quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

12 A 19 de Fevereiro de 2013. DIÁRIO DA CIDADE DOS LEILÕES DE ESCRAVOS




12 de Fevereiro
A luz fugiu-nos às 09.12 horas e lembrou-se de aparecer às 13.25 horas.
E na Espanha a corrupção é impressionante. Dir-se-á que toda a classe política, incluindo a Casa Real, está envolvida em actos de corrupção despoletada pelo tesoureiro, Barcenas, do Partido PP. É que nem o primeiro-ministro Rajoy, escapa. Quer dizer: as quadrilhas de malfeitores democráticos conseguem tapar os olhos dos eleitores, arvorarem-se de super-democratas, tomam o poder, e chamam-lhe democracia. É como se de repente gigantescas comportas do mar se abrissem e engolissem as águas num colossal abismo. Assim está servida a Espanha. E mesmo ao lado, Portugal, as consequências já se advinham, sentem-se catastróficas.
Afinal a corrupção alastra-se como uma epidemia, já é pandemia. Se não se fizer já uma limpeza geral, coisa mais natural do mundo - os camiões do lixo já estão prontos?! – assistiremos a mais um filme de ficção científica, daqueles do célebre realizador americano, John Carpenter.
13 de Fevereiro
A recolonização portuguesa.
Vivemos ou não, a maior hipocrisia de todos os tempos?
Nenhum país se desenvolve dependendo de quadros estrangeiros.
E sempre a fumarem, além do futebol, é o único passatempo de que dispõem, um ecossistema. Português! Se deixares de fumar, a tua capacidade instalada funcionará em pleno.
Há um ano que o português se instalou em Luanda. Pobre na miséria e no espírito, conseguiu contrato por tempo indeterminado como gestor numa empresa de informática. Ninguém lá na empresa conseguiu descobrir o que é isso de gestor, sim, sim, gestor de quê? Oh! Mas isso resolve-se facilmente, de uma assentada, e assim foi, o português atribuiu-se várias categorias a saber: gestor de estoques, gestor de clientes, gestor do pessoal, gestor do parque auto, gestor de informática, até ver. Só mesmo um português ultrapassado no tempo e no espaço. Por aqui se pode ver porque é que Portugal está no limbo da Europa e do mundo. Mergulhado numa tumba cadavérica e dela não deseja sair. E ao destruir Portugal, é necessário exportar essa loucura a que chamam gestão, para outros países. O eleito? Angola, pois então. Aqui há também uma questão que interessa ressaltar: se as empresas são todas do Minoritário, ou a ele ligadas, como é possível falar de economia nacional? Não será preferível chamar-lhe, desastre económico empresarial?
E o português relembrando, saudando, forçando, subjugando ainda o tempo colonial vira-se para o mwangolé, outra vez seu escravo de trabalho e açoita-o: «Vocês não gostam de trabalhar, são muito preguiçosos… olha, vou mandar vir técnicos de Portugal para fazerem o vosso trabalho.» Mas, o mwangolé habituado, já calejado, de tão enraivecidos e degradantes répteis humanos, serenamente enfrenta o neocolonialista português e demonstra-lhe a verdade: «Há dois anos que aqui trabalho como estagiário, faço o vosso trabalho em todas as áreas de redes, coisa que vocês não conseguem, não sabem, e sempre com a mesma categoria, e até agora nunca fui aumentado no vencimento.» O português fica engasgado, envergonhado, não sabe o que há-de dizer, tocaram-lhe na ferida do falso profissionalismo, pois o Minoritário apoia qualquer ser abjecto que escravize os mwangolés, e desculpa-se como qualquer parvalhão usa fazer: «Desculpa, não me referia a ti, tu sabes trabalhar, referia-me aos outros angolanos que são muito preguiçosos e que não gostam de trabalhar… vou mandar vir mais portugueses!»
Com tanto analfabetismo português à solta, que será de Angola? Só o Minoritário o sabe, ou parece que não, porque não restam dúvidas que isto vai explodir, vai sim senhor! Mas como o Minoritário é o detentor da verdade, e ele é que sabe tudo.
14 de Fevereiro
Sempre na mesma, imutáveis: ou não estão, ou então ainda estão numa reunião e não se sabe quando é que ela acaba.
14.57 horas. Espantei-me, mas, não se houve nenhum som? Nem uma buzina de um carro? O roncar louco de uma motorizada? Impressionante! E outra vez de repente, houve-se sim o terrível som do gerador do banco millennium Angola, e do seu fumo mortal, os tais que funcionam, são a alavanca, os mentores dos tumultos da derrocada desta merda.
15 de Fevereiro
É demais! Uma aterradora lavagem cerebral, que é sintonizar uma rádio e sai desporto. Outra, a mesma coisa, e ainda outra ibidem. Estamos encostados à parede da política, religião, poluição ambiental, sonora, bancária e desporto. E isto extermina o ser humano, a civilização.
Espoliaram a energia eléctrica às 11.27 horas.
E os cidadãos terão acesso às novas notas (de cinco e dez mil kwanzas,) diz o BNA. Cidadãos?! Quais?! Cidadãos só uma minoria do Minoritário, os outros são os estrangeiros. É por demais evidente que estas notas servem para facilitar a vida das empresas do Minoritário, e dos seus estrangeiros que movimentam muitos, muitos milhões de kwanzas/dólares. Entretanto, o mano Luther Rescova da Juventude do Minoritário disse que só desenvolvendo a economia haverá bem-estar. Mas, se a economia está concentrada num pequeno grupo Minoritário, como é que ela se desenvolverá?
Na hecatombe das deportações dos escravos no quilombo de Angola, quem mais sofre são as crianças. Uma coisa não entendo: porque será que o UNICEF não ergue a sua voz de condenação? PORQUÊ?!
E ao pensar no dia de hoje, no plano de trabalho para amanhã, incluo: oh! Não sei se haverá energia eléctrica, água e internet.
Isto é África!
E como ninguém consegue domar a aberração que domina Angola, não sei por quanto mais tempo assim permaneceremos, mais meio século? Um século? Eternamente? Tudo indica que sim.
Enquanto em todo o mundo há uma crise financeira, a tal global, em Angola não, há crise de corrupção.
Espoliaram a luz às 10.27, e devolveram-na às 13.01 horas.
16 de Fevereiro
O professor é como o governo. Se o professor não sabe para ele, quanto mais para ensinar, mesmo assim o aluno é contemplado com um diploma… de burro. É como o governo, não sabe ensinar, dirigir, então ao povo impõe-lhe o decreto governamental da burrice.
17 de Fevereiro
07.40 horas, o Governo da escuridão apagou-nos a luz.
18 de Fevereiro
Segundo o Dr. Elias Issac (director da Open Society – Angola), o que ele viu no bairro do Mayombe-Cacuaco, onde milhares de moradores viram as suas casas a serem demolidas (1 e 2 de Fevereiro de 2013), mulheres, crianças... Angolanos como nós debaixo da chuva porque não tinham lugar para se refugiar. Nem o ditador Idi Amin (Uganda) ou o Mobutu Sese Seko (RD do Congo) tratavam o seu povo da mesma forma. In Florindo Chivucute. Facebook
19 de Fevereiro
Continuamos na mesma.
O deputado da UNITA, Manuel Saviemba, ligou para o 113, e de lá responderam-lhe: «O seu número de telefone está na lista negra.» Denunciou ele na Assembleia Nacional durante a discussão do OPE – Orçamento do Petróleo do Estado.
Aproveito para denunciar, que quando tive uma ligeira altercação com um engenheiro de comunicações, ele contactou a MOVICEL e bloquearam-me o telemóvel. Ainda continuamos num Estado de Direito da ditadura. O Estado são eles, é deles.
Onze horas e vinte e oito minutos. Escuto a Rádio Ecclesia, o locutor informa que a cidade de Luanda em algumas ruas está intransitável. Buracos, poeira, lixo e cheiros nauseabundos. Fiquei com a impressão de que Luanda ficará com o trânsito paralisado, isso também já não surpreende ninguém, creio, desde que os fluxos petrolíferos abasteçam os nossos fazendeiros.

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

As Aventuras de Akalesela (Fim) O Mistério do Prédio Enfeitiçado




«Para compreendermos como o jogo mágico pode conduzir a aberrações e criar uma atmosfera de terror, vamos descrever alguns feitiços preparados só para fazer mal ou para defender e vingar supostas acções mágicas maléficas. É cega a fé no poder e, embora ninguém os tenha visto, acreditam na sua existência. Certos feiticeiros podem vivificar um cadáver com fórmulas secretas, medicamentos e invocações mágicas. Quando o conseguem, transforma-se num feitiço visível apenas a quem o fez. A uma ordem do feiticeiro, ele dirige-se à pessoa indicada e torce-lhe o pescoço até a matar. As outras pessoas apenas vêem a vítima caída no chão com o pescoço torcido e a gritar de dores. Pode-se afugentar queimando um pouco de farinha.
Em várias regiões de Angola, existe a convicção de que os chefes podem preparar um feitiço especial. Apanham uma criança e enterram-na viva. Durante duas semanas, desenterram-na diariamente e mumificam-na com lavagens e irrigações. Transforma-se num feitiço invisível que o chefe utiliza para matar os seus inimigos desta forma: aproxima-se da pessoa indicada com uma arma ao ombro e um chicote; dá-lhe uma chicotada e introduz-se no seu sangue. A vítima começa a tremer até morrer. Também se servem de meninas para conseguir os mesmos objectivos. Mas a estas matam-nas espetando-lhes um punhal no peito, depois de seduzidas, e levadas para um lugar escondido.»
In Cultura Tradicional Bantu. Pe. Raul Ruiz de Asúa Altuna. Ed. Paulinas

A paisagem é, pode-se dizer, das mais belas do mundo. O verde espraia-se por todo o lado parecendo o início dos tempos, pois que ainda está incólume. A contrastar, as pessoas, quase sempre mulheres, acompanham o que resta das estradas a pé. Carregam lenha, água e produtos das suas lavras longínquas. Ela dá uma ideia:
- A NASA podia muito bem simular aterragens espaciais nas crateras destas estradas.
Ele dá outra ideia:
- Acho que deviam deixar isto como está e promover o turismo de aventura, por exemplo com ralis sucessivos. Era uma boa fonte de divisas.
Chegaram ao destino. Ela sai do jipe, abraça-o enlevada. Recomenda-lhe:
- Não é aconselhável ficares aqui à minha espera. Vai, se não voltar dentro de quatro ou cinco dias faz as minhas exéquias. Não te esqueças de pôr água nas flores e dar de comer ao Joaninho.
Embrenhou-se no capim até desaparecer de vista. Ele ficou à espera da transformação. O tempo ia passando, ligou a ignição e preparou-se para o retorno. Depois de poucos quilómetros decorridos ouviu o som estridente dela no alto à sua frente. Voava fazendo o sinal de adeus com as asas. Ela rumou para a esquerda e deixou de a ver.
Fez alguns voos em círculo à volta do morro, não notando nada de anormal. Como já era noitinha poisou para descansar. Recomeçaria no dia seguinte. Quando o dia clareou voltou aos voos circulares rasantes sobre o pico. Planou assim até quase ao fim do dia, quando viu numa saliência um ninho de águia abandonado. Como a noite se aproximava poisou no cume para refazer as forças. Na manhã a seguir voou directamente para o ninho abandonado. Os seus olhos potentes viram uma cobra-capelo. Era a guardiã da pedra de fogo.
Tentou chegar-se mas viu que não dava porque a cobra estava sempre em posição de ataque. Recorreu a um expediente. Carregou nas suas garras uma pedra de dimensões consideráveis, pairou sobre o ninho e deixou-a cair em cima da cobra. O ninho desfez-se arrastando consigo a pedra de fogo e a cobra. Fez um voo picado e não lhe foi difícil apanhar a pedra de fogo. Sem se dar conta a pedra que ela deixara cair desprendeu-se, batendo-lhe numa asa. Começou a voar com dificuldade, sentiu que a sua vida estava em perigo.
Akalesela esperava ansioso pelo seu regresso. O espaço de tempo determinado chegara ao fim. Para exprimir os seus sentimentos recorreu a Camões:
Alma minha gentil que te partiste
Tão cedo de Luanda descontente
Repousa lá no Huambo docemente
E viva eu cá em Luanda sempre triste.
Se lá na saudade onde subiste
Sempre com o meu amor ardente
Na manhã calma doce e quente
Nos meus sonhos como nunca viste.
E se achares que posso merecer-te
Tal como uma nuvem que ficou
Como não regar as tuas flores e perder-te
E na distância como algo te levou
Brevemente quatro dias volto a ver-te
Vou-te amar como nunca ninguém te amou.

De noite teve um pesadelo em que ela lhe dizia:
- Sabes qual é a diferença que há entre amigos e Deus?
- Não.
- Nenhuma, quando precisamos deles abandonam-nos.
Injandanda está na porta para anunciar:
- Chefe, as vizinhas vem com amigas, querem entrar.
- Essas gajas são muito oportunistas. As jovens vizinhas querem entrar-me pela casa adentro. Diz-lhes que estou muito ocupado. Que sacanagem!
Estava com a esperança perdida. Olhou para a fotografia dela ao lado do computador. Não conhecia nenhuma mulher que igualasse a sua beleza. As suas glândulas lacrimais começaram a trabalhar. Sentiu os olhos molhados. Disse com muita amargura:
- Estamos infestados de maldosos, hipócritas, e não lhes acontece nada. Oh! Meu Deus! O que é bom e belo dura assim tão pouco tempo? Viu o Joaninho a comportar-se de modo desordenado, as suas orelhas estavam levantadas e olhava para a porta da varanda. Ouviu três guinchos seguidos. Ela voltou.
Estava com o braço ferido. Ele desinfectou a ferida com água oxigenada, colocou-lhe um pouco de pomada antibiótica que protegeu com uma ligadura de gaze. Ele abriu a porta a Injandanda.
- Chefe, é a filha do vizinho!
A criança não esperou que a interpelassem.
- Eu vi, eu vi ela.
Kakulu-Ka-Humbi aproxima-se dela e pergunta-lhe:
- Ela quem?
- Ela mesmo!
Kakulu-Ka-Humbi pisca o olho a Akalesela. Chama o Joaninho, este vem. A menina sente-se aterrorizada:
- Ai! Tenho muito medo. O papá disse-me que os gatos são feiticeiros.
Fugiu sem olhar para trás. Kakulu-Ka-Humbi sentia-se muito cansada e foi dormir.
Ela estava a chegar ao fim da narrativa da sua aventura da pedra de fogo.
- Disse para mim, até lá tenho que sobreviver. Consegui recuperar com os peixes que apanhava no rio Kunene. Bom, vamos acabar com o mau feitiço.
Ao chegar na fiscalização a secretária pede-lhe que se identifique:
- Huang He da empresa de construção chinesa Zhengzhou.
- Ah sim… bem-vinda, entre por favor.
Foi com espanto que King cobra a recebeu. Aturdido abriu uma gaveta da secretária mas ela não lhe deu tempo para consumar o acto. Pronunciou:
- Eha o kinjima xaká. (Deixa a maldade de uma vez.)
Esfregou as pedras, a pistola caiu-lhe da mão, e do interior do corpo saiu uma cobra que se desfez em pó. Ele sentiu-se confuso.
- Mas, onde estou?! Quem é você?!
Recobrou o ânimo, já não era a mesma pessoa. Disse:
- Tenho muito trabalho para fazer. Se veio para aqui enfeitiçar-me com a sua beleza, perde o seu tempo.
Ela retirou-se satisfeita. O feitiço tinha terminado.
Ma Yuan apareceu-lhes muito satisfeita com uma garrafa de champanhe. Falou com ar de festejo:
- Meus amigos, o feitiço desapareceu. A água e a luz não nos faltam. O prédio está a ficar bonito. Já não há infiltrações de água nos tectos. Estamos muito agradecidos pelo excelente trabalho que fizeram. Akalesela pode dizer-me como é que soube que eles eram os suspeitos?
- Muito fácil. Pelas intervenções que fazem na rádio informa com verdade, no jornal dos anúncios e TV do telejornal está a recomeçar.
Kakulu-Ka-Humbi adverte:
- A luz foi-se.
Ele conjectura:
- Esse é um grande feitiço que nos dará muito trabalho, e muitos perigos para acabar com ele.
Elas pedem em uníssono:
- Canta-nos uma trova!
Cavalguei florestas e sombras da noite
Rios nunca descobertos, princesa não encontrei
Cavalgo nesse eterno luar. As florestas e os rios são já
meus amigos
Tornei-me solitário. Apanho os peixes nos rios
e as frutas das árvores. Das minhas noites
dum tronco de árvore, fiz uma piroga para navegar
Vou descobrindo mais rios nas correntezas com esmeraldas
E neles e nelas encontro a minha princesa sempre na companhia do luar
de todas as noites.
Ma Yuan já está de saída. A menina grita-lhe:
- Eu vi!. Eu vi!. Agora são duas águias!

FIM

terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

As Aventuras de Akalesela (11). O Mistério do Prédio Enfeitiçado




Já lá vão uns anos que no Roque Santeiro não são pessoas que lá vendem, são almas do outro mundo.

«Apresentamos alguns exemplos de feitiços usados por grupos angolanos.
O «kissola» é um boneco de trapos, de uns 30 cm, preparado pelo adivinho. Enfeitam-no com uma cabeleira de fibra pintada com barro vermelho. O casal que deseja filhos coloca-o debaixo da cama. Em todas as Luas Novas, alimentam-no aspergindo-o com bebidas e alimentos e a mulher pinta-o com pó. Fica simbolizado por uma bananeira plantada à frente da casa e protegida por estacas. É o sinal do «kissola». Ninguém pode falar com a mulher que está sob a sua influência. Se não consegue engravidar, o adivinho arranca as estacas, mata uma galinha e esfrega o «kissola» com o sangue. Se, depois deste sacrifício, não consegue a gravidez, o especialista atribui à mulher a esterilidade.
O adivinho prepara o «nvunji» para o cliente que deseja descobrir um feiticeiro ou um inimigo, autor de algum mal, especialmente doenças. Enche um chifre de antílope com pó da casca da árvore «mbambu», de onde se extrai um dos venenos mais utilizados nos ordálios. No meio do pó coloca duas balas de chumbo. Entrega também uma pequena cabaça, «ndembo», cheia de «nbambu» e de pêlos de várias partes do corpo de uma pessoa. O dono coloca-o num cestito debaixo da sua cama. Quando quer activar a sua força, espeta o chifre junto ao fogo da lareira com a cabaça ao lado e pede-lhe uma doença para o inimigo.
Quando adoece uma criança, esfregam-na com pó de «nvunji». Tem variadas aplicações. Os chefes têm-no sempre porque o «nvunji» é como uma arma que mata tudo.
Quando alguém quer matar um inimigo vai ao adivinho. Esse tem uma arma diminuta em cujo tubo introduz pólvora, dois bocados de agulha e um pouco da terra que o inimigo pisou ou urinou. O cliente tem de matar um gavião e um pássaro selvagem chamado «andúa». Ao primeiro tira uma unha, ao segundo, um pedaço da asa e introduz tudo no cano da arma. A asa serve para levar a carga e a unha, além de ajudar a transportar, também serve para ferir o inimigo. Dependuram um galo de cabeça para baixo e o adivinho, com um só golpe, corta-lhe a cabeça. O queixoso acende a pólvora, saem as balas (agulhas) e espetam-se no galo. Neste momento morre o inimigo. O adivinho atira o galo ao rio, para simbolizar o enterro do inimigo e o queixoso, entretanto, amaldiçoa-o. Manda-o para casa e proíbe-lhe de dormir em sua cama, durante quatro dias. Certificada a morte do inimigo, ele tem de pagar os emolumentos ao adivinho.» In Cultura Tradicional Bantu. Pe. Raul Ruiz de Asúa Altuna. Ed. Paulinas

De repente muda de conversa:
- Querido, acho que devemos preocupar-nos com a nossa despensa porque está vazia. Vá, vamos fazer umas compras. Aproveito para renovar a minha lingerie e alguns perfumes.
Ele opõe-se:
- Querida da alcova consagrada, podias muito bem obviar o inconveniente dos gastos com lingerie e perfumes.
- Meu querido dos rituais satânicos femininos, se usar a mesma lingerie acabarás por não me prestar atenção. O segredo feminino está na renovação de mostrar a vulva sempre como se fosse diferente. E quando é embebida com perfume não habitual inebria os teus sentidos. Lamento, acho que devias estudar a arte de bem caçar, enfeitiçar.
Depois das compras no supermercado ela seleccionou uma butique que convidava as melhores novidades dos prazeres íntimos de vestir. Peças macias, aconchegantes, rendadas que êxtasiavam e confortavam. Ele ficou no carro à espera, sabia que a demora seria demasiada. Entrou na leitura do Livro dos Mortos do antigo Egipto que narrava os hinos, feitiços, e informações para guiar as almas após a morte para que fossem protegidas do mal. A leitura era interessante e interrompida de vez em quando por vendedores ambulantes que queriam convencê-lo a comprar qualquer coisa. Um deles não largava o vidro do carro, batia insistentemente. Baixou o vidro e aconselhou:
- Já disse que não quero nada. Sai daqui senão vou-te bater.
O miúdo não se intimidou, já estava habituado a impropérios. Meteu a mão para dentro do veículo e deixou cair um papel dobrado. Sem querer saber da resposta foi-se a correr como um rato. Ele desdobrou-o e ficou assustado com o seu teor: «Ela está em nosso poder. Extirparemos e comeremos a vulvovaginal.»
Em pânico tentou ligar para o telemóvel dela. Recebia sempre que estava desligado. Estava desolado, desgostoso, convencido que a perderia para sempre.
Em casa, além de abrir cervejas, não sabia mais o que fazer. Pensou que a actividade de detective de feitiços foi um erro perigoso. Teria sido mais fácil dedicar-se a qualquer coisa de construção civil. Não era difícil, bastava pagar alguma coisa e obter a inscrição como engenheiro. Afinal ele conhecia aprendizes que levantavam muros. Isso era o menos, bastava contratar um desses portugueses que aí andam auto promovidos a engenheiros que as coisas se comporiam. Enquanto conjecturava a luz foi-se. Bradou:
- Malditas serpentes venenosas que estais felizes nos vossos covis.
Kakulu-Ka-Humbi não sabia onde se encontrava. Estava sentada na única mobília existente num pequeno quarto, numa cadeira com as mãos e pés amarrados. Havia uma janela gradeada com vidros foscos. A porta estava fechada. De vez em quando ouvia algumas vozes. Recordou como foi capturada. Quando estava na butique a admirar a beleza do vestuário íntimo, duas jovens entraram pegaram num conjunto de lingerie e aconselharam-na que era ideal para ela. Só que tinha um papel que dizia: «sai calmamente porque temos pistolas apontadas para ti.» Ela assim fez e entraram rapidamente num carro que estava estacionado com o motor a trabalhar mesmo em frente da porta de saída. Vendaram-lhe os olhos e andaram mais de uma hora, talvez para despistar o local para onde iam. Quando acabaram de a amarrar disseram-lhe:
- Antes de seres engolida pelas serpentes farás parte de um ritual orgíaco.
Ela tinha aprendido os métodos de se libertar do célebre mágico Houdini que protagonizou fugas espectaculares. Pôs em prática o que aprendeu e safou-se. Tornou a colocar as cordas para não levantar suspeitas e aguardou pelos captores. Próximo à porta ouviu duas risadas de satisfação. A porta abre-se e entram dois facínoras que metiam medo só de os olhar. Um postou-se quase um metro à sua direita. O outro quase encostado a ela que a assedia:
- Que pena a tua beleza acabar assim. Eras muito bonita. Antes de morreres vou-te dizer um segredo. Queres saber onde está a nossa pedra de fogo?
Olha desconfiado para o outro e segreda qualquer coisa no ouvido dela. Provoca-a com o seu membro. Ela contava com isso, estava mesmo à boca de semear. E zás! Espeta-lhe uma grande dentada. O outro surpreso não teve tempo para reagir porque apanhou um pontapé nos tomates de tal modo que caiu e imobilizou-se. Ela corre para a porta, atravessa-a, entra na sala, vira à direita para a porta da rua, abre-a e alcança as escadas. Pára e espreita para avaliar a situação. Está num segundo andar, descer as escadas não adianta porque já a viram. Com os perseguidores no seu encalço sobe as escadas até acabarem. Está num sexto andar, olha para cima e vê um alçapão. Abre-o e foge para o terraço. Está encurralada, não tem por onde fugir. Quatro bandidos aproximam-se perigosamente com pistolas enquanto ela vai recuando até parar no parapeito. A situação atingiu o ponto crítico, eles param e preparam-se para disparar. Ela olha para o espaço à sua frente e atira-se para o vácuo enquanto grita.  
- Akúlu Tutulukisenu! ! (Antepassados mandem ficar mudado.)
A meio da tarde, muito exausto, Akalesela prepara-se para pedir ajuda à polícia, afinal ainda deixou lá alguns amigos. Mas só o fará no derradeiro momento. Entretanto pressente algo, o Joaninho está na porta da varanda, faz o barulho dele, peculiar:
- Miau! Miau! Miau!
Ele ouve o grito da rainha dos céus. É ela que chega.
Entretanto ouve-se o toque combinado de Injandanda na porta. Ela abre-a e ele diz:
- A filha do Ala Mu Muxitu quer falar.
- Diz lá minha filha. – Pediu carinhosamente Kakulu-Ka-Humbi.
- Quero uma águia para brincar.
- Minha menina, aqui não tem águias.
- Tem sim, eu vi ela entrar.
- Olha, vou fazer queixa ao teu pai, vais levar chapada.
A criança amedrontou-se como argumento e abandonou a porta.
Ela acabava de lhe contar a sua aventura e perguntou-lhe:
- Sabes onde está a pedra de fogo?
- Não.
- No morro do Moco.
Fazem os preparativos para a viagem. Ele informa-a:
- O Morro do Moco tem 2.620 metros, é o pico mais elevado de Angola. Está situado na província do Huambo a Noroeste da sua capital no município de Londuimbali. De Luanda ao Huambo são cerca de 516 quilómetros.
Ela preocupa-se:
- Estamos em Janeiro, a chuva é abundante. As estradas são as mais horríveis do mundo. Receio que a nossa viagem seja uma grande aventura.
- Não receies, a tua plumagem regressará intacta.
Carregaram água, comida e uma caixa térmica com gelo, algumas cervejas, e claro, gambas. Dois cobertores e recipientes com combustível de reserva. Não se esqueceram da caixa dos primeiros socorros. Já estavam bastante adiantados na rota.