quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

As Aventuras de Akalesela (09). O Mistério do Prédio Enfeitiçado




«Noutros ordálios fica inocente quem consegue extrair uma agulha do fundo de uma panela de água a ferver. Outras vezes, submetem-se à «prova da agulha»: se não sai sangue depois de picar a língua, o lóbulo da orelha ou as pálpebras, fica provada a sua inocência. Também é inocente quem consegue pisar com lentidão, várias vezes, as brasas, sem queimar os pés.
Mais perigosa, aterrorizante e frequente a prova do veneno, usada sobretudo para esclarecer a acusação de feitiçaria. Em muitas regiões de Angola denominam-se «mbambu». Só o adivinho conhece as propriedades altamente venenosas de certas plantas.
Outras vezes, dependuram o cadáver, atado de pés e mãos a um pau ou colocam-no numas andas. Dois ou quatro homens passeiam-no pela aldeia. Diante de toda a assistência silenciosa e aterrada, o adivinho pergunta ao cadáver: - Quem te matou?
O cadáver quase sempre se detém diante duma pessoa e se move bruscamente. Não há dúvida, aquele indivíduo foi o feiticeiro.
Estas práticas originam vinganças, arbitrariedades, abusos e um medo generalizado. É que o acusado não pode apelar, visto que o bantu admite um tipo de feitiçaria inconsciente, como vimos, e, além disso, nunca pode demonstrar a sua inocência ante uma prova tão irrefutável prestada desde o além-túmulo por um defunto ou seus antepassados.
Acusam em especial os indivíduos anti-sociais, misantropos, apáticos, defeituosos, irascíveis, a quem os familiares ou o adivinho odeiam, e os mais ricos. Realizam assim uma assepsia social e uma circulação de bens.» In Cultura Tradicional Bantu. Pe. Raul Ruiz de Asúa Altuna. Ed. Paulinas

À hora do almoço ela apresenta-lhe um prato e sugere:
- Querido, se o jindungo não chegar, está aqui mais.
Depois do almoço sentaram-se com os olhos na TV. Viam-se imagens de Taiti, depois Hiva Ao. Falavam de Paul Gauguin e mostravam pinturas dele: Mulheres do Taiti na Praia, Mulher com uma Manga, Boatos Fúteis, e Quando é que você se casa? Gauguin, que desprezava a civilização porque isso significa destruir. A civilização da espoliação para ganhar dinheiro. Arrasar com povos, civilizações que apenas amavam a natureza e não davam valor ao ouro e diamantes, a não ser para enfeites cerimoniais. Os considerados inferiores eram na realidade superiores. Ainda hoje essa condição se mantém, basta observar o que se passa com a exploração das populações onde existem petróleo e diamantes.
Ele, sem tirar os olhos da TV enceta um diálogo: 
- De manhã naquela praia do Taiti, uma gaivota acreditava que estávamos sós. Como se o mar não existisse. Aproximou-se a gaivota confiante. De repente lembrou-se que nós éramos humanos. E voou aterrorizada prolongando a sua fome. Deixando-nos a pensar que depois dela, já antes lá estava.
Ela alinha solidária no mesmo tom, alia-se na mesma irmandade:
- Desfilava o cortejo de um funeral imbecil, com um caixão imbecil, contendo um imbecil morto. Dizem que em vida foi um hábil negociante. Enganou este mundo e agora vai enganar o outro. O funeral era acompanhado por uma grande multidão à qual ele muito prometera, mas nada lhes deixou. Meia dúzia de nobres que com ele muito lucraram e todos os seus lacaios tentavam passar despercebidos. Mais adiante seguia outro funeral, o de um HOMEM que durante a sua vida nunca se cansou de ensinar. Hoje ninguém liga aos ensinamentos, só se preocupam com petróleo e diamantes, por isso acompanhavam-no apenas meia dúzia de pessoas. Aquelas que aproveitaram o que ele ensinou.
Ele lastima-se:
-Deixem-me ver as aves voarem e poisarem nas árvores. Deixem-me voar onde não há estradas.
Ela corrige-o:
- As estradas são necessárias para o bem da humanidade. São também óptimas para a passagem de exércitos que depois as destroem, para que o inimigo não as possa utilizar.
Ele segue-lhe o raciocínio:
- Sim… vendem-se armas a prestações. Qualquer ditador pode assim garantir o fornecimento do seu exército. E os fabricantes terem incentivos para produzir mais. É uma guerra feita a prestações. Deve-se encorajar o fabrico de armamento pois há sempre alguém que diz: as armas são necessárias para o desenvolvimento do nosso país. Onde há guerra não existe amor.
Ela lembra algures já passado:
- Encontrámo-nos por acaso e tudo surgiu por acaso. Primeiro amámo-nos numa eternidade de silêncios. Depois o mar estava tão próximo, tão debaixo de nós. Como a esteira onde nos deitámos e ficámos desfeitos pelo universo do amor. Prometemos depois que o nosso amor seria uma sinfonia eterna. Podemos nas noites escuras ser claros, transparentes nos nossos diálogos, então as noites escuras podem ser claras.
Ele rejubila:
-Vemo-nos, vejo-te todos os dias, sempre tão íntima, sempre tão distante. Como sol protegido pelas nuvens do teu ser. Como bem-querer e ficar quase desfeito nas escarpas dos teus cabelos. Como ver o teu corpo vestido na nudez do teu vestuário.
Ela mostra o seu esplendor:
- Sentado olhavas para o infinito do teu rosto, no teu canto silencioso como o teu olhar. Os teus cabelos quase dispersos no quase infinito do teu tempo. Olhavas para dentro de ti e não te encontravas. Perdido nas tuas manhãs da tua busca sempre ansiosa. O teu cabelo caía como flores acariciadas nas minhas mãos. Lutei contigo para colher uma. Consegui colhê-las todas finalmente.
Ele sente uma visão repentina:
- E finalmente Deus lançou os últimos raios de fogo sobre a Terra, e já não havia ninguém para os receber.
Mas os anseios e devaneios em Jingola depressa se desvanecem, porque há um chamamento, um apelo contante ao demónio.
- Que barulho é este? O que é que eles estão a fazer agora? Parece que estão a rebentar granadas. Kakulu-Ka-Humbi vai lá ver.
Ela subiu, falou com os vizinhos e desceu:
- Estão a derrubar a parede que construíram na sala. Dizem que estão sempre a chegar mais visitas e precisam de mais espaço.
- Santo Deus! Quando acabará este tormento?!
- São os ala mu muxitu. (Estão na mata, na selva, no bosque, na floresta.)
Injandanda faz-lhe o serviço de segurança, posta-se na sua trazeira e tranquiliza-a:
- Vou ficar mais afastado, estou com medo dos destroços.
Akalesela acha preferivel abandonar o ambiente desolador, de destruição permanente. Do colocar Jingola como depois de uma grande tormenta climática.
- Vamos investigar o prédio enfeitiçado.
Já estavam a caminho, ela previne-o:
- Vou sozinha, deixa-me em casa da minha avó. Como é próximo, vou a pé. Não vale a pena esperares. Nesta cidade já não se pode andar de carro. Depois apanho um táxi para casa.
Ma Yuan esperava-a porque foi prevenida com antecedência da visita. Mirou Kakulu-Ka-Humbi de alto a baixo e observou:
- Querida, quem me dera ter o teu corpo.
- Um não te chega?
Ma Yuan parece não ter gostado do comentário. E rápidamente mudou de conversa.
- Já avisei os vizinhos que virias, podes começar o trabalho.
A inspecção terminou quase duas horas depois. Ao sair do prédio pára porque próximo está o que parece uma força-tarefa.
Dois carros fortificados e cinco homens bem armados com coletes à prova de bala preparam-se para a recolha das receitas do dia de uma operadora de telemóveis. Um está no interior do estabelecimento, outro no passeio, outro na esquina, outro mais afastado e finalmente outro encostado nos carros da escolta. O que transporta as receitas move-se rápido. Os outros preparam-se para disparar. Não deixam ninguém aproximar-se. O perigo é intenso porque ninguém sabe se a qualquer momento sairá um disparo acidental, e mais uma vítima inocente deixará de viver. Os carros partem parecendo uma cena de um filme. Num repente, Kakulu é cercada por quatro jovens. Um deles entoa ameaçador:
- Passa o telemóvel.
Ela prepara-se para se agachar e morder-lhe os testículos. Desiste porque vê que estão armados. Deixa que lhe tirem o telemóvel. Eles retiram-se rapidamente do local. Ela não se dá por vencida e exclama:
- Akúlu Tutulukisenu! (Antepassados mandem ficar mudado.)
De repente transforma-se em águia. Sobe e mira facilmente os malfeitores. Paira sobre eles e ataca com uma garra o que tem o telemóvel. Retira-o e com a outra garra livre aperta-lhe o pénis. Os meliantes fogem. Ouvem-se dois comentários:
- Nunca vi um telemóvel enfeitiçado.
- Avisei para não fumarmos a droga que veio da Nigéria.
A águia eleva-se e voa para casa. O Joaninho miava muito agitado. Akalesela ouviu um guincho conhecido no exterior. Abriu as portas da varanda completamente. A majestosa águia entra e poisa no poleiro. Depois de fechar as portas o mais rápido que lhe é possível, volta-se e vê que Kakulu-Ka-Humbi já está sentada no sofá. Batem à porta de entrada, ele abre-a, é Injandanda. Este anuncia:
- Ala mu muxitu quer falar com o vizinho.
O vizinho vem com uma menina.
- A minha filha diz que viu entrar uma águia e quer brincar com ela.
- Deve ser engano.
- Desculpe vizinho, esta criança só tem oito anos e já mente assim.
Dá-lhe uma chapada na cara e ameaça-a:
- Você está a ficar feiticeira, vamos queimar-te e atirar-te para a lixeira.
- A luz foi-se. – Lamentou ela.
- Sem electricidade a fome é! – Exclama ele.
- Certa! – Juntou ela.

Imagem: João Stattmiller

terça-feira, 29 de janeiro de 2013

E a este povo só lhe resta vender papel higiénico e guardanapos de papel




Como é admirável a luta do advogado contra a viscosidade do Poder dos senhores do petróleo.
Sim! Sim! É um estado de facto e de direito para os tubarões.
Discute-se o Orçamento Geral do Estado sem Estado?!
“ Não podemos continuar a fingir que a geração de riqueza por uns beneficiará inevitavelmente a muitos – muitas vezes a realidade é ao contrário.” Jeremy Hobbs. Director executivo da Oxfam
Porque é que a maioria dos nossos jornalistas não tem imaginação? Porque utilizam a servil imaginação do Poder? O nosso jornalismo é neocolonialista?
Um governo que privilegia as empresas estrangeiras e delas é sócio: Faz contratos que nunca são conhecidos do domínio público, apesar de publicitar ao mundo que é um país democrático, eleito por esmagadora maioria, sempre em eleições livres, justas, democráticas e transparentes. Uma oposição que declara fraude eleitoral, mas que depois se acoita no covil da assembleia nacional, a todos os ventos anunciada democrática. Os trabalhadores nacionais são obrigados a salários de escravos, quando os recebem, nas modernas fazendas da escravatura a que os seus capatazes chamam de empresas. O FMI de vez em quando desce à imprensa e comunica que a economia, o tal PIB, está a subir, todos os anos sobe. Sindicatos estão corrompidos, obedientes aos fazendeiros. E quando alguns escravos ousam levantar-se contra as infames condições, pois há sempre alguém que diz não, chamam-lhes de tudo, até de terroristas. E logo carregam sobre eles forças especiais com: cães, cavalos, tanques, helicópteros, tudo, que depois de caçados e bem torturados levam-lhes para prisões desconhecidas, onde o seu desaparecimento é mais que certo – lançados de avião na maré-alta? -. Dantes tinham um hino e uma bandeira, agora já não é necessário porque foram substituídos pelas bandeiras e hinos do grande aparato militar. Eis mais um país africano.
Quando leio na imprensa que o banco nacional de um país vai comprar activos para estabilizar a economia, logo concluo que: mais um país que se afunda na banalidade do terrorismo bancário.
Todos os dias vivem-se momentos de ataques ferozes à nossa integridade física, moral e económica por parte de um bando que ainda não aprendeu a viver em sociedade. Os crimes mantêm-se violentos, sem solução. A morte festeja-se no habitual cortejo de cadáveres. Quando o vento sopra na direcção das nossas narinas, entra o fumo intenso que intoxica, faz tossir, a respiração é dificultada, sente-se ardor nos olhos, o tal sinal de envenenamento. Imaginem um bebé nestas condições. Tem que se fechar de imediato portas e janelas. Este crime hediondo já várias vezes denunciado vem do gerador do banco millennium Angola, instalado na espoliação das traseiras da rua rei Katyavala, em Luanda. Esses que nos governam querem, desejam a nossa morte, pois em tudo estão as suas mãos. Acredito que este país não permanecerá muito tempo sem lei, não pode continuar, andar assim. Serão julgados e condenados sem apelação!
Como entender que passadas décadas da proclamação das independências se tenha que ir pedir ajuda a Paris ou Lisboa para resolver diferendos internos? Aquela soberania de que tanto falam em seus discursos o que afinal significa? Não há agenda que possa vingar com governantes medíocres, autênticos meliantes e mercenários… África, é tempo de acordar e sacudir de tuas costas, os vampiros que te sugam e entorpecem… In Noé Nhantumbo. canalmoz
E quando tudo se torna insuportável, impossível de sustentar, o sistema que lhe deu origem, e estupidamente assim continua, fatalmente desmoronará. Porque esse sistema político vive, impõe-se pela extrema repressão, e esta até hoje nunca conseguiu nem nunca conseguirá vencer a inteligência, a democracia e a Liberdade.
E os planos quinquenais do Minoritário lembram os programas do Governo português para tirar o seu povo da miséria. Mas, pelo contrário, a miséria aprofunda-se, abisma-se. Então, quem não tem a noção do que é governar, porque insiste em se manter no Poder?
Oh, como é lamentável, lastimável que o Poder actual esteja concentrado em pessoas cujas cabeças são balões, e que por isso mesmo estão sempre nos devaneios aeriformes.
Brincalhões: “a nossa luta é para libertar o nosso povo do colonialismo e da escravidão.”
Facto político. Este Poder está há quase quarenta anos numa estiagem, a maior da História, e dela não quer, não consegue sair, porque a incompetência é a sua advocacia, universidade, a sua mediocridade. Mas conseguiu uma grande inundação, nisso é extremamente hábil, tem os cofres pessoais inundados de dinheiro ilícito, e desenvolveu a corrupção e as fraudes eleitorais para se perpetuar na estiagem do Poder.
Já notaram que quanto mais as igrejas obrigam os seus fieis em intermináveis vigílias de oração, rezar, rezar, para que o Senhor nos conceda a felicidade, mais o crime, a violência, a prostituição, todas as desgraças aumentam vertiginosamente? Os males que nos afectam, que nos reduzem a zero, que fazem com que todos os dias se inaugurem supermercados/contentores do lixo, onde a miséria mwangolé se abastece regularmente, as igrejas são as irresponsáveis pelo descaminho das populações para a miséria, pois, onde há miséria e escravidão as igrejas surgem de plantão, sempre lá estão, pois sem miséria o Senhor delas se extinguirá.
O presidente da PGR – Procuradoria-geral da república, é general. O presidente da República, idem. Quase todos os membros do Governo são generais, deputados/generais, etc, etc. Como é possível aceitar isto numa democracia infestada, dirigida por generais… a propósito: é bem possível que nalguma igreja também exista algum general, CARAMBA! Um país dirigido, controlado, gerido por generais, é país? As leis daí saídas têm algum valor? Mas como Angola é uma unidade, uma guarnição militar, sim.
Manos e manas!
Enquanto não se desmantelar este Estado leninista, e por isso mesmo militarista, não vale a pena perder mais tempo, porque assim a se continuar na lengalenga, nem daqui a cem anos.
Parafraseando: no princípio era o Verbo, e o Verbo estava com os generais, e o Verbo era, é, os generais. Ele estava no princípio com os generais. E o Verbo se fez corrupção e habita entre nós.
Uma fonte digna de crédito confidenciou-me que na empresa INSTAL, colada à ANGOP, todos os dias se vêem caras novas de portugueses. Isto já dura há muito tempo. A questão que se coloca é a seguinte: A INSTAL é actualmente um centro de emprego clandestino de portugueses? Por este caminhar/vender, não admira nada que Angola se torne num imenso arrozal chinês, numa outra dinastia filipina portuguesa.
Segundo a Rádio Ecclesia, no bairro Morro Bento, próximo do Futungo de Belas, em Luanda, um defensor do meio ambiente do Minoritário construiu uma central de betão. A população da zona desfalece sem remissão, à espera da morte. É de realçar que o defensor (?) do meio ambiente esteve recentemente numa conferência no Brasil sobre o tema… conservação do meio ambiente. Isto estava inscrito na fraude eleitoral?
No programa Vector, da LAC – Luanda Antena Comercial, escutei, 08 de Novembro, cerca das 11.30, as desalinhadas intervenções de um tal, Rui Manuel dos Santos, que se apresentou como empresário, e com a pretensão de dar lições aos homólogos. Pois, disse ele que um empresário que só trabalha com o horário estabelecido por lei não é, nunca será empresário. Um empresário, segundo ele, terá que trabalhar dezasseis horas, e que até em casa está sempre a trabalhar, o que quis significar que um empresário não dorme, não descansa.
Esta é a concepção arcaica do empresário, e a moderna decerto ele não a sabe. Ele não explicou, nem nunca vai explicar, que o empresariado em Angola está subjugado à corrupção do Minoritário, como ele, porque senão, não se safava. E alem do mais ele usa e abusa do conhecimento não sistematizado, quer dizer, parece que lê muito, vê muita coisa, mas não consegue sintetizar o discurso, o que revela um mais que perfeito bocó. Mas isto é tão natural, e como o Minoritário apoia, compra, descarta.
Enquanto Angola continuar ocupada, subjugada por estrangeiros, existirá não independência, mas absoluta dependência.
A degradação intelectual e social, como uma avalanche faz desabar Luanda, de Angola nem vale a pena continuar e falar, pois há muito que se partiu. Aos poucos, ou muito rápidos?, os chineses vão usurpando tudo o que bem entenderem, incluindo a escravidão da população onde se instalam, lembrando a época mais sangrenta da escravidão colonial. Outra estrangeirada idem, sob o olhar cúmplice do UPPC – Um Pouco de Paciência e Compreensão.
Imagem: João Sttamiller

domingo, 27 de janeiro de 2013

As Aventuras de Akalesela (08). O Mistério do Prédio Enfeitiçado



  
“C. Estermann assegura que o chefe de Evale tinha poderes mágicos para atrair a chuva. Mas só os conseguia se sacrificava uma jovem mãe cujo filho era entregue a outra mulher. Juntamente com a vítima, sacrificavam também uma vaca negra, antes do sacrifício, o leite da mulher e o da vaca eram aspergidos várias vezes por terra, como prenúncio da chuva. A mulher era assassinada com um golpe de lança e, com o seu sangue, aspergiam as árvores da chuva. O seu cadáver ficava insepulto e ninguém podia chorar a sua morte nem guardar luto.
São prodigiosos tanto o conhecimento que os adivinhos e curandeiros guardam sobre os venenos tão variados, como a prática pericial consumada que adquiriram para dosificá-los. «Conhecem com certeza diversos venenos pouco conhecidos fora do mundo especial dos toxicólogos competentes, e talvez tenham encontrado outros que a ciência nem sequer suspeita que existam. Entre os venenos, alguns produzem efeitos imediatos; outros ficam sem acção visível durante meses; outros ainda, causam sintomas idênticos a doenças bem conhecidas». «Observe-se que há 570 plantas africanas conhecidas pela ciência ocidental como venenosas de um modo ou outro. Sem dúvida os curandeiros e adivinhos conhecem muitas mais.”
In Cultura Tradicional Bantu. Pe. Raul Ruiz de Asúa Altuna. Ed. Paulinas

Ela levanta-se:
- Aguarda um momento, vou à cozinha.
Voltou e afirma triunfal:
- Aqui tens o teu afrodisíaco. A Kakulu disse-me que gostas muito de gambas com quiabos, coentros… e o molho está aqui.
Ele agradece-lhe e retoma a conversa:
- Se a raça humana acabar Deus sobreviverá?
Ela afirma de modo evasivo:
- É uma coisa bela esta civilização que nos deixa felizes, e em nome dela destruir tudo o que vive. Não, não são somente os animais, peixes e plantas. São as pessoas… os seres humanos que estão a ser exterminados. E nós aceitamos isso com uma naturalidade invulgar. Estamos a ser consumidos num suicídio colectivo. O cristianismo tal como profetizou quer o apocalipse. O que está escrito tem que ser cumprido. Não podemos aceitar isto. Que a Igreja sucumba mas que não nos arraste. Já não acredito no cristianismo, isto é, nas pessoas que o representam.
- Então em quem acreditas?
- Na verdade em tudo o que é verde. Refiro-me às árvores, às plantas… estão sempre vivas, a ondular com o vento. Isso é o verdadeiro Deus. O resto é coisas que alguns seres humanos inventaram para fazerem negócios. Isto deve acabar, tem que acabar.
Ele humoriza:
- Os dólares são verdes, enfeitiçam os nossos governantes.
- Um dia destes vamos vê-los a serem arrestados em qualquer país. Acho que não deviam viajar.
Mas ele insiste:                                            
- Dizem que essa cor verde lhes dá sabedoria.
Ela recorre à história:
- O filósofo Bias, um dos sete sábios da Grécia, quando Priene estava ameaçada pelos exércitos de Ciro, e a população fugia com tudo o que pudesse levar. Como ele não se preocupava, perguntaram-lhe porquê. Ele respondeu que levava todos os bens consigo. Os bens eram a sua sabedoria.
Mas ele reage, lembra-lhe os perigos da riqueza:
- A riqueza é sempre ilícita e perigosa porque quem tem, quer sempre ter mais. Só têm um pensamento… dinheiro. E isso dá-lhes poder. Então, tornam-se desumanos, avarentos, e para atingirem os seus objectivos corrompem aqueles que se vendem facilmente. A vida que levam é diferente das outras pessoas. Porque estão possessos, permanentemente ávidos e demoníacos. E quanto mais enriquecem, mais a miséria aumenta. Este é o maior mal do mundo. É a civilização da democracia.
- Prefiro Barrabás a Jesus. – Disse ela convicta.
Encontravam-se desinibidos devido ao efeito do afrodisíaco e da bebida. Olhavam-se com paixão. Em silêncio, ela retirou-se e entrou no quarto. Alguns minutos depois reapareceu. Caminhava lentamente como se desfilasse numa passarela num convite mudo a apresentar, para comprarem a sua moda. A luz fluorescente chamava a atenção para o azul-escuro do seu baby-doll. A cor do batom nos lábios condizia com o vestuário. Ele fascina-se:
- Se todos os feitiços fossem assim nunca deixaria que terminassem.
Ela pega nos telemóveis e desliga-os. Diz ofegante:
- Assim não seremos incomodados, vamos acamar-nos.
- E se a Kakulu-Ka-Humbi liga?
- Não te preocupes, deve estar no poleiro da águia.
Ele confirmou que ela era uma obra-prima do prazer. Continuavam deitados a sorrirem e a acariciarem-se enlevados de farto prazer. Ele de repente levanta-se e augura:
- Que horas são?!
- São duas da manhã.
- Ma Yuan tenho que ir.
- Já… tão febrilmente cedo?
Vestiu-se rapidamente e já estava na porta de saída. Ela antes de lha abrir beijou-o e murmurou-lhe:
- Quero ser tua sócia… detective para os casos amorosos.
Ele não lhe prestou atenção. Já no jipe e antes de o pôr em movimento ligou o telemóvel e pressentiu que Kakulu-Ka-Humbi lhe tinha ligado. Enquanto conduzia, sentia-se muito preocupado com a recepção dela quando chegasse a casa.
Accionou o comando da porta da garagem, ela não se moveu. Saiu do jipe e foi para a porta de entrada. Estava lá um anúncio.

PROCURA-SE!
Jovem solitária e muito sensual procura jovem honesto para noites inesquecíveis. Guarda-se sigilo.

Experimentou abrir a porta, mas não conseguiu. Resignou-se e pensou em dormir o resto da noite no jipe. Quando se preparava para isso lembrou-se que geralmente as mulheres costumam esquecer-se sempre de um pormenor. E é sempre bom ter um homem ao seu lado para colmatar esses lapsos. Com um sorriso triunfal foi para a pequena janela que servia para arejar o ginásio. Estava fechada apenas com um ligeiro trinco interno. O gradeamento estava aberto por esquecimento. O porta-bagagens do jipe tinha um saco de lona com diversos utensílios. Retirou um arame de aço, dobrou-o a custo na ponta deixando-lhe um intervalo e enfiou-o pela borda da janela até conseguir encostá-lo no trinco. Puxou e a janela abriu-se. Penetrou com dificuldade… e já estava em casa.  Movendo-se quase como um gato abriu a arca congeladora e retirou um bocado de gelo que achou suficiente. Tirou do refrigerador um bocado de manteiga que colocou num plástico. Silenciosamente dirigiu-se para o quarto dela e deixou o gelo e a manteiga na cama junto às suas nádegas.

Ele acordou assustado com o grito dela. Dava-lhe vontade de ecoar risadas fortes mas conteve-se. Recostou-se e voltou a adormecer feliz.
A meio da manhã ele assistia a um filme na parabólica. Ela entra muda e com ar muito sério. Ele calmamente saúda-a:
- Querida, espero sinceramente que tenha dormido bem.
Ela lançou-lhe um olhar de ódio. Ripostou com dureza:
- Mukaji é muenió? (Tua mulher é essa mesmo?)
- Só gosto de uma mulher.
- Akaji. (Mulheres, amantes, esposas, amigas?)
Ele tentou cativá-la:
- Querida, acho que está uma bela manhã para trovar.
Ela foi para a cozinha e ouviu-se o som de pratos e panelas que pareciam voar.
Ele sabia muito bem que quando uma mulher está com ciúmes não adianta falar-lhe. É que as coisas complicam-se. Por isso escudou-se no mutismo. Ela seguiu-lhe o exemplo e não se falaram mais. À noite, enquanto ele jantava, ela aproveitou-se do interlúdio e embrenhou-se no quarto dele.
Levava um frasco com perfume ao qual juntou água com jindungo préviamente moído e coado. Aspergiu o lençol e por baixo do travesseiro da cama dele com quantidade quanto baste.  Disfarçou colocando outro lençol por cima.
Enquanto aguardava que o sono chegasse, ocupou-se a arrumar as suas roupas. O sono veio e deitou-se. Minutos depois foi a vez dele que retirou o lençol e sentiu cheiro forte não habitual a perfume. Disse para si:
- Aqui está a prova de que ela gosta muito de mim. Também gosto muito de ti querida.
Deitou-se satisfeito convencido de que tudo tinha voltado ao normal.
De manhã ela encontra-o na sala enxovalhado no sofá. Não dorme. Pelo aspecto vê-se que a noite não lhe correu nada bem. Os olhos estão vermelhos. Nota-se rubor em algumas partes do corpo. De vez em quando afasta a roupa dos órgãos genitais porque ainda sente ardor. Ela cumprimenta-o com o ar mais cínico possível:
- Querido, estou convicta que a noite foi muito agitada para si.
Ele quase não sentia forças para falar. Fixou o olhar triste no tecto. Ela fez-lhe um pedido veemente:
- Querido, sinto-me muito desconfortada, porque não me canta uma trova?

Imagem: o feitiço da bebida, “caçada” no Facebook