Com dignidade suporto os desprezos da
independência lançados pela FAMÍLIA, e pela desprezível diplomacia da Ocidental
hipocrisia. Outra vez na condição desumana ultrajada, arrastam-me na negra
existência. Sim, sou negra como o terrorismo internacional que vos persegue, e
vos atormentará. Querem-me sem instrução para a escravidão. A minha liberdade é
o luar da noite angular, angolar. Mancharam a minha beleza, deixaram-me alvar,
secar. Sou negra na indigna independência inventada só deles, sem hino, sem
bandeira, é independência?! Não! É apenas um pardieiro de multidões famintas e
de comandantes de campos de concentração de exterminação 11 de Novembro, da
luta de libertação ainda não encetada.
Pocahontas
Acompanhei a minha amiga Pocahontas a
Londres. Fomos recebidas pelo rei Jaime I e Ana da Dinamarca. Os ingleses
olhavam-nos como… como jasmins exóticos. Entrámos na corte erigidas pela
melodia, heroína expressiva, melódica da música barroca. À nossa dignidade principesca
passagem, a nobreza desconjuntava-se nas maneiristas vénias do palácio real de Whitehall. Acabámos o percurso do chão recto axadrezado.
Ajoelhamo-nos majestosamente aos pés dos reis do mundo. Depois a minha
amiga Pocahontas segredou-me: O amor não nasce, está dentro de nós porque ambas
sabemos perdoar. Éramos, era, mais uma princesa arrebatada ao Novo Mundo. Vida
nova apresentada na corte da lisonja. Novo Mundo, novas riquezas.
As proezas dos heróis elisabetanos,
vitorianos que serão versificados, imortalizados. Os feitos dos nossos heróis
permanecerão ridicularizados.
Pocahontas faleceu dois anos depois,
com vinte e dois. Deixou de fazer orações e vénias à pureza das árvores, e
águias que amava. Vítima da impureza humana, tudo! Toda a poesia da vida Powhatan na Virgínia esmoreceu.
Phillis
Wheatley
A saudade dói, é uma ferida ao lembrar o valor da
amizade de uma amiga. Um caçador de escravos privou-a da liberdade com apenas
oito anos. Obrigaram-na a não apanhar mais mangas, abacaxis, bananas, as frutas
dos selvagens.
Perdeu para sempre o interior, os segredos do feitiço
da sua Mãe, a selva africana. Embarcou órfã na mãe negreira. Oh! Não me façam
mal! Prometo nunca mais fugir dos brancos.
Não subirei mais às costas das palmeiras. Não mais me
refrescarei, saciarei na água dos cocos. Porque não mais os verei, comerei. Os
meus pais, irmãos, amigas, recordarei. As marés nas areias não abraçarei. A
manhã está tão cercada, sombreada irreal. Desnudou-se para me saudar. Vejo a
proa do navio negreiro que me há-de levar, a deslizar. Não há, não vejo, não
vem ninguém para me apoiar, ajudar a salvar. A margem afasta-se, acho que me
envia um sorriso. Já estamos longe. Não sabia que o mar era assim grande, tão
imenso. Ainda bem que o navio negreiro não tem medo dele, parecem tão amigos.
Deve ter muitas mãos que o seguram, senão afundava-se. Sinto medo desta
grandeza e desato a chorar. O traficante de escravos grita-me. A sua voz é tão
potente que o oceano treme: «Ó especial especiaria recolhe-te no cubículo!!!»
Gravou na memória os sulcos da proa negreira que rompia avidamente as correntes
marítimas. As vagas revoltadas acompanhavam a pressa da chegada sem destino. De
tão longe conhecida aportou em Boston, um Novo Mundo desconhecido. Alguns dos
modernos navios negreiros que refazem a rota antes africanizada, juram com
pavor que viram um navio fantasma, o Wheatley voador. Um comerciante rico
comprou-a, ofertou-a como criada para a sua esposa. O senhor dos escravos nunca
poderia saber que importou, comprou uma poetisa, um condor. As plantações das
ilusões escravizam-nos, como multidões. A senhora deu-lhe a estudar geografia,
história e latim. Se todos estudassem… aos treze anos demonstrou afamada poesia.
Com vinte anos na Inglaterra publicou-a. Exótica africana com escala no Novo
Mundo, Phillis Wheatley acabou na lei da selva. Trinta e um anos de fervor
cristianizado, imposto, longe do calor silencioso, da brisa acariciante,
selvagem terna dos rios engolidos pelos vales da poesia negra. Apagada,
desconhecida, viva no seu coração negro, conhecida nos seus pensamentos, de
muito claros e intensos movimentos.
Tatiana
Rusesabagina
O feitiço do Ruanda uniu-nos quando abracei a minha
querida amiga Tatiana Rusesabagina. Resta sempre a lembrança da Ocidental
matança. Que as guerras dos negros só a eles pertencem. Têm o direito ancestral
adquirido de se matarem como bem entenderem. É a guerra deles, é entre eles.
Que se matem, que óptimo! Exterminarem-se! Quantos mais melhor porque incomodam
muito. São desvios da civilização, convertidos à força, à forca do cristianismo.
Como sempre os brancos fugiram. Deixaram, abandonaram nas ruas feitas de pó que
não se comoviam perante os necrotérios. Cemitérios ao ar livre, improvisados, massacrados,
esquartejados, assim ficaram os corpos, e os seus restos abandonados.
Desprotegidos, entregues ao sol que no solo os requeimava, decompunha-os.
Parecia tudo tão irreal, como sementes lançadas à terra sem estar lavrada.
Agricultores loucos que plantam cadáveres e aguardam que nasçam plantas para renovar,
continuar a matar. Estimular o ódio para que sirva de pretexto ao genocídio e
depois apelidá-lo de Estados Bárbaros. Antes eram as cruzadas para libertar
Jerusalém, agora são para libertar negros, e todos os dias há cruzadas negras,
matanças de pagãos. Cadáveres espalhados, habituados porque perderam a
importância, ganharam o desprezo da abundância. A África Negra é um Ruanda
diário.
Os campeões da democracia são perenes na convivência,
conveniência, apoiam as ditaduras amigas que garantem a sua sobrevivência. É
como a literatura militante, defende o passado, obscurece o presente, elimina o
futuro.
Somos nómadas, passamos o destempero a fugir dos tiros
e das catanas. Somos alimento para chacais, hienas e abutres. E os partidos
políticos partem-se na mama da dinheirama. Há muitos brilhos, mas os sonhos
permanecem escuros, obscuros.
Aretha
Franklin
E de glória me glorifiquei quando a Aretha
santifiquei e no seu halo me cantou. Espiritualizou o reino da Rainha da minha
alma. Não canta para nós, encanta Deus. Ela transferiu-me a dimensão da Paixão
do esconderijo evangélico. Quando
enfrentamos problemas, redobremos, cantemos, cantemos!
Os governantes oprimem os povos. Queremos uma
resposta, não duvidamos da aposta da intolerância da fome. Governar é esfomear!
E os espirituais são uma Aretha de alerta. As vozes tão celestiais, tão, tão…
espiritualmente negras.
Deus ofereceu a distinção negra à melodiosa Negra, com
voz tão imortalizada, tão celeste. Se essa voz é o Céu, quero ir já para lá. Há
dois Céus: um do Senhor, outro da Aretha, adoro ambos. Aretha segredou-me o
porquê do sorrir, do estender do seu dedo: «Indico o bom caminho da Redenção.
Só há um Deus no Caminho do abrir um sorriso no meu dedo» Embeveci-me, acho que
me clarifiquei muito bem: «Aretha! É fácil apontar para a degradação moral e
social mas o nosso olhar rebaixa-se perante quem governa tão mal»
Experimentámos um barco pacífico a remos e remámos no lago de águas remadas,
acalmadas, aclamadas, e o Senhor evangelizou as águas angélicas. Pregou aos
jasmins e as águas muito suavemente agitaram-se, intensamente penetradas,
perfumadas. E revelaram-se e possuíram todo o vivente. E todos rejubilaram.
Deus existe sim senhor! Revelou-se!
Aretha Franklin, encomenda do hino da festa especial de Deus. E o Mestre
das Estátuas deu-lhe som e tom, esculturou-a Universal.
Dos meus idiomas suaíli, bambara, ioruba, umbundu,
kimbundu, fizeram, inventaram um parque jurássico amacacado. A mareante
escolha, dos escolhos da especial especiaria. A primeira descoberta que os
mareantes, navegantes em terra toparam de chofre foi a minha sensual nudez. Há
séculos que fui descoberta, quase, quando chegaram a coberto na coberta das
naus e não viram que me descobriram, já estava há muito descoberta. Na nudez
que inventei gritaram-me cafreal quando impus o biquíni, no nu, na nua quente
céltica ritual africana floresta. Ainda conservo o quente da tez, da minha
nudez.
Continuo lenda tua, Montanhas Lendárias da Lua. Não
acreditavam que os cumes do Kilimanjaro nevavam.
O meu nome é muitos nomes inventados: Indígena,
nativa, cafre, gentia, negra, macaca, escura. E na região da religião… demónio.
Violentada dos que vieram dos mares violentos e viram outros calmos. Não
tínhamos que trabalhar, a Natureza era o nosso senhor.
Chamaram-me cafre porque amo as cachoeiras. E
ouviram-me falar com as minhas amigas dos troncos, das ramagens e folhas verdes,
das águas dos rios e das árvores. Inventaram o recuo do tempo porque não
tínhamos palácios iguais aos deles. Os edifícios que os nossos deuses
construíram são o que resta da civilização branca. Redescobriram os velhos
mares antes navegados, ainda hoje estou encoberta, por isso teimam que continuo
descoberta. Era, sou diferente por causa do amarelo tórrido do disco solar,
equatorial tropical.
A púrpura das Montanhas da Lua atira os cumes da
nobreza da pérola. Tenho esperança em dias piores. A vida é muito simples mas
complicamo-la. Sem pensar, preferimos a dor da perda da voz, da fuga com passos
apressados, incertos, incerta vou, onde ninguém me espera.
Neste lado deste lago estou na ansiedade do peixe sem
água. A sua mágoa nadou na noite fria, lamento-lhe o chorar. Porque não me
limpam o meu mar de lágrimas?! O meu amor negro trocou-me por uma branca, por
outro amor. Aguardo exausta que Job me recompense, que ouvirei os anjos no céu
cantarem. Que estarei muito perto deles como aqueles que acreditaram em mim e
fugiram do desprezo. Como farão todos os que esperavam o fim da escravidão. Que
aparece, perece, parece que só depois da morte. Que triste final acreditar
sempre na invenção dos homens… um não! São muitos lobos disfarçados, mas onde
estás tu?! Porque não me dás uma esperança? Basta uma ténue recordação para
ousar ser feliz. A verdade é como os restos de um espelho que restou do
construir, e assim nos ensinaram a desistir, a destruir. Só nos reconhecemos
quando estamos frente das suas ruínas.
Imagem
Pocahontas: co.henrico.va.us
Imagem Phillis
Wheatley: pwacleveland.org
Imagem: Tatiana
Rusesabagina: sageslowdive.blogspot.com
Imagem: Aretha Franklin: rappamelo.com
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