domingo, 12 de janeiro de 2014

Atalho para o banquete. Carmen Cardin




Quem sobreviveu
a um amor desfeito
Pode resistir
a um espelho quebrado
Consegue engolir
outra angústia qualquer...
Eu fiz do sonho
o meu vício perfeito
Diariamente
dele sorvo um bocado
E mastigo a vida:
sem antiácido sequer.

Quem quis colocar
suas mãos no fogo
Jamais se entregará
ao medo da nevasca
Jamais padecerá
no que chamam de deserto...
Provoquei a vida
e ela me fez seus toques
E toda solidão que engulo,
secamente, "on the rocks",
Não me imuniza
do errado ou certo.

Quem divisará
as fronteiras do seu eu?
Só consegui achar a sorte
quando ela se perdeu
No escuro desespero
de quem crê na esperança.
Andei por um atalho
procurando felicidade
Então escorreguei
no abismo da saudade
No profundo precipício
precipitado da lembrança.
E a audácia de querer
Rascunha-me um sorriso;
A teimosia de sentir
Penhora o meu descanso.
Vou descascando a tristeza
Cozinhando-a com o pranto...
A alquimia dos temperos
Antecipa-me o sabor
Saberei o ponto da calda
Provando, outra vez, do amor
Desse acre-doce tão exótico
A especiaria do encanto!


Carmen Cardin

Do livro: "Saciedade dos Poetas Vivos", vol. VII, Blocos, 1995, RJ

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