Forçam-nas a tirarem as roupas.
Resta o refúgio das duas peças íntimas.
Torque exclama descontrolado:
- Um conjunto da Triumph!!!
- Não velho
chalado… é Chanel!
Capítulo XV
Os
feiticeiros
Apesar dos convites
que os feiticeiros
lhe fizeram, Epok preferiu ignorá-los. É
certo que tinha muitos feiticeiros na família,
mas não
queria nem era
aconselhável que os nobres
soubessem disso, porque decerto criariam intrigas
para lhe lixar a vida e ocuparem o seu
lugar. As invejas
eram muitas. Conseguiu sobreviver a muitos
feitiços porque o dele era muito forte, mais poderoso que o petróleo, mais
brilhante que o mais valioso diamante.
Então anuncia-se a realização
do 1º Congresso dos Feiticeiros
Petrolíferos, no Palácio dos Feitiços.
Diz a lenda que
o Palácio nasceu devido
ao esforço conjunto
da unidade mental quando
todos ainda viviam em
harmonia. Fizeram um grande feitiço e do nada
surgiu a obra, que
ainda continua a ser
motivo de orgulho
e coesão mental.
Os trabalhos do congresso dividiam-se em
quatro capítulos.
Capítulo um
Abertura dos trabalhos
feita pelo Grande Feiticeiro.
Ele entra acompanhado por várias jovens
feiticeiras seminuas. Lançam-se dezenas de morcegos,
cobras, galinhas,
corvos, mochos,
ratos, aranhas,
baratas, porcos,
pregos enferrujados, caveiras e ossos
à sua passagem.
O corredor central
é ladeado por panelas
com água
a ferver, junto com
mistelas para que
sejam efectuados alguns feitiços como prova de organização.
No púlpito o orador
começa a palrar.
«A Nação está completamente
enfeitiçada. Quem quiser ser
general, ter
uma óptima mulher, um
emprego, apanhar
o marido da outra,
apanhar a mulher
do outro, tem que
pedir-nos um feitiço.
Vou desvendar-lhes um grande segredo:
conseguimos enfeitiçar o rei.
É por isso
que não
conseguimos ir em
frente. Pelo
contrário, cada
vez mais
para trás. O rei está bem enfeitiçado porque nunca nos deu valor.
Tem o que merece. Isso
prova que
somos muito poderosos.
Mas, um
dos maiores e mais
bem sucedidos feitiços
que fizemos foi sobre
o SPR, Sistema de Pagamentos
do Reino.
Um feitiço feito à meia-noite, onde reunimos e invocámos todos
os trovões e faíscas
do mundo. Resultou em cheio. Toda
a gente trabalha
e ninguém recebe nada.
Na realidade estão como desempregados. Depois aperfeiçoaremos este
feitiço para atingir a nossa meta
que é entregar o reino aos estrangeiros e obter cem por cento de desempregados. Temos que
avançar mais.
Estamos a ser ultrapassados pelos
grandes feiticeiros
brancos da genética
e da clonagem. Temos que estar atentos ao que
se passa no mundo.
Temos que estudar
muito. Proximamente enviaremos uma delegação para aprender as modernas técnicas
dos feiticeiros brancos.» Levanta o seu bastão
encimado por uma caveira que lança raios
de luz. Dezenas de crianças escolhidas como as melhores
na arte da feitiçaria,
entram e cantam. «O nosso rei e rainha já não
têm nada para
nos dar. Acabaram-se os nossos sonhos, nada mais
há para enfeitiçar.»
- Declaro o início
dos trabalhos. – Sentenciou o Grande Feiticeiro.
- Pelo Poder! Do Feitiço! A Luta! Pelo Feitiço!
Capítulo dois
Intervém o Feiticeiro
do Norte: «Trabalho não
nos falta.
A aderência é digna de Cátaros. A Católica sente receio devido
à escassez de fiéis. Os militares preocupam-se, os partidos políticos
também. Isto
é novo para nós. As crianças
perseguem-nos aos milhares. Temos que aumentar os nossos honorários.
Nunca imaginei ver
tanta gente
na feitiçaria. Temos que formar quadros urgentemente,
porque podemos perder
o controlo da situação. Uma universidade já está a ser
construída. Conseguimos erguer um grande armazém onde
estão amontoados ossos aos milhares. As ruas
já se iluminam com
velas em caveiras. O combustível
retira-se dos corpos que tombam com
a fome. Devido
à falta de apoio está tudo nas mãos
de estrangeiros. Em
breve correremos com
eles respeitando as nossas leis em
vigor. Por todo o reino um só!» Feitiço!
– Confirmaram em uníssono os presentes.
Capítulo três
O Feiticeiro do
Centro com ares
de intelectual e cérebro bem lavado pela
propaganda estalinista repete-se: «Camaradas e compatriotas. Membros do glorioso partido
dos Feiticeiros. A nossa
grandiosa luta
de libertação nacional,
os nossos heróis
que tombaram não
derramaram o seu sangue
em
vão. Alguns
de nós tombaram nas esquinas
devido aos assaltantes dos telemóveis e
às espoliações e destruições dos nossos casebres e ancestrais bens. A nossa luta ainda não
terminou. Agora a nova
guerra de libertação
nacional orienta-se sabiamente contra os
esfomeados. É uma luta sem tréguas…»
Alguém da assistência
interrompe, faz-se ouvir.
- Porra! Este gajo veio para aqui por
engano! Vai para o Palácio
do rei!
O orador sente que alguma coisa está
errada. Verifica os papéis e justifica-se.
- Desculpem, enganei-me no discurso.
Vou continuar... como dizia: a nossa luta de libertação
nacional, sabiamente conduzida pelo nosso Grande Feiticeiro
fez com que
a exclusão e escravidão…
- Olha o gajo! Agarra! Atrás
dele!
Uma turba, qual
vulcão, cai em cima
do orador. Este
torna-se num minúsculo ser.
Pancadaria cai-lhe no corpo. O Grande
Feiticeiro aparta os ânimos. A vítima
recompõe-se. Um exaltado esclarece:
- Pensas que
estamos em 1975?! Essa conversa
já não
dá. Mesu ma jikuka… (já abrimos o olho) vai directo ao assunto.
- Está bem, já sei o que
querem… oiçam por favor:
As brigadas do bilhete
de identidade estão sem
plastificação. Roubaram-lhes um mês de vencimento. Não
têm alimentação, “esqueceram-se” de pagar-lhes os vencimentos.
O dinheiro dos carros
para os apoiar
desviaram-no. A desmotivação avança. O feitiço para sabotar
as eleições resultou. Tudo está definitivamente
enfeitiçado, para que
não hajam eleições.
Quem as quiser, que
invente outra nação ou
vá para o reino
do Gabão... tenho dito.
- Vês que quando queres sabes falar? Muito bem! Muito bem!
E premeiam o orador com uma grande
chuva de feitiços.
Capítulo quatro
«Sou o Feiticeiro
do Sul. Posso afirmar que o Santo
Oficio perdeu as forças para
nos combater.
Temos feiticeiros infiltrados nos centros de decisão. Não há
actividade sem feitiço.
Temos escolas que
formam bons feiticeiros.
Somos rigorosos com
os nossos remédios. Conseguimos acabar com famílias inteiras. Finalmente
conseguimos o respeito e admiração que merecemos.»
Conclusões
O Grande Feiticeiro prepara-se para encerrar os trabalhos.
Camaradas Feiticeiros
e… desculpem isto dos camaradas. Sabem…
foi tanto tempo que
por vezes
não esquecemos… Feiticeiros
e Feiticeiras finalmente realizámos o nosso sonho com este primeiro congresso. Devidamente legalizados já
podemos atirar as pernas
para a frente.
A feira dos feitiços
aqui perto
é um êxito.
No topo de vendas
está o feitiço da fome,
do roubo e dos poetas. Estamos em todo o lado,
somos imparáveis. Há ainda quem não tenha
as suas quotas em dia. Tem trinta dias
para as pagar. Findo o prazo serão
contemplados com um
poderoso feitiço.
Às delegações estrangeiras dizemos:
bem-vindos e roubem-nos à vontade.
Apelo ao pessoal
de serviço para limparem a porcaria
que fizemos. O cheiro
está insuportável. Limpem com lixívia nacional, importada não
dá. Ah!.. Antes disso convém lembrar: A nossa capital é a mais
exótica do mundo.
As nossas esposas bem enfeitiçadas passeiam nas ruas
apresentando o nosso genuíno folclore
nacional. Com
as oferendas em
qualquer recipiente ficam bem
enfeitadas com o que
carregam na cabeça. Esse
é o seu penteado
tradicional. Nunca se esqueçam do mais importante! Para que o feitiço do dinheiro
funcione, basta matar um
familiar. E um feiticeiro
infiltrado na Igreja fugiu com a família para o estrangeiro, levando os quinhentos mil dólares dos donativos.
Outro feiticeiro digno
de menção é o que
está na EDVR, a Empresa Distribuidora das Velas do Reino que
deixará de as fornecer. Ninguém paga as contas.
O Feiticeiro do
Centro interrompe.
- Como é que os coches vão andar nas ruas sem velas? Sem luz os esfomeados pilharão tudo.
- O Santo
Oficio já criou esquadrões
da morte.
- E os mosquitos?
- Apanhem-nos e comam-nos. Contém o mínimo
de minerais essenciais
à saúde.
- O Nosso Feitiço! Voa! Voa! Um só! Feitiço! Escravos para
sempre! Da fome e do feitiço!
Garantiram todos os feiticeiros.
Nos três dias que
duraram os trabalhos, as áreas
circundantes do Palácio viveram momentos
de grande terror.
Logo no início
a luz e a água
foram-se. Um denso
nevoeiro pairava no céu e na terra constante,
fazia os vultos parecerem fantasmas. As noites
eram tão escuras que
quem se aventurasse a circular,
sentia-se como dentro de um poço sem fundo. Como se não bastasse, raios
e fortes trovões
vindos do céu iluminavam a cena
desencorajando mesmo os mais audazes transeuntes.
As mães em
pânico não
sabiam o que fazer
com as crianças.
As pobres alminhas imploravam:
- Mamã tira
daqui os feitiços! Não quero mais brincar com eles. Mamã, gosto mais da TPA, os
feiticeiros dela são muito engraçados. Fazem-me rir bwé!
- Não posso fazer nada, estes feiticeiros
são poderosos.
Sobre a água e a luz as vozes
concordavam:
- Como se não bastasse o rei e os cortes
constantes que
os nobres nos
fazem, agora aparecem estes feiticeiros.
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