém incomoda o rei, ou os seus lordes, a ordem de execução não demora. O pelotão da extinção está sempre em prontidão selectiva. E quem não aceita o dinheiro da corrupção, encaminha-se para o pelotão.
A morte é como aqueles governantes que transformam o poder em túmulos para neles enterrarem os cadáveres incómodos que em vida apenas disseram o que sentiam, a verdade. O ditador exerce pois com extraordinária eficiência a ditadura da morte.
Os nossos entes queridos continuamente vão de abalada, na balada do eterno destino. E nós por aí andamos, sempre na tentativa da fuga do inevitável encontro. E eles lá do outro lado sempre a acenarem-nos, a convidarem-nos para a grande festa da comemoração do imortal encontro. E nós recusamos, e verificamos o quão os anos são tão breves. E iniciamos a preparação da bagagem, e o comboio já se apronta. Chegou a nossa hora, e resignados partimos, e no outro lado as vozes ouvem-se mais fortes, mais próximas, e pai e mãe alegremente como numa bênção de agradecimento: «Demoraram muito, mas aqui somos muito pacientes, sabíamos que viriam, que não faltariam ao último encontro da vida. Bom, finalmente e desta vez para sempre a família está reunida. Na morte todos juntos permaneceremos. Bem-vindos ao paraíso eterno, onde quem nele entra, jamais dele sai.»

E assim vai, permanece a religião em Jingola, e quem quiser ficar em segurança, basta pedir protecção numa das famosas igrejas existentes. Recebe um pau benzido pelo Senhor, coloca-o escondido no local onde se encontra, e pronto, está devidamente sob a protecção divina. E nada lhe acontece, ninguém lhe assalta. Por exemplo, é óptimo para as kinguilas. Podem manusear com todo o à-vontade o seu dinheiro à vista de todos que nada lhes acontece.

Os corruptos assaltam o poder, e os especuladores imobiliários organizam faustas e lautas festas. Entretanto, nas florestas até os animais tremem porque serão desalojados. O horror selvagem é o homem que desaloja outros sem garantia de realojamento, para construir a sua especulação imobiliária com o apoio de governantes sem escrúpulos. Esse sim é o selvagem que defende a civilização.
Descartes disse: penso logo existo. Em Jingola é: não penso, logo destruo.

Deparámos com um grupo de arrojados manifestantes, que desobedecendo às ordens da realeza sobre a proibição das manifestações, em Jingola quem se atreve a tal é punido como grave crime de alta traição ao rei, e como tal sumariamente executado, um jovem lutador pela instauração da democracia e liberdade sobe numa estátua, há-as aos pontapés, do líder imortalizado e com um megafone inicia o discurso opositor ao regime ditatorial:
- Neste reino há muito petróleo, logo, muita corrupção. E neste poder corrupto há muitas mortes não reveladas, não denunciadas no silêncio cúmplice dos meios de informação, os servidores, seguidores, os executores da corrupção. No nosso povo Tchavola e nas centralidades dos Zangos está a continuação da nossa miséria. O povo Tchavola é a estátua da homenagem ao herói nacional.
Não conseguiu prosseguir, ou melhor prosseguiu a caminho de um carro-forte das forças de todos os ramos policiais devidamente representadas em número e aparato bélico. Os manifestantes detidos seriam entregues ao braço da ditadura milenar, e dos algozes do vício de aniquilar. Pode-se afirmar que quem nas prisões jingolas entrar, delas nunca sai. A vida humana não tem valor. Mas o jovem orador conseguiu ludibriar os guardas e ainda gritou:
- Eu só exijo os dividendos dos lucros do petróleo que me devem, que me pertencem. Dêem-me energia eléctrica e dominarei o mundo.
Coitado, metia dó, com tanta surra que lhe despejaram no corpo, desmaiou, não mais se levantou. Recarregaram-no como se fosse um saco de batata podre, dessa da produção nacional que intencionalmente a deixam apodrecer para importarem, porque isso do desenvolvimento da agricultura jingola é mais um pretexto para desvio de verbas para os ávidos lordes. Só se lá nos campos descobrirem petróleo, então dão-lhes a designação de, campos da agricultura-petrolíferos, isto é, polivalentes.

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