Diário da cidade dos leilões de escravos
16
de Dezembro
O Governo português do primeiro-ministro
Passos Coelho disse que o desemprego em Portugal diminuiu. Com certeza, pois se
por aqui – em Luanda – pouco falta para que sejam – dizem – quinhentos mil
portugueses que aqui conseguiram emprego. Numa política puramente colonial
apoiada pelos princípios mais retrógrados do poder do petróleo, em que, o
petróleo é nosso, da minoria, nós ordenamos e o povo ajoelhado suplica-nos por
algumas côdeas de pão.
E o que se fará com o petróleo a 55.91 dólares?
Nada, isto é, numa população miserável não há como carregar nos impostos. As
empresas são deles ou a eles ligadas, só resta o aumento do preço dos combustíveis,
e isto será a derrocada porque a população já não suporta mais miséria e com a
fome como única companhia o teatro está encenado para a desgraça final. Esta
irresponsável governação quando os preços do petróleo valiam ouro podia muito
bem ter criado o desenvolvimento da economia do país, mas não, optou por
surripiar as receitas do petróleo para usos individuais e agora nada há a
fazer, a não ser o regresso ao comunismo primitivo, que já se nota muito bem
com o apoio dos chineses, basta ver a porcaria dos produtos deles que por aqui
circulam. Quer dizer, a China envia-nos o lixo e nós comemos. Sinceramente,
isto é demais, como se fossemos porcos no curral, e a oposição não consegue combater
estes males, a não ser com alguns comunicados onde o partido no poder se ri de
tanta inépcia. Pobres cérebros sem neurónios.
17
de Dezembro
Todos os meios lhes servem para nos
eliminarem. Até o gás do gerador do banco millenium na rua rei Katyavala em
Luanda. Sobre mais este gerador da morte, – são muitos, como os que estão nas
torres e condomínios deles, é tudo deles até as praias, eles fazem o que querem
e lhes apetece para nos liquidarem e ninguém têm coragem para se lhes opor,
como essa oposição da vergonhosa vanguarda do histerismo político que se diz
democrática – chegou à nossa redacção a informação que o banco millenium
telefona todos os dias para os técnicos portugueses, mas eles não aparecem. Uma
fonte que preferiu o anonimato disse que o banco millenium não paga os serviços
prestados e os portugueses estão em greve por falta de pagamento. Sem lei nem
ordem os portugueses destronam Luanda e as nossas vidas.
18
de Dezembro
Mais um cúmulo bwé da nossa hipocrisia
local: falam bwé da corrupção dos outros países, como o caso Junker da União
Europeia e da corrupção das suas figuras públicas, falam, falam da corrupção
sem exaustão. E da corrupção das portas escancaradas em Angola nem uma palavra.
Isto inclui os tais nossos famosos jornalistas que têm medo de se debruçarem
sobre o tal patriotismo nacional – a corrupção – Ah! Corrupção a quanto
obrigas.
19
de Dezembro
Isto assim não dá, quer dizer, qualquer
um tem ordem para matar. Isto cheira a chacina.
Ninguém está em paz porque as quadrilhas
chegam e como no faroeste, fazem tudo por tudo para nos desalojarem, nos
matarem. Só a lei da morte impera. Em pleno ano de 2014, custa dizê-lo, mas
estamos à mercê de um Estado selvagem.
Diariamente a violência sobe tão
facilmente até atingir a sua vitória final. Viver aterrorizado à espera de ser
assaltado, isso é viver? Ó senhores do petróleo, ainda não lhes chega, ainda
não estão satisfeitos? É necessário o clímax final?! É fácil de prever que uma
revolta acontecerá, mas como os senhores, os donos do petróleo e de tudo têm a
certeza que não, eles é que são os inteligentes porque com a violenta
repressão, o terror resolve tudo mas gera também violenta resposta que
facilmente se poderia evitar mas como preferem o caos e os rios de sangue,
assim seja feita a vontade deles.
20
de Dezembro
Rafael Marques de Morais: “Como se pode
ter orgulho na soberania de um país que tem mais de mil generais e comissários
da polícia, mas não consegue produzir dois coordenadores de segurança para o
Kero? Com a premissa da incapacidade da mão-de-obra local e a carência de
quadros nacionais, faltou apenas ao governo importar ministros e generais,
cargos que constituem os maiores entraves ao desenvolvimento humano em Angola.”
Viver sem oposição política, é como o
mar sem peixe, como um castelo assombrado, como mulher sem marido e vice-versa,
como sacerdotes sem templos, como dias sem sol densos de nevoeiro. Viver de uma
só voz é como um hospital psiquiátrico que vive da voz do seu director. É como
uma ditadura do proletariado.
Não é, nunca será possível nesta cidade
dominada por quadrilhas existir lei. Existe apenas a lei das quadrilhas.
21
de Dezembro
Uma jovem de dezoito aqui da bwala
engravidou e não se sabe como tirou a gravidez. Depois começou a queixar-se de
que não se sentia bem. Levaram-na ao hospital mas em vão, quando lá chegou já
estava sem vida.
No dia 10 de Novembro a Rádio Ecclesia
noticiou que um jovem no bairro Huambo, em Luanda, foi assaltado e agredido até
à morte.
O Nosso Técnico está num banco a reparar
uma máquina que controla os depósitos e levantamentos. De repente chegam dois
brancos portugueses e dizem-lhe para ele se retirar que eles farão o serviço,
quer dizer, para lhe roubarem o emprego. O Nosso Técnico bazou e foi para casa.
São tantas, tantas as diatribes patrocinadas pelos únicos e exclusivos
milionários do petróleo que não dá mais para suportar. Desprezar os angolanos
em proveito dos estrangeiros é um atentado contra a segurança nacional, é fazer
revolta, é promover instabilidade.
22
de Dezembro
Nós, estrangeiros, apoderamo-nos de
tudo, então, vós, mwangolés ficais desempregados. Bom, desempregados não.
Restam-vos as vendas nas ruas e os assaltos. Mas nas vendas nas ruas instruímos
a Polícia para que vos persiga, porque não queremos lixo nas ruas, sim! Vós, os
donos da terra sois lixo!
23
de Dezembro
Não resisti a mais esta afronta praticada
pelos donos das nossas vidas. Para os que lutaram pela independência com armas
na mão ou não, isto é um ultraje, uma traição à Pátria passível de julgamento.
Mais um alerta de Rafael Marques de Morais que não se pode silenciar: “Um
exemplo específico e recente é o do maior hipermercado de Angola, Kero,
pertença dos generais Manuel Hélder Vieira Dias Júnior “Kopelipa” e Leopoldino
Fragoso do Nascimento, e do vice-presidente Manuel Vicente. Em Outubro passado,
a direcção-geral do Kero procedeu a 12 nomeações para os cargos de
director-geral adjunto, gerentes de lojas e bazares, assim como os de
coordenadores de segurança. São todos oriundos de Portugal, e nenhum deles é
negro. Vejam-se os casos de Nuno Sardinha e Paulo Monteiro: ambos vieram para Angola
como coordenadores de segurança da logística e do hipermercado do Kilamba,
respectivamente. O primeiro saiu de Portugal como chefe de segurança do Jumbo
de Castelo Branco, enquanto o segundo exercia a mesma função no Jumbo da
Amadora, em Lisboa.”
24
de Dezembro
Amanhã é Natal, mais um dia de mais um
ano passado na fortaleza da miséria, de promessas infestadas de desolação. Para
quê prometer se sabemos que nada vai acontecer. Muito pelo contrário, tudo é de
esmorecer.
Entretanto às 12.27 horas o petróleo
está a 57.12 dólares. Se antes na abastança era miséria, agora com tais preços
chamar-se-á miserabilíssima.
Desejo a todos um feliz Natal…
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