quinta-feira, 19 de abril de 2012

O CAVALEIRO DO REINO PETROLÍFERO (06) Reino Jingola, algures no Golfo da Guiné



Jingola é apenas para negócios da China?! Até o povo venderam. Quando um país só serve para negócios… está ultimado.

O Cavaleiro Epok falou com o marquês GOR, Gabinete das Obras Reais. Várias brigadas deslocaram-se para a rua da Maianga. Estandartes levantaram-se nas janelas. Os buracos taparam-se. A arraia-miúda evacuada. A rua ficou muito bonita. Espalharam-se flores e perfumes. Vieram os comentários do legado cultural dos quinhentos anos.
- Rezo para que o rei saia todos os dias.
- O rei do líquido negro.
- O nosso rei é muito bonito. O rei dos reis mais bonitos.
- O dinheiro que gastaram na rua dava para um ano de comida.
- Vamos roubar as flores.
- Agora não, só depois dele passar.
- Avisa a Rádio dos Republicanos.
- Não dá, desligaram os telefones.
- Alguém que vá a correr às Mãos Livres.
- Não dá, não entra nem sai ninguém.
- Vou namorar com um mosquiteiro, vou roubar muita comida.
- Eu vou namorar com eles todos, vou ficar rica.
Sons de tambores, flautas e alaúdes ouvem-se. Vários arautos anunciam.
- Abram alas para sua majestade El-Rei!!!
Aplausos e vivas ao rei começam quando ele surge num magnífico coche estilo D. José I. Ao seu lado está o cavaleiro Epok.
- Viva o rei! Viva o rei!
- Viva o cavaleiro Epok das piranhas!
- Viva o piranhoso!
- Viva! Viva!
- Viva La Padep(!)
- Fofinho, vamos fazer um bonitinho?!
O rei comenta:
- Que povo barulhento, mal-educado, indisciplinado. Elas então são as piores. Não têm cultura, são simplesmente impossíveis. Já entendo porque é que o outro as queria queimar.
- Meu rei, vou decretar a lei das feiticeiras. Vão todas para a inquisição da fogueira.
- Isso é perigoso. Arriscamo-nos a ficar sem elas… esposas. Além disso, são elas que trabalham. Os homens são apenas para enfeitar.
O cortejo está a chegar ao fim da rua. Vê-se uma multidão de pedintes sem ONGs, sem forças para caminharem. Restos de andrajos cobrem os seus corpos. Estendem as mãos. Parecem mortos vivos. Epok espanta-se.
- Mas o que é isto!? O cemitério não é aqui!
- Nós não fazemos mal, viemos em bem.
- Ah sim, quem vos mandatou?
- Foi o cavaleiro La Padep. Disse-nos que o rei prometeu que nos daria algum dinheiro, umas sobras do vosso líquido negro.
- Maldito La Padep. Esse jovem dá-me cabo da cabeça. Ou vão embora já, ou atiro-os para as piranhas.
Ouve-se uma voz.
- As piranhas vão ficar doentes. O nosso corpo não tem nada para comer, a não ser as epidemias…
- Guardas, prendam-nos!
Epok aproxima-se do rei, este diz-lhe:
- O grande cemitério que mandei construir já está pronto? Ou falta-lhe o jardim…
- Está no fim meu rei.
- Com tantos mortos não há cemitérios que cheguem.
- Será pior que o holocausto.
Vinte anos depois, o Estádio Real dos Cocos acaba de ser reconstruído. Custou vinte milhões de dólares. Epok não esconde o seu orgulho.
- Notabilíssimo, grande obra! É pena ter demorado muito tempo.
- O nosso segredo é a nossa lentidão.
- Não sei onde os moradores vão estacionar os coches. Não pensámos nisso. Ih! Ih! Ih!
- Oh! É apenas uma questão de engenho e arte.
- A iluminação das velas parece que ficou fraca… como sempre.
- Importem mais.
- Notável rei, os plebeus queixam-se que as velas importadas têm deficiências de fabrico. Estão sempre a apagar e a acender. Ninguém ainda descobriu porquê.
- Eu decretei para não mandarem vir nada do reino do Dubai.
O chefe da guarda anda a ler um livro, amalucou-se, lamenta-se a Epok.
- Chefe, estou a ler o livro dos três mosquiteiros. Não estou a gostar nada. O Alexandre Dumas devia escrever sobre os nossos mosquiteiros. Assim ficava bom, como nós fazemos: Um por todos e todos por nenhum.
- Cala-te analfabeto!
Epok queixa-se ao rei.
- Meu rei, os nossos homens andam a ler o livro dos Três Mosqueteiros. Estão todos amalucados, desandados a imitarem as personagens. Alguns querem matar o Cardeal. Atiro-os para o fosso?
- Não atires mais ninguém para as piranhas. Tenho uma ideia melhor. Manda-os apanhá-las com as mãos.
No outro dia o rei pergunta pelos estragos das piranhas. Epok relata:
- Meu rei, o fosso está sem piranhas. 
- Quantos são que ficaram sem mãos?
- Nenhum… utilizaram anzóis.
- ?!!!
- Meu rei, estão a fazer negócio. O povo diz que é um bom petisco.
Epok faz uma dissertação de modernismo a sua majestade.
- Grande líder, vamos estudar quais são os modelos dos cavalos voadores que vamos comprar. No reino do Ocidente inventaram coches com os cavalos lá dentro. Há motores de quatro, oito, doze… com muitos cavalos. Não comem palha, só bebem o nosso líquido negro. Mandamos vir quantos?
- Para já encomenda dez mil dos mais luxuosos. Só para os nobres. Os plebeus terão que andar ainda muito tempo a pé. Precisamos deles saudáveis.

Capítulo IV
As Piranhas

«O alcance da nossa incapacidade de gestão urbana: conseguimos nos paralisar por excesso de meios de transporte. Se calcularmos que um carro vale em média 5 mil dólares, são 20 bilhões de dólares imobilizados.»
In Governabilidade e Descentralização. Ladislau Dowbor http://www.dowbor.org/
Um grande navio encosta-se com milhares de piranhas. Para evitar os roubos Epok acompanha pessoalmente a descarga e o transporte para o fosso do Palácio Castelo-Forte. Depois do trabalho terminado cria uma minicomissão de inquérito.
- Estão todas? Não falta nenhuma? Contaram-nas?
- Chefe, veio cem a mais.
- Cem a mais ou sem a mais?
- Cem a mais.
- Cem com S ou com C, porra!?
- Não falta nenhuma chefe.
Epok aproxima-se do fosso, olha e admira a peixaria.
- São muito bonitas, só lhes falta a comida.
Vira-se para a guarda e ordena-lhes:
- Guardas, a água do fosso está pronta, podem banhar-se.
Entretanto os guardas preparam uma conspiração. Conjuram com as namoradas e estas com a população para roubarem as piranhas, ao anoitecer, no decorrer das Cortes Reais.
Conforme planeado cavam o que parece ser um esgoto para a saída das águas sujas, pretendendo com isto iludir a guarda secreta do rei. Então, a água das piranhas escapa-se rapidamente. Nas ameias uma sentinela dá o sinal combinado. Mangueiras são ligadas aos tonéis dos vinhos reais. O líquido chega ao fosso. O falso esgoto é rapidamente tapado. Tudo é recomposto, gente e braços desempregados não faltam. Das ameias chega o sinal de que os tonéis vazaram. As gentes carregam à pressa as piranhas que adormeceram devido ao monumental banho vinícola.
Assiste-se a uma mobilização geral. Velhos, mulheres, doentes, grávidas, crianças e cães carregam o precioso vinho. Enquanto algumas mamãs escamam o peixe, outras assam-no com o carvão roubado do Castelo. Todos bebem sem excepção, incluindo a criançada. As mamãs cedo cambaleiam.
Quando os bebés pedem mama, dão-lhes vinho. Povos das redondezas conforme combinado, chegam para a grande festa. Querem saudar as Cortes Reais e o seu rei. O cheiro a peixe começa a deambular por todo o lado. O do vinho também. As jovens iniciam danças sem fim. Todo o mundo dança.

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