República das torturas, das milícias e das
demolições
Diário da cidade dos leilões de escravos
Finalmente, o abismo está concluído.
“A oposição cala-se. Não vai à rua. Não se
mobiliza. Não protesta. Esconde-se... Reclama e reivindica, em “soft”, regra
geral, no conforto das poltronas dos gabinetes com ares condicionados ou
refastelados nos Lexus. Por todo este descaso, mais uma vez, desconsigo
acreditar estar o país tão sem rumo, face aos bilionários e vergonhosos roubos
financeiros, que poderá avocar a tese tão cândida no socialismo, face às
dificuldades económicas e sociais, porque vive a maioria da população: “Estão
criadas as condições objectivas para a revolução”. (William Tonet in Folha 8,
edição 1324, 01/07/17)
Importante, fundamental, uma sociedade sem
regras não sobrevive, comete suicídio, e esta é a tragédia de Angola que dá por
concluído o seu abismo final. Pelo catastrófico avolumar para outra RDC vamos
navegar. E por isso mesmo o abismo, o fim está próximo., a chamar.
Para onde vai este comboio sem democracia? Para
a grande desgraça que se anuncia. Em Angola o comboio da democracia não para
porque não tem estações, e não se sabe quando as terá. Talvez que a inspiração
da RDC seja a solução, ou que o fim da democracia está próximo. E também se
esqueceram que o comboio da democracia para circular necessita de carris, até
disso se esqueceram porque as mentes estavam – estão – demasiado ocupadas no
saque. O comboio sem democracia só transporta lagosta, a mandioca atira-a para
os cães que a olham de lado rosnando de raiva, muito desconfiados pois até a
mandioca desapareceu, já não é dos pobres, é também dos lagostas, não é comida de
pobre, é comida de ricos.
Não havendo oposição há corrupção. Na verdade
tal oposição é o sustentáculo do comboio da corrupção.
Se um partido político resolve tudo pela
violência, não dá para ver como ou qual será o futuro de Angola. Quando o poder
é violento a violência o esmagará.
Aqui diz-se que se defende tudo, incluindo a
liberdade, só não se vê quem defende a liberdade dessa liberdade.
O RETRATO
DE LUANDA: E o muangolé continua notável na sua destruição. Por exemplo,
consegue alugar o seu apartamento, a beneficiária costuma ser uma amante – são
tantas – parte os mosaicos e os azulejos recentemente instalados pela anterior
amante, para tirar o feitiço da outra, só pode – numa altura destas como
conseguem tal fortuna para tão vultuosos gastos? – o apartamento do vizinho é
destruído, tudo bonito por dentro e por fora a desabar. Assim continuando –
claro que vão continuar pois se não sabem fazer mais nada – e devido à penúria
financeira vigente prevê-se que os muangolé viverão como ratos, desculpe amigo
leitor, as populações já não são pessoas, são ratos, piores que eles pois os
roedores têm regras que respeitam, enquanto os roedores humanos não respeitam
regras… nada nem ninguém. Por isso os ratos sobrevivem e os seres humanos não. No
apartamento das obras, está por baixo outro que, como foi dito aos jovens que
executam o trabalho de partir tudo e até erguer mais paredes, o que conforme
lhes foi explicado não dá para suportar mais peso. O prédio já ronda os
cinquenta anos, foi erguido até ao terceiro andar. Depois o proprietário
decidiu fazer aqui morada. Ergueu mais dois andares, o quarto andar destinado a
arrendamento e o quinto andar fez dele um escritório. Ambos têm como
característica o não serem construídos em betão armado o que leva a que a
qualquer momento desabem. A varanda das traseiras está com três fendas, uma
delas a mais saliente, vai até ao meio da casa de banho. Na cozinha tem uma
fenda de um metro de comprimento por cima da chaminé. Os tectos da cozinha e da
casa de banho estão a desabar, já se vê o tijolo. A varanda que dá para a rua
tem duas fendas, uma delas chega quase a meio da sala. Num dos extremos da
varanda a parede está-se a desfazer, e no outro extremo um pilar tem uma fenda
a toda a altura. Num quarto que dá para as traseiras tem uma fenda preocupante
que chega a meio do tecto. Por baixo da viga tem também uma fenda que a
acompanha a todo o comprimento, cerca de cinco metros. Mas os jovens não estão
interessados nisso, o que querem é facturar conforme um deles anuiu de cabeça
quando confrontado com a desgraça à espreita. Foi-lhes dito que mostrassem a
licença da obra, disseram que está com o encarregado. Então que digam ao
encarregado da obra que há que falar com ele para a responsabilização dos
prejuízos que aí vem. Passam os dias e nada de encarregado. Devido à
envergadura da obra facilmente se fica a saber que o apartamento foi vendido a
uma senhora que trabalha num banco, conforme dito por vizinhos. Também se pediu
a sua comparência mas não resultou. Há fuga intencional, só que a senhora e
quem possa estar por trás dela ainda não sabem que irão residir como se
estivessem num navio prestes a afundar-se. Ela quando disto tiver conhecimento
decerto desmaiará ou terá um ataque cardíaco. Claro que está a fazer um muito
mau negócio, a deitar dinheiro para o lixo. Contas feitas por alto a obra é
capaz de estar nos cinquenta mil dólares. E de novo vem o assombro: as empresas
estão com impressionante contenção nos gastos, e como este ano a coisa não
melhora, mais despedimentos serão feitos. A crise é de tal monta que faz com
que os investimentos fujam, e quando isto acontece há a inevitável fuga de
divisas que aqui fica muito fácil de fazer devido à república da corrupção
instalada. Claro que chovem perguntas: Como é possível tal esbanjamento? Tal
dinheiro foi ganho honestamente? Como foi conseguido? Como é possível num
ambiente de miséria e fome haver quem ostente riqueza tão agressivamente? Num
ambiente quase de pleno desemprego há para quem o dinheiro caia do céu.
Escravidão, desgraça, miséria e fome deveriam ser as palavras de ordem seguidas.
Neste teatro de plena injustiça milhões de almas clamam por justiça, e quanto
mais ela tardar mais os próximos dias serão de arrepiar. Como isto é incrível,
ao nível que esta gente chegou, sem cérebro, onde construir é destruir. Há dez
dias que não se consegue trabalhar porque a barulheira é por demais infernal. Isto
passa-se na rua Rei Katyavala, no prédio 109, no quinto andar direito.
No noticiário da rua, um cidadão mal ou bem
informado, disse que se a Unita ganhar as eleições, o Mpla vai retirar todo o
dinheiro dos bancos – pessoalmente não sei que dinheiro porque isso é coisa que
não há, como se diz na gíria, o dinheiro está muito difícil porque está a ser
desviado para a campanha do Mpla – para que a Unita no poder encontre os bancos
vazios.
Se os democratas de fingir continuarem na democracia
de fingir, decerto que na hora da prestação de contas vão fugir, sem saberem
onde cair não conseguirão se redimir.
Isso de falar e não fazer nada fica grotesco, é
palhaçada. E palhaços não nos faltam, tudo isto se encaixa perfeitamente na
tragédia final do palco infernal. Democracia sem democratas é isso o futuro que
nos querem presentear, ludibriar, na miséria e na fome continuar.
Pelos vistos os muangolé ainda não conseguem
conviver com o próximo, e se até hoje não o conseguem jamais o conseguirão.
Isto faz parte da grande tragédia de África que se desintegra a olhos vistos,
como se caminhasse para o fim da sua civilização.
X-FILES: “Noutros ordálios fica inocente quem
consegue extrair uma agulha
do fundo de uma panela
de água a ferver .
Outras vezes , submetem-se à «prova da agulha »: se não sai sangue depois de picar a língua , o lóbulo
da orelha ou
as pálpebras , fica provada a sua inocência . Também é inocente
quem consegue pisar
com lentidão, várias vezes , as brasas ,
sem queimar
os pés . Mais perigosa, aterrorizante e
frequente a prova do veneno ,
usada sobretudo para esclarecer a acusação
de feitiçaria . Em
muitas regiões de Angola
denominam-se «mbambu». Só o adivinho
conhece as propriedades altamente venenosas de certas
plantas .” (Cultura Tradicional Bantu.
Pe. Raul Ruiz de Asúa Altuna. Edições Paulinas)
Majores
pennas nido:
asas maiores que o ninho. Expressão de Horácio (Epístolas, I, 20-21), que se
aplica aos que, vivendo em condição medíocre, aspiram a altos destinos. Malesuada fames: a fome ruim conselheira.
Virgílio (Eneida, VI, 276), enumerando os monstros que guardam a entrada dos
Infernos, qualifica a fome de ruim conselheira, isto é, de inspiradora de
crimes e de más acções. (Dicionário Lello)
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